Ouça este conteúdo
Um hábito antigo das elites ocidentais é uma certa condenação seletiva.
Às vezes, os ocidentais aplicam padrões críticos para o Ocidente que eles jamais aplicariam a outras nações.
Meu colega do Hoover Institution, o historiador Niall Ferguson, disse que a celebridade adolescente sueca verde Greta Thunberg poderia ser mais eficaz na sua defesa da redução das emissões de carbono redirecionando sua animosidade. Em vez de censurar europeus e americanos, que recentemente alcançaram as quedas mais dramáticas no usos de combustíveis fósseis em todo o planeta, Thunberg deveria voltar sua atenção para a China e a Índia e ecoar seu “como ousam!” para conseguir que os líderes desses países reduzissem a emissão de carbono.
Se o mundo continuará ou não a emitir níveis alarmantes de compostos de carbono vai depender muito das políticas da China e da Índia. Afinal, esses dois países representam mais de um terço da população global e continuam a expandir suas indústrias à base de carvão.
No final da década de 1950, muitos membros da elites norte-americana acreditaram na fantasia soviética de que a marcha do comunismo poria fim ao Ocidente. Depois, quando o poder soviético erodiu, no anos 1980, o Japão Inc. e seu modelo de capitalismo de Estado se tornaram a alternativa preferida ao capitalismo democrático ocidental.
Depois que a economia do Japão se estabilizou, a emergente União Europeia se tornou a nova utopia dos anos 1990. Os americanos deveriam estar impressionados com o fato de o euro ter ganhado terreno em relação ao dólar. O socialismo democrático sem fronteiras da Europa e seu “poder brando” foram considerados preferíveis aos reacionários Estados Unidos.
Em 2015, a UE estava uma bagunça, então a China foi alçada à condição de superpotência mundial incontornável. Os intelectuais americanos exaltavam o transporte ferroviário de alta velocidade, as indústrias movidas a energia solar e os reluzentes aeroportos, constrastando isso com o cenário oco e sujo dos Estados Unidos.
Agora, a cortina se abriu e revelou a podridão do Partido Comunista Chinês, seus campos de reeducação semelhantes a gulags, suas trapaças mercantis sistemáticas, seu aparato de vigilância orwelliano, suas crises sérias de saúde pública e sua infraestrutura primitiva no interior do país.
Depois da estagnação da União Soviética, Japão Inc., UE e da superpotência chinesa, ninguém sabe bem qual alternativa será a próxima a enterrar os Estados Unidos.
Duplo padrão
EUA e Europa costumam criticar bastante a violência contra mulheres, minorias e gays. A União Européia, por exemplo, costuma destaca Israel por seus supostos maus-tratos aos palestinos na Cisjordânia.
No entanto, se o objetivo do ativismo ocidental de direitos humanos é conter o viés e o ódio mundiais, seria muito mais econômico se concentrar nos maiores infratores.
Atualmente, a China tem cerca de um milhão de uigures muçulmanos em campos de reeducação. No entanto, não há nenhum grupo ativista pedindo desinvestimento, boicote e sanções contra Pequim da mesma maneira que atacam Israel.
A homossexualidade é um crime capital no Irã. Sabe-se que dezenas de gays iranianos foram presos e milhares executados sob a lei teocrática desde a queda do Xá em 1979. No entanto, raramente o ativistas ocidentais pedem que o mundo isole o Irã.
Não procure no Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas qualquer condenação relevante de preconceito e ódio no mundo, embora a instituição seja uma crítica frequente dos EUA e de Israel.
Muitos dos 47 países membros do Conselho de Direitos Humanos são violadores habituais dos direitos humanos. Em 2017, nove países membros perseguiram cidadãos que estavam trabalhando ativamente para implementar os padrões de direitos humanos da ONU.
Há muitas razões para o ultraje seletivo e o pessimismo dos ocidentais em relação à sua própria cultura. A covardia explica algumas das assimetrias. O ataque ao pequeno Israel democrático não resultará em retaliação. Já um conflito com uma China poderosa ou um Irã homicida poderia resultar em vingança.
A culpa também explica um pouco da seletividade. As nações europeias ainda são culpadas pelo colonialismo e imperialismo do século XIX. Elas vão sempre procurar a absolvição, pois os cidadãos das antigas nações coloniais e do Terceiro Mundo agem como vítimas perpétuas – mesmo no século XXI pós-moderno.
Sinalizações de virtude são cada vez mais comuns. As elites ocidentais frequentemente discutem pequenos delitos quando não conseguem lidar com crime reais – um estranho tipo de penitência psicológica que justifica a sua impotência.
É muito mais fácil para a cidade de Berkeley proibir o gás natural de queima limpa produzido nos EUA em prédios recém-construídos do que proibir o petróleo bruto muito mais sujo da Arábia Saudita. Atualmente, os machistas, homofóbicos e autocratas sauditas são a maior fonte do petróleo importado pela Califórnia, enviando ao estado cerca de 100 milhões de barris por ano, sem os quais milhares de motoristas de Berkeley não poderiam chegar ao trabalho. Aparentemente, a proibição do gás limpo norte-americano permite que se justifique a importação do petróleo sujo saudita.
As elites ocidentais estão perpetuamente ofendidas. Mas, da próxima vez que elas derem lição de moral a um alvo específico, pense na origem e na motivação do insulto.
Victor Davis Hanson é um classicista e historiador da Hoover Institution da Stanford University e autor do livro "The Second World Wars: How the First Global Conflict Was Fought and Won".