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Os Estados Unidos vivem uma crise de empatia.
Essa crise não está na falta de caridade. Per capita, os norte-americanos doam para as instituições filantrópicas sete vezes mais do que os europeus. E não está na indisposição em gastar: o governo dos Estados Unidos atualmente é o que mais gasta na história.
A crise de empatia tampouco tem a ver com uma incapacidade de se pôr no lugar do outro. Os Estados Unidos formam uma das nações mais racial e religiosamente tolerante da Terra.
A crise de empatia se centra num único fato: os Estados Unidos estão divididos em duas definições mutuamente excludentes de empatia. Essa divisão é intransponível e está esquartejando o país.
Um grupo (chamemo-los de “empáticos movidos pela neutralidade”) define a empatia como uma forma de tratar os outros como indivíduos capazes de escolhas livres e que merecem ser tratados com igualdade perante a lei.
Para esse grupo, a empatia se manifesta no respeito pela capacidade dos outros seres humanos e na ideia de que eles tomam decisões diferentes das suas. Essa ideia de empatia não exige que concordemos com as decisões alheias, e sim que entendamos que não nos cabe controlá-los.
O outro grupo (chamemo-los de “empáticos centrados na emoção”) acredita que a empatia significa associar a solidariedade ao sentimentalismo na lei. Para esse grupo, empatia quer dizer concordar com os sentimentos específicos do outro, recusando-se a avaliar se esses sentimentos são válidos e justificados, e depois moldando a política levando em conta esses sentimentos.
O primeiro grupo acredita que a política tem a ver com soluções que busquem a igualdade dos indivíduos perante a lei. Para ele, a política e a empatia emocional podem estar em conflito.
Já os centrados na emoção acreditam no contrário disso. Eles acreditam que a política tem a ver com a solidariedade emotiva, e não com a busca por soluções. Para esse grupo, a política deve ser guiada pela empatia emotiva.
Para usar um exemplo, pense na questão do desempenho dos alunos negros. Os empáticos motivados pela neutralidade sugerirão que padrões meritocráticos são o único meio neutro a ser aplicado na educação e que tais padrões funcionaram como escada para vários seres humanos de várias raças; que, se os estudantes negros têm um desempenho pior nos exames, eles merecem empatia, mas isso não quer dizer alterar os padrões.
Já os empáticos centrados na emoção vão na direção oposta, sugerindo que o mero fato de os alunos negros terem um desempenho pior exige que se altere os exames – do contrário, isso seria abandonar a solidariedade pelos que têm desempenho baixo, seria ignorar os múltiplos fatores que indubitavelmente levaram à nota baixa.
A batalha entre os empáticos neutros e os centrados na emoção gera uma assimetria política enorme. Isso porque os neutros reconhecem que, embora muitos possam discordar deles, isso não quer dizer que sejam maus ou cruéis.
Para os empáticos emotivos, contudo, vale o contrário: se uma medida está diretamente associada à empatia, a discordância representa uma brutalidade emocional e uma crueldade. Não só isso. Não pode haver tolerância, porque sugerir que as pessoas sofram as consequências por seus atos é um descuido e uma falta de empatia. À tolerância falta solidariedade.
O abismo da empatia é uma crise. Se você acredita que empatia significa tratar pessoas como indivíduos capazes de pensar e agir sob regras neutras, podemos ter uma sociedade.
Se você acredita que empatia significa moldar as políticas de acordo com a solidariedade a sentimentos subjetivos, as regras se tornam um caleidoscópio variável e fluido – e, em geral, para levar essas regras a cabo é preciso a força.
A empatia pelas pessoas enquanto seres humanos completos significa reconhecer a capacidade delas, entender suas diferenças e se apegar à ideia da igualdade sob a lei. Se rejeitarmos esses princípios em favor de uma abordagem elitista e paternalista do poder político, a liberdade não sobreviverá.
Ben Shapiro é apresentador do “Ben Shapiro Show" e editor do Daily Wire.