O vídeo típico segue o seguinte roteiro: uma garota com o cabelo preso e o rosto recém-lavado aparece. Ela olha para a câmera, inspeciona a testa, puxa o canto dos olhos, o canto da boca.
E então começa o desfile de produtos: dupla limpeza com água micelar e gel de limpeza, aplicação de tônico, sérum de vitamina C, ácido glicólico e ácido salicílico ou retinol, creme para a área dos olhos, dois tipos diferentes de hidratante, protetor solar.
"Eu uso muito ácido glicólico, porque suaviza a textura da pele", explica aos seus seguidores. "E uma quantidade excessiva de hidratante, mesmo que minha pele não seja seca. Ele preenche a pele."
No banheiro, estende-se uma fileira de produtos que chamam atenção pelo design: minimalista, em cores neon, com uma estética cuidada e embalagens fotogênicas, perfeitas para um vídeo no TikTok.
Age is an old idea (“Idade é uma ideia antiga”), diz o slogan de uma das marcas de hidratante. Essa é uma das maiores preocupações da garota que aparece no vídeo: evitar rugas e parecer mais velha.
Ela tem treze anos.
Uma nova obsessão
A luta contra o envelhecimento da pele está se tornando uma prioridade crescente em todos os grupos demográficos, desde mulheres de 60 anos até meninas de 10 que, de repente, consumidas pelo medo de ter rugas dentro de 20 anos, começam uma rotina diária "preventiva".
Essa fixação pela pele deu origem a dois novos conceitos: dermorexia e cosmeticorexia.
"A dermorexia é uma obsessão com a aparência da pele que leva à busca constante por tratamentos estéticos para melhorá-la. A cosmeticorexia seria uma consequência dessa dermorexia, em que o paciente consome um número exagerado de cosméticos para melhorar sua aparência ou prevenir o envelhecimento cutâneo", explica a médica Cristina García Millán, especialista em Dermatologia Pediátrica e Estética.
"Já vi pacientes muito jovens com esse transtorno, ou com indícios dele, já que o diagnóstico definitivo deve ser feito por um psiquiatra."
Os principais sintomas, segundo Cristina, são uma preocupação excessiva com a aparência, uma visão distorcida da própria imagem e um comportamento compulsivo na compra de cosméticos e tratamentos estéticos.
Além disso, há também ansiedade, depressão e isolamento social. Adicionalmente, entre as consequências estão a iatrogenia (efeitos adversos) por excesso de tratamentos e, em muitos casos, problemas financeiros devido ao gasto excessivo em produtos e procedimentos.
A especialista confirma que essa obsessão afeta principalmente as mulheres, devido à maior pressão social sobre sua aparência, embora alerte que também afeta os homens.
Mas como chegamos até aqui? Como passamos da rotina de dois passos das nossas avós para as rotinas atuais, com inúmeros passos que exigem uma "colinha" anexada ao espelho para serem lembradas?
Há vários fatores que contribuíram para isso, mas entre os principais está a inevitabilidade do cuidado com a pele nas redes sociais.
"O aumento dos casos de cosmeticorexia tem sido observado nos últimos 15-20 anos, coincidindo com a proliferação das redes sociais e a crescente pressão dos padrões de beleza promovidos pela indústria dermocosmética", acrescenta a médica.
Filtros digitais
Anúncios, marcas de cosméticos criadas por celebridades, vídeos no TikTok. A proliferação de conteúdo nas redes sociais com cremes e séruns como protagonistas é tão avassaladora que é praticamente impossível viver alheio a isso.
Segundo Cristina García Millán, "as redes sociais influenciam negativamente de duas maneiras: promovendo padrões de beleza irreais e fomentando a comparação constante".
Um dos principais inimigos da pele real são os filtros digitais e os programas de edição de imagens, que passaram a ditar os padrões da pele perfeita (e inalcançável). As redes sociais não só tornaram impossível ignorar essa cultura (para não dizer ditadura) da beleza, mas também alteraram nossas expectativas sobre a aparência em cada idade.
