Processo do CONAR avaliará se exposição de crianças, adolescentes e vulneráveis a imagens geradas por IA de pessoas falecidas pode causar confusão| Foto: Reprodução / Youtube Wolkswagen do Brasil
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O Conselho Nacional Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária (CONAR) abriu, nesta segunda-feira (10), uma representação contra a campanha "VW Brasil 70: O Novo Veio de Novo", em que a cantora Maria Rita faz um dueto com sua mãe, Elis Regina, com imagens recriadas por Inteligência Artificial. Ambas cantam "Como Nossos Pais", a canção de Belchior que se tornou quase um hino de rebeldia da juventude a partir de 1976, ano de seu lançamento.

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O processo será avaliado pelo Conselho de Ética do CONAR dentro de 45 dias e pode levar à suspensão ou correção do filme, além de uma advertência – nada que realmente pareça impactar a campanha publicitária da Volkswagen e da Agência de publicidade AlmapBBDO, responsável pela criação da peça, devido ao tamanho da repercussão que o próprio filme e a ação têm gerado na imprensa e nas redes sociais.

O processo foi iniciado a partir de uma reclamação/denúncia realizada pelo advogado Gabriel de Brito Silva, que questiona se o uso da imagem de uma pessoa falecida fere as condutas do Conselho. No documento encaminhado ao órgão, ele afirma que o direito de imagem protege a personalidade física da pessoa, mas que apenas os direitos autorais, referentes às obras deixadas, são transmitidos aos herdeiros.

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No filme, Maria Rita aparece dirigindo o ID.Buzz, automóvel elétrico que é lançamento da montadora, ao lado de uma antiga Kombi dirigida por sua mãe, que faleceu em 1982. Segundo o Marco Giannelli, diretor comercial (CCO) da AlmapBBDO, agência responsável pela criação do anúncio, “a campanha usa uma tecnologia sofisticada para um propósito muito humano: emocionar. Estamos promovendo um dueto inédito que só era possível na imaginação e que agora se torna absolutamente real durante os dois minutos do filme”.

Mas nem todos podem ter tido a mesma emoção. Segundo Brito, ela veio "na mesma proporção do desconforto", já que a cantora falecida não pode reivindicar o uso da própria imagem. "Não se sabe sequer se viva fosse, a Elis autorizaria a imagem, ainda mais para fabricante de automóveis e para fins estritamente comerciais", complementa.

Tão logo foi lançado, no dia 3 de julho, com a autorização dos filhos de Elis, o filme gerou controvérsia nas redes sociais e na mídia, tanto pelos questionamentos envolvendo a ética da "ressurreição de pessoas" por meio de IA, quanto pelo uso do deepfake  (técnica que sintetiza imagens e sons, e que foi utilizada para criar as imagens da cantora). Outra polêmica girou em torno de Elis ter sido contra o regime militar que, à época, contava com o apoio da Volkswagen.

Brito Silva ainda destacou que o uso de imagens de pessoas falecidas sem alertar o público de que são recriadas por IA pode causar "desconforto, perturbação e mistura entre ficção e realidade para alguns, principalmente crianças, adolescentes e vulneráveis". O filme em si, que pode ser visto aqui, não traz qualquer advertência sobre como as imagens de Elis Regina foram geradas, tampouco a extensa descrição que o acompanha.

Em nota, o CONAR afirmou que o processo será examinado sob a luz do Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária, que avaliará o "respeito à personalidade e existência da artista". Como não há regulação para o emprego de IA no país, a decisão do órgão pode abrir precedentes e definir seu uso até que seja normatizado por lei.

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Em resposta à esta reportagem, a Volkswagen afirmou que "foi notificada pelo CONAR em 10 de julho e apresentará sua resposta no prazo concedido". A AlmapBBDO também foi procurada, mas não se manifestou até a publicação desta matéria.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]