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Cidadãos comuns têm papel não reconhecido no grande declínio do crime

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(Foto: Pixabay)

A maioria das teorias para o grande declínio da criminalidade visto em quase todas as principais cidades americanas nos últimos 25 anos se concentraram nos criminosos em potencial. 

Suas vidas mudaram de muitas maneiras a partir da década de 1990: novas táticas de policiamento rigorosas mantiveram uma vigilância mais próxima. O encarceramento em massa os prendeu em números crescentes. A epidemia do crack que afetou muitos deles começou a diminuir. Mesmo as teorias pouco ortodoxas – que mencionam o aumento do número de abortos, a redução do chumbo ou a propagação da medicação para TDHA (transtorno de déficit de atenção e hiperatividade) – argumentam que grandes mudanças na sociedade alteraram o comportamento (e a existência) de possíveis criminosos. 

Mas nenhuma dessas explicações prestou muita atenção às comunidades onde a violência caiu mais. Novas pesquisas sugerem que as pessoas trabalharam duro para resolver o próprio problema, mesmo que com pouco crédito. 

Os grupos locais sem fins lucrativos que responderam à violência, limpando ruas, construindo parquinhos, orientando crianças e empregando homens jovens tiveram um efeito real sobre a taxa de criminalidade. É isso que Patrick Sharkey, sociólogo da Universidade de Nova York, argumenta em um novo estudo e em um próximo livro. Sharkey não argumenta que apenas grupos comunitários impulsionaram o declínio nacional do crime, mas sim que seu efeito não é contabilizado. 

"Esta foi uma parte completamente ignorada nos debates nacionais sobre a queda da criminalidade, mas acho que é fundamental para o que aconteceu", disse ele. 

Entre o início da década de 1990 e 2015, a taxa de homicídios nos Estados Unidos caiu pela metade. As taxas de roubo, assalto e furto caíram paralelamente. Em Nova York, Washington e San Diego, os assassinatos caíram em mais de 75 por cento. Embora a violência tenha aumentado nos últimos dois anos em algumas cidades, incluindo Chicago e Baltimore, mesmo esses lugares estão mais seguros do que eram há 25 anos. E o crime continuou a cair em outras cidades, mais notavelmente em Nova York, onde o uso de armas está em baixa recorde. 

Transformação

Essa tendência em longo prazo alterou fundamentalmente a vida urbana. Transformou parques e metrôs que geravam medo em espaços públicos vibrantes. Atraiu brancos mais ricos de volta às cidades. Aumentou a expectativa de vida dos homens negros. E mesmo em uma época de ampliação da desigualdade urbana, isso significou que a vida diária dos mais desfavorecidos está menos perigosa agora do que foi há uma geração. Esses bairros pobres, descobriu Sharkey, foram os maiores beneficiários dessa mudança estrutural na segurança. 

As mesmas comunidades estavam participando de outra grande mudança que começou na década de 1990: o número de organizações sem fins lucrativos começou a aumentar acentuadamente em todo o país, particularmente aquelas voltadas para o desenvolvimento de bairros e da juventude. 

Sharkey e os alunos de doutorado Gerard Torrats-Espinosa e Delaram Takyar usaram dados do Centro Nacional de Estatísticas de Caridade para rastrear o aumento de organizações sem fins lucrativos em 264 cidades em mais de 20 anos. As organizações eram mais propensas a se formar nas comunidades com os maiores problemas. Mas também surgiam por razões que tinham pouco a ver com as tendências da criminalidade local, como, por exemplo, uma expansão no financiamento filantrópico. Um pico em organizações sem fins lucrativos abordando assuntos como a pesquisa artística e médica ocorreu na mesma era. 

Autopoliciamento

Comparando o crescimento de outros tipos de organizações sem fins lucrativos, os pesquisadores acreditam que foram capazes de identificar o efeito causal desses grupos comunitários: cada 10 organizações adicionais em uma cidade com 100 mil habitantes, estimam, levaram a uma queda de nove por cento na taxa de homicídio e de seis por cento nos crimes violentos. 

A pesquisa afirma alguns dos princípios do policiamento comunitário: o autopoliciamento é vital nos bairros e podem abordar as raízes complexas da violência de um modo que vai além do trabalho tradicional da polícia. 

