Há mais de 100 anos, a caça – sim, a caça! – ajuda a preservar as aves nos EUA porque caçadores se unem para evitar que as espécies que amam desapareçam.| Foto: Pixabay

Ambientalistas, principalmente os aventureiros de fim de semana, acreditam que a única maneira de salvar as espécies em extinção é “protegê-las”: proibir a caça, colocá-las na lista de espécies ameaçadas e restringir o contato entre o mundo animal e humano. Os caçadores há muito acreditam que a melhor maneira de salvar espécies em extinção é matá-las: permitir que animais selvagens sejam apanhados para alimentação e esporte torna claro o valor das espécies e incentiva os caçadores a fazerem o trabalho duro de protegê-las e proteger seu habitat.

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A conexão entre caça e conservação nos Estados Unidos remonta pelo menos ao início do século XX. A American Fisheries Society, por exemplo, observa que organizações de pescadores como a Izaak Walton League foram fundamentais para salvar uma população em declínio de achigãs após um relatório de 1925 alertar que a espécie desapareceria se nenhuma atitude fosse tomada. Os pescadores fizeram uma parceria com os legisladores para impor restrições federais ao transporte de achigãs pelas fronteiras estaduais (eles costumavam ser pescados para comer, acredite ou não), e as agências estaduais de vida selvagem trabalharam para conservar e estimular a reprodução das espécies populares de animais de pesca esportiva a pedido dos pescadores. Hoje em dia, os tanques de achigãs produzem milhões de peixes.

Esse modelo de conservação já foi testado e aprovado ao longo do tempo, mas um novo estudo publicado na revista Science indica que as espécies esportivas têm muito mais chance de sobrevivência do que as espécies não esportivas. Os resultados do estudo não parecem promissores: de acordo com os pesquisadores da Universidade de Cornell, desde a década de 1970 a população de aves da América do Norte diminuiu em 3 bilhões de aves, ou 30%. Os relatos da imprensa (com razão) se concentraram nas perdas “impressionantes”, como o primeiro autor do estudo, Ken Rosenberg, as descreveu na Science.

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No entanto, há um lado bom nisso que não foi notado. Mesmo que a quantidade de pardais, melros, cotovias e tentilhões tenha caído acentuadamente, as populações de espécies de caça, entre elas perus, perdizes, patos e gansos, aumentaram no mesmo período. Organizações de conservação como a Ducks Unlimited sabem que as populações de aves aquáticas estão saudáveis. Isso não é novidade. Mas o fato de essas populações permanecerem estáveis enquanto outras espécies sofrem perdas catastróficas atesta o trabalho de caçadores e organizações de conservação relacionadas à caça nos Estados Unidos.

Rosenberg concorda. “As aves aquáticas são, sem dúvida, a maior história de sucesso, e destacamos isso no relatório, e eu o faço em todas as minhas palestras”, disse-me ele. “Foram os caçadores que notaram o declínio da população de aves aquáticas em meados do século XX e fizeram algo a respeito. Políticas foram implementadas e bilhões de dólares foram arrecadados pela Ducks Unlimited. Houve um esforço muito direcionado para gerenciar, proteger e gerenciar área alagáveis e restaurar populações de aves aquáticas para que houvesse populações saudáveis para a caça”.

Mike Brasher, especialista em aves aquáticas da Duck’s Unlimited, explicou que o sucesso das espécies de caça pode ser atribuído, em parte, ao ativismo persistente e ruidoso. “Certamente, o fato de essas espécies serem caçadas cria em torno delas um círculo de ativistas muito envolvido e que tem uma forte conexão com esse recurso”, disse-me ele. “Quando a migração de aves aquáticas é menor do que os caçadores gostariam, eles tiram o telefone do gancho e ligam para seus biólogos e legisladores”.

Os números demonstram a eficácia desse lobby "de raiz". De acordo com o estudo de Rosenberg, enquanto as populações de pardais, melros e tentilhões caíram entre 30% e 50%, as populações de perus e perdizes aumentaram em mais de 20%, e as de patos e gansos em mais de 50%.