Agora reina o Instagram face, uma versão digitalmente aprimorada de si mesmo: sem poros, sem linhas finas ou rugas, sem textura na pele. Sem idade definida.
Muitas jovens tentam se parecer cada vez mais com suas fotos filtradas, e os produtos antienvelhecimento proporcionam a tranquilidade de estarem no caminho certo para alcançar esse ideal: trazer o rosto dos seus perfis digitais para a vida real.
Outro fator importante são os referenciais. Maquiar-se sempre foi um passatempo para as meninas, um ensaio para os papéis adultos. Imitar a mãe, a irmã mais velha, a garota popular da escola. Pintar as unhas, os lábios.
Mas agora não estamos falando apenas de um pouco de sombra de olhos e blush. Falamos de rotinas faciais de beleza que integram muitos passos e produtos químicos que têm o poder de agredir a pele infantil.
Segundo Cristina, os pais podem contribuir para essa fixação se forem pessoas que se preocupam excessivamente com a aparência ou trabalham em setores em que a imagem é primordial.
Jessica DeFino, jornalista especializada em beleza e autora da newsletter The Review of Beauty, cunhou recentemente o termo Serum Mom para descrever as mães "obcecadas em atingir um determinado padrão de beleza e que alimentam a mesma obsessão em seus filhos".
Agora, porém, entraram em cena os referenciais digitais. Cada vez mais meninas deixam de imitar suas mães, irmãs mais velhas ou a garota popular da escola para copiar a influenciadora da mesma idade que veem na tela.
A promessa do autocuidado
Uma das palavras que quase sempre acompanha essa prática é "autocuidado". É uma forma de desconectar, de se sentir bem, de fazer algo positivo por si mesmo. Essas rotinas não buscam apenas cuidar da pele, mas também da mente. É um estilo de vida.
Mas essa narrativa tem um problema. Em uma época em que adolescentes declaram níveis recordes de ansiedade e tristeza, não é surpreendente que se invista tanto tempo e dinheiro em produtos para a pele que prometem, de forma vaga, melhorar o bem-estar mental.
Não se trata apenas de algo que vai melhorar o futuro delas, mas também de algo que as fará sentir-se melhor no presente. No entanto, essa é uma promessa, na maioria dos casos, não cumprida. Um creme não fará desaparecer a angústia, assim como um limpador facial não fará evaporar o mal-estar.
Isso não quer dizer que não se deva ter nenhum tipo de rotina. Como explica a especialista, pode ser benéfico para uma menina de 11 anos se for conduzido da maneira correta.
"Focar na higiene básica, educação e autocuidado saudável pode ajudar a estabelecer hábitos positivos sem fomentar a superficialidade ou a obsessão com a aparência."
No entanto, ela acrescenta que devem ser estabelecidos limites no acesso a cosméticos e decidir o que elas podem usar ou não, com a ajuda de um dermatologista.
"Se observarmos que a criança dá importância excessiva ao momento da rotina, se ela se isola para passar horas no banheiro, se dedica muito tempo nas redes sociais buscando tratamentos e acumula muitos produtos, devemos consultar um especialista em saúde mental."
A educação em casa, tanto no conceito de beleza realista quanto na autoestima, é fundamental para prevenir o perfeccionismo e o medo que, na maioria das vezes, estão na origem dessa obsessão.
O mais preocupante dessa realidade é a crescente percepção do tempo passando em uma idade muito jovem: passou-se de uma infância alheia a essa realidade para uma infância aterrorizada por ela – e numa idade em que, até poucos anos atrás, ainda se acreditava que seria eternamente jovem.
Não estamos na era do bem-estar: estamos na era da aparência. Do medo do passar do tempo, do medo do próprio tempo. Mas este não pode nem deve ser interrompido: se tivermos sorte, envelheceremos.
© 2024 Aceprensa. Publicado com permissão. Original em espanhol: Cosmeticorexia: la nueva obsesión entre los adolescentes
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