"É bem consistente com o que eu diria provavelmente ser a teoria do policiamento predominante entre as principais cidades de hoje", disse Richard Myers, diretor executivo da Associação de Chefes de Polícia das Grandes Cidades, sobre a nova pesquisa. 

As organizações locais também dizem que os resultados de Sharkey validam o que já testemunharam. 

"Sempre que as necessidades básicas das pessoas são atendidas, a violência diminui – isso não é novidade", disse Noreen McClendon, que dirige a organização Concerned Citizens of South Central Los Angeles. 

O grupo, liderado pela mãe de McClendon durante muitos anos, foi formado na década de 1980 para lutar contra um incinerador de resíduos proposto para ser construído no bairro, mas evoluiu na década de 1990, enfrentando muitos outros desafios da comunidade. O grupo criou dezenas de blocos para cuidar das ruas individualmente. Limpou vielas, reparou buracos e contratou ex-infratores locais para fazer esse trabalho. Estabeleceu uma cooperativa de créditos, patrocinou um festival de jazz e construiu centenas de unidades de habitação a preços acessíveis. 

Muitos grupos similares não pensaram explicitamente sobre o que estavam fazendo como prevenção de violência. Mas, ao criar parquinhos, permitiram que os pais monitorassem melhor seus filhos. Ao conectar os vizinhos, melhoraram a capacidade dos residentes de controlar suas ruas. Ao formar programas pós-escola, ofereceram alternativas ao crime. 

Queda de 90% nos crimes

No bairro East Lake, em Atlanta, a taxa de criminalidade em meados da década de 1990 era 18 vezes a média nacional. O mercado de drogas lá foi estimado em US$ 35 milhões por ano. Não houve uma nova licença de construção emitida no bairro em quase três décadas, um sinal do pouco que a comunidade investia lá além da compra de drogas. 

Então, a recém-formada Fundação East Lake construiu novas habitações de renda mista para substituir um projeto de habitação pública decadente. Começou um programa de golfe para crianças do bairro em um campo nas proximidades, mas muito deteriorado. A fundação eventualmente abriu uma escola comunitária privada, onde a primeira classe de adultos teve uma taxa de graduação de 100 por cento em maio. Hoje, a taxa de crimes violentos em East Lake caiu 90 por cento em relação a 1995. 

"Sabíamos que queríamos ver a violência e o crime cair na comunidade, mas nunca tivemos um programa de prevenção do crime", disse Carol Naughton, que liderou a fundação há anos e hoje é presidente de um grupo nacional, o Purpose Built Communities, que está tentando passar o modelo de East Lake para outras cidades. 

Nossas convicções: Os responsáveis pelo bem comum

A lição dessa resposta é o que está no trabalho de Sharkey – que a prevenção efetiva do crime não parece necessariamente com detenção para averiguação, policiamento local, ou encarceramento em massa – e o que é particularmente relevante hoje, à medida que as cidades repensam o policiamento. A repressão pode ter contribuído para o declínio da criminalidade também, mas com custos que se tornaram mais claros com o tempo, antagonizando as comunidades e desestruturando famílias. 

Autoridades da polícia disseram que muito foi exigido da instituição, já que policiais eram cada vez mais solicitados a realizar trabalhos para os quais não foram treinados, como conselheiros e orientadores, terapeutas de casamento ou especialistas em abuso de substâncias. As comunidades estão "afastando esse fardo da polícia, o que provavelmente nunca deveria ter estado com ela, mas, por padrão, parou ali", disse Myers, da associação dos chefes de polícia, que também foi chefe de polícia por muitos anos em Michigan, Virgínia, Colorado e outros estados. 

As taxas de criminalidade agora divergem após uma geração em que a violência caiu de forma confiável, ano após ano, em quase todos os lugares. Sharkey argumenta que é hora de um novo modelo de prevenção da violência, que se baseia mais no tipo de trabalho silencioso feito por esses grupos comunitários do que nas táticas policiais agressivas e nas condenações duras que a administração Trump agora defende. 

"O modelo em que confiamos para controlar a violência por um longo tempo se quebrou", disse Sharkey. Se as comunidades querem que a polícia se afaste, ele mostra quem pode assumir essa posição. "Isso nos dá um modelo. Isso nos dá outro conjunto de atores que pode ter um papel maior."

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