O menino Rhuan Maycon da Silva Castro, de 9 anos, dormia em sua casa em Samambaia, no Distrito Federal, quando foi atingido com uma facada no peito na noite de 31 de maio, uma sexta-feira. Ele tentou se levantar, não conseguiu e caiu ajoelhado ao lado da cama. Rhuan sofreu então outros onze golpes. Segundo o laudo da perícia, ainda tinha batimentos cardíacos quando sua cabeça foi arrancada.
Rhuan foi atacado por sua própria mãe, Rosana Auri da Silva Cândido, de 27 anos, e pela companheira dela, Kacyla Priscyla Santiago Damasceno, de 28. De acordo com o depoimento que as duas prestaram na delegacia, Kacyla segurou o menino, enquanto a mãe desferiu os golpes. A filha de Kacyla, uma menina de apenas oito anos, presenciou toda a cena.
Como explicar tamanha violência, partindo da própria mãe do menino? Rosana e Kacyla confessaram o crime rapidamente e narraram suas ações com grande riqueza de detalhes. Diante do delegado Guilherme Sousa Melo, falaram com tranquilidade sobre o assassinato. A mãe de Rhuan chegou a dizer ao delegado que odiava o menino e que ele era um peso para ela. Ela confessou que o havia castrado dois anos antes. As duas também contaram que tinham premeditado o crime.
Compraram um martelo e carvão. Assim que o menino foi esfaqueado e decapitado, acenderam a churrasqueira, com o objetivo de cozinhar pedaço a pedaço, e assim impedir a identificação do corpo – depois que a carne se soltasse, elas pretendiam triturar os ossos. Enquanto Kacyla acendia o fogo, Rosana arrancava a pele do rosto do menino e tentava, sem sucesso, extrair os globos oculares com uma faca. Separou também o tórax, a cabeça, as pernas e os braços, com o objetivo de levar ao fogo.
Mas, assim que colocaram algumas partes do cadáver na churrasqueira, ficaram com medo de que a fumaça e o cheiro chamassem a atenção dos vizinhos. Por isso, mudaram de ideia: reuniram os pedaços e os colocaram em uma mala e duas mochilas infantis. Uma delas foi abandonada em um bueiro. No restante da madrugada, enquanto planejavam onde iriam dispensar as outras malas, fizeram uma faxina na casa, na tentativa de eliminar as marcas de sangue. Um grupo de adolescentes viu quando as duas abandonaram a mala e chamaram a polícia. Horas depois as acusadas estavam detidas.
Sinais de autismo
Rosana nasceu no Acre. Aos 18 anos, em Rio Branco, capital do estado, teve o filho com um rapaz que tem a mesma idade dela. Com dois anos de relacionamento, o casal se separou, porque ele descobriu que ela mantinha um relacionamento com Kacyla, também divorciada e com uma filha. As duas se conheceram em uma igreja evangélica. Elas perderam as guardas das crianças para os respectivos pais – a família do pai de Rhuan também havia conseguido, na Justiça, que o menino recebesse tratamento especial na escola, já que ele apresentava sinais de autismo e tinha histórico de dificuldade na fala e no desenvolvimento motor.
Diante da perda da guarda, há cinco anos as duas fugiram, levando consigo o menino e a menina. Até chegarem a Samambaia, um distrito com 200 mil habitantes construído há 30 anos, passaram por Sergipe e Goiás. Neste meio tempo, as famílias dos pais seguiam procurando as duas crianças. Ao menor indício de que haviam encontrado Rosana e Kacyla, as duas fugiam novamente. Em Samambaia, as duas nunca foram denunciadas ao Conselho Tutelar.
Há dois anos, emascularam e castraram Rhuan, em casa. Fizeram também um corte na virilha, para simular uma vagina. Sem o pênis e os testículos, o menino passou a conviver com dores fortes e uma grande dificuldade para urinar. As duas crianças eram proibidas de sair de casa. Não brincavam na rua, não interagiam com outras crianças nem iam à escola. Vizinhos disseram que o casal demonstrava um grande fervor religioso.
“Psicopatas”
Para Hilda Morana, psiquiatra forense e especialista em psicopatia, a castração do menino não está ligada ao fato de Rosana e Kacyla manterem um relacionamento homoafetivo. “O relacionamento não parece ter relação com a castração do menino. Ela simplesmente o castrou, por frieza emocional”. Para a especialista, um ato desse porte tem uma única justificativa: “Pela frieza do ato, a mãe só pode ser psicopata. Aliás, provavelmente ambas são psicopatas.”
Eduardo Fraga, professor de psicologia da Universidade Presbiteriana Mackenzie, de São Paulo, apresenta uma hipótese para explicar, em tese, o comportamento das duas mulheres. “As declarações que elas deram na delegacia indicam que elas têm um ódio ao masculino, aos homens. Num pensamento delirante, arrancar o órgão masculino seria uma forma de evitar que o garoto se tornasse um homem. Assim, elas supostamente poderiam salvá-lo, ou proteger a si mesmas”.
Corrobora a afirmação o fato de que Rosana declarou que Rhuan teria sido resultado de um estupro praticado por seu marido – coisa que o pai da criança nega veementemente. Por que não simplesmente entregar o menino ao pai, que já havia conseguido a guarda na Justiça? Seguindo essa linha de raciocínio, responde Eduardo Fraga: “deixar a criança com o pai seria, para ela, como entregar o menino ao carrasco”.
Mas, acima de tudo, as duas mulheres parecem ter problemas mentais. “Parece claro que nenhuma das duas tinha capacidade alguma de compreensão. Uma delas propôs matar o garoto, a outra concordou, mas nenhuma delas se posicionou com racionalidade, de forma a evitar tanto a castração quanto o assassinato”.
Marcas definitivas
As duas mulheres estão presas em celas isoladas no Presídio Feminino do Distrito Federal. A soma dos crimes de que são acusadas, que incluem homicídio duplamente qualificado, lesão corporal gravíssima, tortura e ocultação de cadáver, pode levar a penas de até 57 anos de prisão.
Uma das vítimas do casal continua viva: trata-se da menina de 8 anos, que passou cinco anos com as duas e viu de perto as agressões realizadas contra Rhuan. Ela agora está abrigada pelo Conselho Tutelar do Distrito Federal, onde tem mantido contatos esporádicos com o pai. Segundo o Conselho Tutelar, ela fala pouco, mas se expressa por desenhos. Um deles mostra partes de um cadáver. A menina resiste a qualquer contato com homens, incluindo o pai. “Essa menina passou por situações extremas, que vão deixar marcas. Ela vivenciou um ambiente absolutamente aterrador”, afirma o professor Eduardo Fraga. “Hoje ela tem uma ferida aberta, amanhã será uma cicatriz. Toda essa violência vai deixar marcas definitivas”.