Estátua de Thomas Jefferson, no Jefferson Memorial, em Washington.| Foto: Pixabay
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Você sempre pode contar com progressistas dispostos a viver de acordo com as piores caricaturas de suas ideias. Os democratas na Câmara Municipal de Nova York aprovaram a remoção de uma estátua do fundador do Partido Democrata, Thomas Jefferson. A estátua estava na Prefeitura desde 1834 (oito anos após a morte de Jefferson), quando foi erguida para celebrar sua defesa da liberdade religiosa. Um sinal de como os democratas estão orgulhosos de sua decisão é o fato de terem tentado impedir a imprensa de testemunhar a remoção.

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Isso é uma loucura e dá razão a muitos na direita - principalmente Donald Trump - que argumentaram sobre as campanhas contra as estátuas dos confederados, considerando-as perigosas precisamente porque as pessoas que pressionavam pelas remoções certamente se moveriam em seguida contra os Pais Fundadores. Quando Trump apresentou esse argumento em 2017, ele foi recebido com escárnio. Em um artigo intitulado "Estátuas de Washington: Jefferson não é o próximo, mas é complicado, dizem os historiadores", Dartunorro Clark, da NBC News, escreveu:

“Historiadores que falaram à NBC News disseram que tais temores são um pouco mal colocados e que Trump está defendendo uma interpretação obscura da história. ‘O presidente pode subir a ladeira escorregadia, mas é uma ladeira escorregadia falsa’, disse Kevin Levin, historiador que mora em Boston e se especializou em história da Guerra Civil americana”.

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Já o apresentador John Oliver disse: “Eu vou te dizer onde isso vai parar. Em algum lugar! Sempre que alguém pergunta, onde isso vai parar, a resposta é sempre. . . em algum lugar. Você pode deixar seu filho experimentar Twizzlers (doce de alcaçuz preto), mas não deixá-lo injetar heroína de alcatrão preto. Você não diz simplesmente, "Bem, depois dos Twizzlers, onde isso vai parar?"

Na verdade, isso se pergunta sim, e essa é a razão. Independentemente do quanto Trump entendesse de história, ele entendia a loucura da militância melhor do que Kevin Levin ou John Oliver.

Sem relembrar aqui todo o debate sobre os ícones confederados - que já se arrasta há anos e tem sido vigorosamente debatido pelo National Review, às vezes por mim mesmo - o argumento mais forte para remover algumas ou todas as estátuas e monumentos confederados é que a causa dos confederados não foi apenas imperfeita da mesma forma que muitos grandes americanos são imperfeitos; era intensamente errada, e as pessoas que a apoiaram tornaram o país pior, ou pelo menos tentaram fazê-lo, e, portanto, nunca deveriam ter sido homenageadas.

O pressuposto subjacente a esse argumento é que é possível distinguir de maneira razoável e racional algumas figuras históricas de outras. Podemos honrar aqueles que fizeram coisas boas e também algumas ruins, mas não aqueles que são mais conhecidos por causa das coisas ruins que fizeram. Por outro lado, um grande argumento contra a demolição de estátuas e monumentos em geral é que acabamos não apenas desfigurando lugares públicos e escondendo nossa própria história, mas também alimentando a iconoclastia de militantes que, por natureza, não raciocinam e nunca sabem quando e como parar. Poucas coisas atraem mais as pessoas para o trumpismo do que a sensação de que se está lidando com quem nunca se pode raciocinar, apenas se opor a cada passo.

Para aqueles de nós que ainda se preocupam com a razão, no entanto, a ação da Câmara Municipal de Nova York não é apenas um ataque anti-intelectual à memória histórica; também é idiotice moral. Jefferson não deve ser canonizado, mas construir estátuas não significa reconhecer santidade. Há muito o que não gostar em sua personalidade e em sua longa e movimentada carreira, incluindo seu serviço na cidade de Nova York como nosso primeiro secretário de Estado. Ele era hipócrita, tortuoso e se apaixonava facilmente por modismos radicais. Ele teve escravos por toda sua vida e não deu nem mesmo os passos tardios de George Washington para emancipar os escravos em seu testamento. Por isso, ele deve responder a seu Criador.

