As estimativas são confusas, mas hoje praticamente não se discute que as políticas da União Soviética na década de 1930 mataram algo entre 7 e 12 milhões de ucranianos. Foi uma das maiores tragédias da história.
O mundo sabia pouco sobre a fome na Ucrânia. Quando jornalistas independentes tentaram obter notícias sobre a atrocidade, foram acusados de promover teorias da conspiração. Isso lhe soa familiar?
O jornal New York Times, cuja sucursal em Moscou tentou proteger a União Soviética e calar pontos de vista opostos, desde então pediu desculpas por seu papel na supressão de notícias sobre a fome.
Com base em como a imprensa lida com as notícias sobre a Covid-19 hoje em dia, contudo, é claro que nos esquecemos de quaisquer lições que possamos ter aprendido sobre o perigo de se calar ideias e opiniões dissidentes como o jornal fez em relação àquela tragédia.
A parte mais estranha sobre o esforço para interromper o debate sobre a origem da Covid-19 é que até os especialistas concordam que não sabemos a solução para o problema. Há uma teoria que se destaca entre as demais, por exemplo, mas não sabemos exatamente de onde veio a Covid-19.
A doença matou quase 2,5 milhões de pessoas ao redor do mundo e quase meio milhão só nos Estados Unidos. Todo mundo quer saber exatamente de onde ela veio e como a pandemia começou, mas os esforços para se investigar isso foram minados desde o começo.
Entre os que mais querem suprimir as opiniões dissidentes estão o governo chinês, a imprensa norte-americana, as redes sociais e os cientistas com interesses financeiros ou de reputação atrelados a qualquer investigação.
A melhor análise até agora sobre as origens da Covid-19 foi escrita por Nicholson Baker, na New York Magazine. Baker fez um trabalho tão bom que o Washington Post e outros veículos resolveram dar uma segunda olhada.
Baker conta a história e o debate intenso na comunidade científica sobre a origem laboratorial do coronavírus. Em essência, os cientistas têm criado coronavírus perigosos em laboratórios há anos. O objetivo deles é ajudar a prever e nos proteger de vírus que podem nos contaminar no mundo real.
Alguns cientistas argumentam há anos que esse tipo de pesquisa traz poucos benefícios e é perigosa demais. Em termos claros, eles dizem que a pesquisa em si pode causar uma pandemia. Há milhões de dólares em jogo e milhões de vidas poderiam ser afetadas.
Como escreveu Baker, a batalha científica pela criação desses vírus cada vez amis perigosos em laboratórios é intensa.
Em 2014, na administração Obama, os Estados Unidos deixaram de financiar esse tipo de pesquisa por causa de seus perigos. O financiamento foi retomado em 2017, na administração Trump. Parte do financiamento do governo norte-americano foi destinado ao Wuhan Institute of Virology, localizado no epicentro da pandemia de coronavírus.
A maioria dos cientistas parece acreditar que o vírus se espalhou naturalmente, oriundo de morcegos ou outro animal e transmitido aos humanos de Wuhan, na China. Mas esse não é um fato comprovado. É a teoria prevalente, com várias lacunas a serem preenchidas, incluindo o fato de que os morcegos em questão vivem há 1500km ao sul de Wuhan.
O problema é que os personagens mais importantes para uma investigação sobre a origem da Covid-19 são a China, a Organização Mundial da Saúde, submissa à China, e os cientistas envolvidos no debate sobre as experiências laboratoriais perigosas realizadas nas últimas duas décadas.
O vírus teve início na china, então não podemos investigá-lo sem a ajuda dela, mas a China tem se omitido e silenciado cientistas chineses. A OMS tampouco tem sido útil. Quanto aos cientistas, é impossível uma investigação sem eles, mas os conflitos de interesse entre eles são evidentes.
O dr. Peter Daszak, único norte-americano na equipe da OMS, é ligado ao principal pesquisador de coronavírus de morcegos na China e foi um personagem importante no direcionamento do dinheiro do contribuinte para o Wuhan Institute of Virology.
Daszak chegou a organizar uma campanha de relações públicas em 2020 para retratar a hipótese de a pandemia ter surgido num laboratório como “conspiração” antes mesmo de qualquer investigação ser realizada. O porta-voz dele mais tarde disse que o objetivo era proteger os cientistas do laboratório, mas o beneficiário final da decisão foi Pequim e sua narrativa.
A questão não é provar que Daszak é mau nem que o vírus surgiu a partir de experiências de laboratório. A questão é que não sabemos. Se você analisar os detalhes das investigações até aqui realizadas, chegará à mesma conclusão: ainda não sabemos de nada.
Mais importante, o esforço para conter a teoria de vazamento do laboratório não convence ninguém.
O fato é que a SARS escapou duas vezes de laboratórios de Pequim em 2004. O vírus que causa a Covid-19 é o SARS-CoV-2. Se a SARS 1.0 vazou de um laboratório chinês duas vezes, por que chamar de teoria da conspiração a pergunta se a SARS 2.0 também escapou de um laboratório chinês? Ninguém foi capaz de responder convincentemente a isso.
Como fundador da Check Your Fact, uma das melhores agências de checagem dos Estados Unidos, sei bem que existe uma quantidade absurda de informação inventada na Internet.
Quando se trata de questões de saúde, como o coronavírus, a desinformação pode ser perigosa. Mas também é perigoso permitir que envolvidos e países com algo a esconder usem a acusação de desinformação ou conspiração para suprimir o debate legítimo de uma hora para outra.
Ao longo da história, várias conclusões iniciais de especialistas sobre problemas importantes se provaram erradas com o tempo: o “bug do milênio”, a ideia de que o Titanic era “inafundável” e a de que o cigarro fazia bem à saúde. A lista é enorme.
A imprensa deveria ser cética. Ela deveria procurar conflitos de interesse, mas hoje nos Estados Unidos praticamente ninguém entende essa narrativa simples porque a imprensa optou por ignorá-la. Não vivemos mais na década de 1930, mas parece que nada mudou.
Neil Patel é cofundador do Daily Caller e da Daily Caller News Foundation, organização que treina jornalistas, produtores, checadores e repórteres investigativos.