“Nunca é tão simples”

Como tudo relacionado à natureza, a realidade é complexa. Todos os biólogos e outros cientistas com quem conversei tinham discordâncias quanto ao tema e é importante notar que uma infinidade de atores contribui para o sucesso de uma espécie.

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“Nunca é um fator apenas que está causando um declínio ou uma recuperação”, diz Brasher. Ele ressalta, por exemplo, que os gansos se adaptam prontamente aos ambientes urbanos e agrícolas, como qualquer pessoa que foi perseguida por uma patrulha de gansos do Canadá na beira de um lago pode testemunhar. Grande parte do aumento da população de gansos foi impulsionada por algumas subespécies específicas que prosperam nos campos de milho e arroz, de acordo com Brasher.

Mark Hatfield, diretor de serviços de conservação da Federação Nacional de Perus Selvagens, também observou que as espécies de caça tendem a ser adaptáveis por definição – os seres humanos caçam os tipos de animais que existem em grande número. “As espécies de caça são tipicamente bastante adaptáveis. Elas têm um amplo alcance geográfico e prosperam em meio a perturbações e mudanças de habitat”, disse-me Hatfield. “Alguém poderia argumentar que a razão de serem espécies de caça é porque elas são muito adaptáveis. Então, encontramos essas espécies, as transformamos em caça e depois aprendemos a gerenciá-las”.

Ainda assim, está claro que os esforços dos caçadores contribuíram diretamente para a saúde de muitas espécies de caça, e as aves aquáticas são as principais entre elas. “As populações das espécies mais abundantes de aves aquáticas permaneceram muito saudáveis, apesar da drenagem de áreas alagáveis que continua ocorrendo, assim como a mudança da vegetação nativa”, diz Brasher. “É aí que começamos a ver o valor de toda a ação de proteção por meio do esforço contínuo de organizações conservacionistas e seus apoiadores – principalmente os caçadores dos EUA e do Canadá”.

Os cientistas costumam citar a codorna americana como uma exceção ao sucesso do esforço conservacionista dos caçadores, mas, nesse caso, ela é uma exceção que confirma a regra. Comumente caçada no leste dos Estados Unidos, a população de codornas americanas sofreu um declínio de 85% entre 1966 e 2014, de acordo com a Pesquisa de Aves de Criação da América do Norte. Os esforços dos caçadores não foram suficientes para retardar o declínio e, em muitos lugares, não há mais codornas americanas suficientes para caçar.

Apesar desse fracasso, o declínio da codorna americana contraria a ideia de que as espécies de caça são inerentemente adaptáveis. Sem a intervenção suficiente dos ativistas que amam e respeitam as espécies, os animais de caça podem ser vítimas da perda de habitat que dizimou a maioria das espécies de aves estudadas por Rosenberg e seus colegas.

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Uma receita para o sucesso

Rosenberg cita vários fatores, incluindo pesticidas, que podem ter contribuído para o declínio geral da população de aves da América do Norte. A perda de habitat é provavelmente a maior culpada. Ele observa que, embora as aves estejam sumindo de vários habitats diferentes, os afetados pela agricultura parecem ter sido os mais atingidos.

“Não faz muito tempo, havia muitas margens gramadas, sebes e vegetação selvagem por aí”, diz ele. “As áreas agrícolas estavam cheias de pássaros. Nas últimas duas décadas, isso realmente mudou com o milho e outras culturas plantadas a perder de vista. Essa agricultura limpa e intensa não tem espaço para a vida selvagem”, diz.

E os caçadores não devem assumir que suas espécies favoritas estão a salvo. Hatfield identifica a falta de manejo de habitat em uma sociedade cada vez mais urbana como a maior ameaça às populações de perus selvagens nos EUA. “À medida que nos tornamos mais urbanos, perdemos a conexão com as regiões rurais e com a ética da terra”, diz ele. “Essa falta de manejo influenciará as populações de perus selvagens em todo o país”. As queimadas controladas, por exemplo, são uma maneira eficaz de manejar a cobertura vegetal em grandes propriedades, mas os proprietários de terras relutam em utilizá-las por medo de irritar seus vizinhos suburbanos, que agora vivem muito mais perto deles do que nas gerações anteriores.