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Mas ele também deu uma contribuição monumental para o início da América - e especificamente para muitas das coisas que quase qualquer um veria como virtudes deste país. Há boas razões para Jefferson ter um memorial na capital e seu rosto no Monte Rushmore, nas moedas e na nota de dois dólares, seu nome na capital do Missouri e no de muitas outras cidades e ruas americanas. Até poucos anos atrás, ele ainda era abraçado pelo Partido Democrata como sua inspiração fundadora.

É um sinal peculiar de ignorância teimosa da Câmara Municipal que sua implicância contra Jefferson seja baseado inteiramente no fato de que ele era proprietário de escravos e mantinha relacionamento sexual com um deles, a escrava Sally Hemings, ao invés de qualquer coisa que Jefferson tenha feito como homem público. Os americanos de gerações anteriores que construíram estátuas não tinham a ilusão de que estavam homenageando santos; eles estavam comemorando grandes realizações na esfera pública. Ao contrário de seu homônimo, Jefferson Davis, não temos estátuas para Jefferson por causa de seus vícios, mas por causa do bem que ele fez por sua nação.

Sobre a questão específica da escravidão, como o editorial do National Review observou, Jefferson acertou mais do que errou, e não apenas por causa do papel central desempenhado por sua retórica de “todos os homens são criados iguais” para inspirar as gerações posteriores.

Ele foi um oponente de longa data do comércio transatlântico de escravos, talvez o oponente mais vocal, consistente e, em última instância, bem-sucedido da nação. Em 1776, Jefferson tentou incluir uma denúncia sobre esse comércio na Declaração da Independência. Em 1778, como governador da Virgínia, ele sancionou uma lei estadual que proibia a importação de escravos (um projeto de lei que pode ter sido de sua autoria). A Constituição proibia o governo federal de banir o comércio de escravos antes de 1808. Como presidente, Jefferson exortou o Congresso em 1806, em seu discurso sobre o Estado da União, a bani-lo no primeiro momento possível e “retirar os cidadãos dos Estados Unidos de toda participação futura nas violações dos direitos humanos, pois têm sido assim há muito tempo com os inofensivos habitantes da África, e que a moralidade, a reputação e os melhores interesses de nosso país há muito tempo estão ansiosos para proscrever”. Ele assinou essa proibição em lei no ano de 1807.

É verdade que o fim do comércio externo de escravos era do interesse financeiro de Jefferson e de outros fazendeiros da Virgínia, pois poderiam vender seus escravos internamente para o Extremo Sul – assim como em tantas outras, a questão envolvia trocas e complexidades morais - mas a luta contra o comércio transatlântico de escravos foi o campo de batalha central do movimento abolicionista durante a carreira política de Jefferson, ele estava do lado certo e conseguiu encerrar o envolvimento da América nele.

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O histórico de Jefferson na expansão doméstica da escravidão foi misto, mas também teve influências positivas autênticas e duradouras. Em 1784, Jefferson propôs ao Congresso Continental a proibição da escravidão em todo o território a oeste dos Apalaches após 1800. Seu projeto, o Ato de Governança Territorial, foi reprovado por uma votação, mas o texto de Jefferson foi incluído no decreto final e mais restrito do Noroeste aprovado em 1787, que proibiu a escravidão a oeste dos Apalaches e ao norte do rio Ohio. O Decreto do Noroeste ajudou a criar os estados livres do meio-oeste que se mostraram decisivos no equilíbrio de longo prazo entre estados livres e escravos. Além disso, o texto que Jefferson usou em 1784 foi reutilizado pelo Congresso em 1865 para a 13ª Emenda. Assim, Jefferson é, literalmente, o autor de nossa proibição constitucional da escravidão.

