Diante da ameaça do coronavírus, os consumidores de todo o mundo, em pânico, começaram a comprar itens essenciais e agora os mercados estão ficando sem estoque. Em outras palavras, houve um aumento na demanda por bens essenciais. Sem intervenção externa, deveríamos assistir a um aumento de curto prazo nos preços. Mas muitas regulamentações estatais provavelmente evitarão que isso aconteça.
Por quê? Porque isso pode ser considerado precificação abusiva, o que não é explicitamente ilegal nem considerada insensata.
A precificação abusiva é a prática de aumentar os preços de uma forma considerada exploradora. O que configura exploração? Isso depende da opinião dos reguladores e dos tribunais. Mas a ideia básica é a de que a prática “exploradora” de aumentar os preços em situações de emergência é considerada moralmente repreensível e deve ser impedida.
Mas evitar a chamada precificação abusiva seria um erro.
Em geral, os mercados são bons em alocar recursos escassos. Os lucros recompensam as empresas que produzem com eficiência as coisas que queremos, enquanto os prejuízos punem as empresas que produzem com desperdício ou não produzem aquilo que desejamos. Enquanto houver faturamento e gastos, os empreendedores tenderão a buscar o lucro e fugir do prejuízo, diminuindo o desperdício e estabelecendo a autorregulamentação da concorrência.
Esse processo competitivo ao mesmo tempo recorre aos preços para garantir que imprecisões se corrijam sozinhas. Se uma loja vende os produtos a preços altos demais, ela não terá consumidores. Se os vender a preços baixos demais, talvez tenha prejuízo ou fique sem estoque. No livre mercado, uma empresa lucrativa capaz de estabelecer preços altos acabará por enfrentar a ameaça de novos participantes no mercado que a copie cobrando preços menores (como a DiDi e a Lyft copiando a Uber, ela própria a empresa a derrubar o monopólio dos táxis).
Assim, quando há uma mudança repentina na demanda, é importante que deixemos que os preços subam. Por quê? Porque os preços altos levam os mercados a aumentarem os pedidos e garantir que o estoque seja reposto. O processo também recompensa os mercados por manterem as lojas abertas num momento em que a cadeia de suprimentos está sendo afetada pelo coronavírus, aumentando os custos. Ele também estimula os empreendedores a produzirem os bens de consumo que queremos e de que precisamos no momento.
O aumento de preços também é importante para garantir que os consumidores se comportem da forma mais eficiente possível. O consumidor entender que o aumento no preço de bens enlatados significa que ele deve economizá-los para o futuro, e não abri-los ao acaso quando não estão a fim de cozinhar. O aumento no preço do papel toalha significa que você pode limpar a sujeira com uma folha, não três.
A inteligência do sistema de preços é que todo esse controle dos recursos funciona automaticamente. Nenhum burocrata esperto precisa inventar um plano, nenhum político atrapalhado precisa se envolver e não é necessária nenhuma intervenção drástica.
Muitas pessoas desprezam esse tipo de argumento. “Tudo funciona muito bem no quadro-negro, mas o mundo real é muito mais complicado do que essa bobagem idealizada!”
O mundo real é mesmo mais complicado. Tão complicado que nossos esforços para “superar” o sistema de preços “sem coração” inevitavelmente leva a desastres. As leis excessivas de salário mínimo devastam as comunidades pobres, as leis de controle de aluguéis geram uma enorme escassez de moradia e regulamentações que estabelecem preços máximos levam à falta de itens básicos e ao surgimento do mercado negro.
Será que já nos esquecemos dos controles de preços durante a crise do petróleo, nos anos 1970? O caráter de baixo para cima do sistema de preços leva em conta milhões de consumidores e várias limitações aos produtores, sem a necessidade de uma supervisão de cima para baixo.
Se leis contra preços abusivos evitam que os preços subam, corremos o risco de testemunharmos a falta prolongada de itens básicos, gerando filas e racionamento, coisas que não são apenas um enorme desperdício como também incentivam o surgimento de mercados paralelos e estimulam a criminalidade e até a violência.
Embora os controles de preços geralmente sejam implementados em nome da proteção dos pobres e mais vulneráveis, poucos discordam que são os pobres e os mais vulneráveis os que tendem a ser mais prejudicados pela falta de produtos e pelo racionamento.
O racionamento tende a favorecer os mais ricos (graças aos mercados negros), os mais bem-informados ou aqueles que têm a sorte de dispor das conexões certas. É melhor acabar com a falta de produtos rapidamente, por meio dos preços mais altos, do que ampliar a miséria com a carência de produtos. Sem preços relativos mais altos, os empresários não terão incentivo para arriscar o tempo e o dinheiro para eliminar esses fatores.
Na verdade, a comunidade ficaria melhor se o governo disponibilizasse empréstimos aos pobres e deixasse os preços subirem livremente. As alterações nos preços é o que gera a mudança de comportamento no consumidor – e é isso o que precisamos ver na prática.
Mitchell Harvey é professor e pesquisador assistente na Monash University.