Assassino da escola de Parkland matou 17 pessoas em fevereiro de 2018| Foto: MIGUEL GUTTIEREZAFP

Aconteceu novamente, ouvimos no rádio do carro depois de deixar as crianças na escola: “os motivos do assassino são desconhecidos”. Talvez você tenha ouvido no noticiário da noite. Talvez tenha aparecido no seu smartphone. Talvez tenha aparecido no jornal da manhã. 

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“Os motivos do assassino são desconhecidos”. 

Qual assassino? Eu não estou falando de nenhum em especial. Mais recentemente era um homem em uma van em Toronto, mas poderia ter sido o garoto da escola em Parkland ou o atirador de em Las Vegas, da boate em Orlando, na Flóridada escola primária em Sandy Hook, do cinema em Aurora, Coloradoda universidade na Virgínia.

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“Seus motivos são desconhecidos”. Temos que ouvir o nome do assassino várias vezes. Temos que ver a mesma foto dele a cada atualização das manchetes do dia (talvez alguém encontre os motivos naqueles olhos vazios e sem graça). Os motivos desconhecidos do assassino em massa nos compelem a documentar suas últimas semanas, últimos dias, últimas horas — como se seguir seus passos pudesse nos levar, como piratas com um mapa do tesouro, até um baú enterrado cheio de respostas. 

Suponho que não há nada de novo nessa busca. A mente do assassino é magnética; descrita em Dostoiévski e Dreiser, cativou Capote e hipnotizou Mailer. Na semana passada, o Prêmio Pulitzer de reportagem independente foi concedido a Rachel Kaadzi Ghansah por seu ensaio sobre os motivos por trás do massacre da igreja em Charleston, na Carolina do Sul. 

Eu mesmo já fui em busca de motivos. Vasculhei os arquivos psiquiátricos de um serial killer e tracei os movimentos de um terrorista. Mas isso foi há muito tempo. Nas décadas seguintes notei uma mesmice sombria quanto a esses projetos. O assassino é alienado, aflito e grandioso. Ele é muito sensível à sua própria mágoa e não sente nada quanto à dor dos outros. Pegue um narcisista, misture com alguma paranoia, tempere com sociopatia e tenha o seu ensopado mortal. 

Mas é uma mistura tão insatisfatória. Nossa fome pela razão não é satisfeita por um guisado de fatores irracionais e não racionais. A angústia mental é um quê, não um motivo - ou assim parece ao buscarmos progressivamente os motivos elusivos.

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Uma explicação nunca é suficiente

Às vezes, o assassino explica suas razões, como o assassino de Charleston fez. Ele odiava negros e esperava começar uma guerra racial. Não havia algo mais profundo do que isso, ele insistiu. "Eu não gosto quando as pessoas tentam ler as coisas, ou tentam encontrar, ou criar um significado que não está lá. Não gosto quando as pessoas colocam tanto peso nas coisas que eu digo", o assassino escreveu em seu diário da prisão. 

No entanto, uma explicação nunca é suficiente, porque nenhum motivo corresponde ao peso e ao resultado do crime. Queremos algo comensurável, algo simétrico, uma lesão ou cruzada igual a todo o sangue derramado por estranhos inocentes. Em vez disso, temos apenas esses homens pequenos com suas inadequações letais. 

Se o único dano causado com essa exposição fosse esse desapontamento comunitário — motivos ainda desconhecidos! razões inexplicadas! — eu não estaria reclamando. Mas evidências continuam a se acumular de que muitos desses assassinos estão ansiosos por seu momento de fama. "Os diretores de cinema estarão brigando por essa história", disse um dos atiradores da Columbine High School em um depoimento gravado em vídeo, antes do crime. 

"Basta olhar para quantos fãs você pode encontrar para todos os diferentes tipos de assassinos em massa", observou o atirador de Sandy Hook

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"Um homem que não era conhecido por ninguém, agora é conhecido por todos", observou o atirador que atacou uma faculdade da comunidade de Oregon.

Escrevendo com admiração sobre mais um enigma homicida que já vira na televisão, o atirador do Oregon continuou: "Seu rosto se espalhou por todas as telas, seu nome estava nos lábios de todas as pessoas do planeta, tudo ao longo de um dia. Parece que quanto mais pessoas você mata, mais você está no centro das atenções". 

E assim continua, novos doentes estimulados pelas imagens dos anteriores, justificando suas próprias lamentações para aparecerem em um ou dois ciclos de notícias, seus rostos piscando repetidamente na tela e seus motivos desconhecidos. No rádio do carro há poucos dias, lá estava novamente: o repórter disse que o homem em Toronto era fã do assassino em massa em Santa Bárbara, Califórnia, a quem resumiu assim: "A infâmia é melhor que a total obscuridade". 

Então eu pergunto aos meus colegas jornalistas: quando os próprios assassinos estão nos dizendo que eles se inspiram na perspectiva de nossa cobertura, por que continuamos a dizer seus nomes e mostrar suas fotos? Nada se aprende ao fazer isso. Nada explica essas mortes. Se nada for ganho, qual poderia ser o nosso motivo - especialmente sabendo que podemos estar fornecendo o deles?

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*David Von Drehle é jornalista e colunista do Washington Post.

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