Jefferson sempre sustentou que a escravidão era um mal, mesmo quando estava disposto a justificá-la como algo que praticamente não poderia ser eliminado facilmente. Em 1820, durante a controvérsia que levou ao Compromisso de Missouri, ele escreveu: “Estamos com o lobo pela orelha e não podemos segurá-lo nem deixá-lo ir com segurança. Justiça está em uma escala e autopreservação na outra.” Em 1785, em suas notas sobre o estado da Virgínia, ele examinou com mais atenção a influência perversa e corruptora da escravidão na classe dominante (um sentimento profético à luz da decadência na qualidade dos estadistas produzidos pela Virgínia nas gerações que se seguiram a Jefferson):

“Deve haver, sem dúvida, uma influência infeliz nas maneiras de nosso povo, produzida pela existência de escravidão entre nós. Todo o comércio entre senhor e escravo é um exercício perpétuo das paixões mais turbulentas, do despotismo mais incessante de um lado e das submissões degradantes do outro. Nossos filhos veem isso e aprendem a imitá-lo. . . . Essa qualidade é o germe de toda educação nele. Do berço ao túmulo, ele está aprendendo a fazer o que vê os outros fazerem. . . . O pai atormenta, a criança observa, capta os traços da cólera, assume a mesma aparência no círculo dos escravos menores, dá liberdade às suas piores paixões e, assim, alimentada, educada e diariamente exercitada na tirania, não pode deixar de ser marcada por ele com peculiaridades odiosas. O homem deve ser um prodígio que pode manter seus modos e moral não desiludidos por tais circunstâncias.

Com que maldição deve ser carregado o estadista que permite a metade dos cidadãos pisotear os direitos do outro, os transforma em déspotas, e estes em inimigos, destrói a moral de uma parte, e o amor patriae da outra. Pois se um escravo pode ter um país neste mundo, deve ser qualquer um em preferência àquele no qual se nasce para viver e servir a outro homem, no qual ele deve encerrar as faculdades de sua natureza, contribuir na medida em que depende em seus esforços individuais para o desaparecimento da raça humana, ou acarretar sua própria condição miserável nas infinitas gerações procedentes dele. Com a moral do povo, sua indústria também é destruída. Pois em um clima quente, nenhum homem trabalhará para si mesmo se puder fazer outro trabalhar em seu lugar. Isso é tão verdade que, entre os proprietários de escravos, uma proporção muito pequena realmente é vista trabalhando.

E podem as liberdades de uma nação ser consideradas seguras quando removemos sua única base firme, uma convicção na mente do povo de que essas liberdades são um dom de Deus? Que eles não devem ser violados, mas com sua ira? Na verdade, tremo por meu país quando reflito que Deus é justo, que sua justiça não pode dormir para sempre, que considerando apenas os números, a natureza e os meios naturais, uma revolução da roda da fortuna, uma troca de situação, estão entre os eventos possíveis, que pode se tornar provável por interferência sobrenatural! O Todo-Poderoso não tem nenhum atributo que possa tomar partido de nós em tal competição.”

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Jefferson gradualmente perdeu a coragem moral para fazer mais a respeito da escravidão no país, em seu estado natal ou em sua própria casa. Mas ele continuou, na velhice, a encorajar outros a manter viva a causa antiescravista. Em 1814, ele escreveu a Edward Coles, instando-o a continuar o antiescravismo na Virgínia para a próxima geração: “O amor à justiça e o amor ao país defendem igualmente a causa dessas pessoas, e é uma reprovação mortal para nós que eles tenham suplicado por tanto tempo em vão.”

Em vez disso, Coles acabou se mudando para Illinois, onde desempenhou um papel crucial como governador ao repelir um esforço em 1824 para introduzir a escravidão legal. Em 1826, recebendo uma carta pedindo que ele fizesse uma declaração pública contra a escravidão, Jefferson objetou, mas em uma resposta escrita apenas seis semanas antes de sua morte, ele acrescentou: “Meus sentimentos estão 40 anos antes do público. . . embora eu não viva para vê-los consumados, eles não morrerão comigo. Mas vivendo ou morrendo, eles estarão sempre em minhas orações mais fervorosas. ”

É claro que há mais no histórico de Jefferson sobre escravidão e raça; há mais ainda em algumas de suas cartas. Ele compartilhou muitos dos pressupostos racistas de sua época. O tratamento dispensado ao Haiti durante sua presidência, quando este lutava para se livrar da escravidão francesa, foi deplorável. A compra da Louisiana, embora um grande benefício para a nação, também fez muito para estender a instituição da escravidão para o oeste. Mas isso, como tantas outras coisas na carreira de Thomas Jefferson, é digno de estudo e crítica, em vez de ser expurgado da memória.

*Dan McLaughlin é redator sênior da National Review Online.

©2021 National Review. Publicado com permissão. Original em inglês.
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