Jovens nascidos entre o final de 1990 e 2010 cresceram em ambiente digital e causam impacto inédito no mercado de trabalho| Foto: Pixabay
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A chegada da Geração Z ao mercado de trabalho está causando mais barulho do que a entrada de grupos anteriores. Os profissionais que nasceram entre meados de 1990 e 2010 vêm redefinindo o ambiente corporativo com o seu impacto inédito: é a primeira turma de jovens que nasceu totalmente imersa em uma “revolução digital” sem precedentes.

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Na esteira da transformação pela internet, inteligência artificial e interconectividade, os chamados Gen Z somam habilidades ao mercado de trabalho como nenhuma outra geração. Dominam a tecnologia, têm capacidade de impulsionar a inovação e persistem em suas crenças (qualidade e vida, propósito) – fatores que não foram prioridades em outras décadas.

Por outro lado, muitos destes jovens na média dos 20 e poucos anos chegam ao mercado mais frágeis emocionalmente, mimados, sem independência e pouco alheios ao mudo real, desmerecendo profissionais mais velhos, e numa postura como se o mundo e a empresa devessem se curvar às suas vontades, segundo palavras de executivos e gestores.

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A fotografia (ou selfie) em 2025 revela que a geração Z prioriza a saúde mental e a flexibilidade, valoriza mais o propósito do que o salário, aprende rápido e é adaptável.

Entre um filtro e outro, mostra também que alguns deles chegam a levar os pais nas entrevistas de emprego e, em geral, precisam ser convencidos para obedecer a ordens e não têm paciência para processos e resultados. Muitos não sabem lidar com frustações e desafios mais complexos.

“Esses jovens cresceram em um ambiente mais protegido e altamente digitalizado. Foram criados por pais superprotetores, que impuseram poucos limites e raramente disseram ‘não’. Isso reduziu sua exposição a frustrações e os acostumou a respostas rápidas para tudo”, analisa Silvina Ramal, especialista em Cultura Empreendedora e Desenvolvimento de Pessoas.

As características acima variam conforme a cultura da empresa, a área de atuação e a necessidade do emprego do jovem, entre outros aspectos. Nas vagas muito concorridas, o Gen Z tende a se adequar à empresa. Já em setores com alta demanda, são mais exigentes.

Sem paciência para resultados

O amplo contato com as telas também se reflete na paciência limitada com processos. Como, em geral, os Gen Z passaram menos tempo na rua e mais tempo com dispositivos eletrônicos, querem retornos imediatos, inclusive ascender na carreira.

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Não entendem que existe um caminho a ser percorrido, compartilha a executiva de uma multinacional, que não quis se identificar:

“Essa geração Z está acostumada com tudo a um clique de distância. Já nasceram na época do streaming, de vídeos sem propaganda. Nunca vão saber o que é ir à uma locadora, escolher um único filme, ver se estava disponível, rebobinar a “fita” ou se adequar à programação da TV, com comerciais, como as gerações X (nascidos de 1965 a 1980) e os Millennials (de 1981 a 1996). Isso ilustra o que moldou nossa geração, que sabe esperar, dar valor ao tempo”, exemplifica a executiva nascida em 1987.

Segundo Silvina Ramal, outro ponto crítico é a percepção irreal que muitos jovens da Geração Z têm de suas próprias habilidades e potencial. Com frequência, demonstram grande confiança e acreditam estar totalmente preparados, esperando reconhecimento imediato.

No entanto, diz ela, essa expectativa nem sempre corresponde à realidade, o que pode levar à frustração, conflitos e, muitas vezes, à desmotivação ou até mesmo à desistência precoce de um emprego. A mudança frequente de emprego é comum na Geração Z.

Carolina Tzanno, gerente sênior de Recursos Humanos da Catho, pontua que os jovens Gen Z são mais questionadores: “Não é que não aceitam (ordens), mas são mais curiosos”. Por isso, ela defende que os colegas veteranos sejam empáticos com a nova geração que está chegando.

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Pais na entrevista de emprego

Silvina conta que em uma das seleções que estava fazendo para escolher um estagiário, uma moça entrou na sala com o seu pai.

“Ele respondia tudo. Eu olhei fixamente para ela, ignorei a presença do pai e disse que gostaria que ela respondesse às perguntas. Na época, achei que era um caso isolado, e não o início de uma nova onda”, lembra ela.

Não era uma situação atípica. Uma pesquisa realizada no ano passado, nos Estados Unidos, pela empresa de produção de currículos Resume Templates revelou que 60% dos integrantes da Geração Z pedem aos pais para encontrar empregos para eles e 25% os levaram para entrevistas de emprego.

Em outro exemplo, Silvina compartilha a história de um colega líder de desenvolvimento de sistemas que foi chamado para melhorar a produtividade de um grupo de jovens na faixa de 20 anos. Ele alterou prazos, cronogramas e metas, mas a equipe se reuniu, revoltada, e se queixou da pressão.

“Disseram que esse meu colega tinha deixado um deles magoado por reclamar da produtividade dele, e que ninguém mais estava a fim de trabalhar porque o clima estava péssimo. Ele os tinha estressados e estavam tristes. Essas não são palavras comuns no ambiente de trabalho e ele não estava preparado para lidar com elas”, relata Silvina.

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É neste ponto que a Geração Z causa maior impacto. Mesmo com suas peculiaridades, o mercado precisa destes futuros profissionais – ainda que alguns ajustes de produtividade sejam necessários.

Silvina recorda que, no ano passado, uma amiga que trabalha há 20 anos com recrutamento pediu ajuda numa situação singular: o candidato não dirigia e dependia da disponibilidade da mãe para ir a compromissos, mas era um programador excepcional. O que fazer?

O jeito é se adaptar. Dos dois lados

A geração Z precisará se adaptar às exigências do mundo real: existem regras, hierarquia, coletividade, processos, tempo. O mercado, por sua vez, precisa evoluir para reter estes talentos que são necessários na transição digital.

“As empresas precisarão ajustar suas práticas para atrair essa nova geração, enquanto os jovens precisarão desenvolver resiliência para enfrentar desafios profissionais que nem sempre têm respostas imediatas”.

Silvina aponta que a Geração Z traz uma mudança bem positiva, além da digital. É uma turma que não aceita modelos tóxicos de trabalho e isso pode, de fato, mudar o mercado como o conhecemos hoje, justamente por essa pressão de talento x necessidade.

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“Eles viram seus pais darem tudo por empresas que nem sempre recompensaram o esforço realizado. Viram pais perderem o emprego, dificuldade de se recolocarem, injustiças, outros terem problemas de saúde, e muitos viram os pais chegando tarde em casa, faltando aos eventos da escola por causa do trabalho. É claro que isso impactou a forma como enxergam o mundo do trabalho”, analisa a especialista.

Carolina Tzanno, da Catho, observa que a transição entre gerações demanda atenção das lideranças, que costumam ser X ou Millennial. Além do choque geracional, o líder precisa estar preparado para receber esse jovem mais questionador, ágil, tecnológico e atento às pautas como sustentabilidade e diversidade. “Tudo isso acaba provocando as empresas”.

“Às vezes, as posturas da Geração Z podem exasperar os mais velhos, mas admiro sua coragem de não renunciar ao que realmente importa: mais flexibilidade, equilíbrio e propósito. Minha geração queria mudar o mundo aos vinte anos – e hoje somos os primeiros a criticar a geração Z. Mas, ironicamente, talvez sejam eles que, sem alarde, finalmente consigam transformá-lo”, pondera Silvina.