Historicamente, é aqui que o Ducks Unlimited, a Federação Nacional de Perus Selvagens e uma série de organizações semelhantes têm mostrado seu valor. Trabalhando com agências estaduais e federais de vida selvagem, esses grupos de conservação usam os milhões de dólares que arrecadam a cada ano para preservar, gerenciar e recuperar o habitat de populações de vida selvagem de costa a costa.

Quando pedi exemplos específicos para a Ducks Unlimited, os representantes da organização enviaram dezenas de anexos destacando projetos individuais. No ano passado, por exemplo, o grupo fez uma parceira com o Serviço de Pesca e Vida Selvagem dos EUA para transformar um campo agrícola cavado e drenado de 24 hectares, em um “habitat de alta funcionalidade para pássaros”. O campo fica no Refúgio Nacional de Vida Selvagem de Blackwater, em Maryland, que fornece 11.331 hectares de habitat fundamental para a migração de aves. A Ducks Unlimited entrou em cena porque, como muitas áreas alagáveis costeiras, o refúgio corre o risco de se perder devido ao aumento do nível do mar.

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O mesmo se deu na Federação Nacional de Perus Selvagens. Por meio de parcerias com caçadores, bem como com agências estaduais e nacionais, a FNPS organizou projetos de conservação individuais para aumentar a população de perus de 1,3 milhão, na década de 1970, para 4,5 milhões em 2014. A FNPS conservou 8 milhões de hectares de terra para o habitat de perus desde que o registro teve início em 1984. (A Ducks Unlimited ajudou a preservar 5,7 milhões de hectares desde 1937).

Nenhum dos cientistas com quem falei sugeriu que a solução para as populações cada vez menores de aves "não caçáveis" esteja na caça aos pardais e melros. Ainda assim, Rosenberg expressou interesse em replicar as estratégias de organizações relacionadas à caça para ajudar a preservar espécies que não são de caça.

O trabalho começa na raiz: indivíduos dispostos a gastar tempo e dinheiro para preservar e manter o habitat. A equipe de Rosenberg no Laboratório de Ornitologia Cornell publicou um artigo detalhando sete medidas simples que as pessoas podem tomar para ajudar a preservar a população de pássaros, entre elas aumentar a segurança das janelas, manter os gatos em ambientes fechados e comprar café de fazendas que se importam com as aves.

"Parece trivial, mas não é. Se pudermos aumentar o mercado para esses produtos, podemos fazer a diferença”, disse Rosenberg.

Politicamente, Rosenberg espera que os entusiastas dos pássaros possam seguir o exemplo dos caçadores e incentivar os legisladores a imporem medidas firmes de proteção à vida selvagem. "Da mesma maneira que os caçadores lutaram por políticas como a Lei de Conservação das Áreas Alagáveis da América do Norte, precisamos de políticas equivalentes que possam fornecer os recursos para as agências administrarem a terra", disse ele.

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Embora as espécies de caça sofram as mesmas ameaças de habitat que afetam a população geral de pássaros, para os caçadores a receita vencedora é simples: continue fazendo o que está dando certo. Tanto Brasher quanto Hatfield concordam que, no ecossistema de conservação, os caçadores são os produtores primários. Entre licenças de caça, impostos especiais de consumo sobre equipamentos de caça, doações privadas e ativismo jurídico, os caçadores alimentam os esforços de conservação mais bem-sucedidos de nosso país há quase 100 anos.

“Os caçadores são a base da cadeia alimentar, a parte mais importante do que fazemos”, conclui Brasher. “Eles são o combustível que aciona o motor”.

Jordan Sillars é escritor freelance, pretenso caçador e candidato a Ph.D. em na Baylor University.

© 2019 National Review. Publicado com permissão. Original em inglês.
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Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]