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Estados que abrandaram as leis antidrogas registraram aumento da criminalidade e do número de mortes por overdose.
Estados que abrandaram as leis antidrogas registraram aumento da criminalidade e do número de mortes por overdose.| Foto: Unsplash/Randy Laybourne

Em novembro de 2020, a população do estado americano do Oregon votou pela legalização da posse e do uso de drogas (não apenas maconha: também cocaína, heroína, fentanil, etc.).

A crença do eleitorado e dos políticos na iniciativa – a chamada Medida 110 (M-110) – consistia na ideia de que a descriminalização e desestigmatização dos narcóticos contribuiria para melhorar os índices de segurança pública e diminuiria o número de mortes devido à overdose.

Esse “faça o que quiser” foi, no entanto, a cereja que faltava no bolo da anarquia que o estado engole à força desde que o assassinato de George Floyd, pelas mãos de um policial de Minneapolis, em maio daquele ano, provocou manifestações violentas para exigir que a aplicação da lei seja desestimulada.

Os assaltos às lojas, os incêndios criminosos e os distúrbios públicos deixaram perplexa uma população que no mês de novembro seguinte, nas urnas, não encontrou nada melhor do que aprovar – com 58% dos votos – a iniciativa de descriminalização de fato das drogas.

A regulamentação entrou em vigor em fevereiro de 2021. Segundo a lei, se a polícia parar alguém na rua transportando uma pequena quantidade de uma droga “pesada”, uma multa de U$ 100 (R$ 504, na cotação atual) é aplicada. Mas o infrator pode deixar de pagá-la se participar de sessões com um especialista em desintoxicação.

Poucos pagaram ou foram consultar um especialista, por isso a polícia parou de multar para não perder tempo.

“A Medida 110 basicamente isentou o uso de drogas da criminalização, então o tráfico e o consumo ao ar livre tornaram-se a norma. Isso frustrou as autoridades locais, incluindo o prefeito de Portland, já que pouco poderia ser feito”, afirmou Kevin Sabet, presidente da Foundation for Drug Policy Solutions [Fundação para Soluções sobre Políticas de Drogas], em entrevista ao Wall Street Journal.

Entre 2021 e 2022, o Oregon teve a segunda maior taxa de todos os estados americanos em termos de residentes que relataram ter usado drogas ilícitas no mês anterior.

Quanto à desejada redução nas mortes por overdose que a descriminalização teoricamente traria, Sabet aponta: “Entre 2020 e 2022, as mortes por overdose no Oregon aumentaram 75%. Saltaram de 797 para 1.392. Um índice muito superior ao aumento de 18% registrado em todo o país, de acordo com os Centros de Controle e Prevenção de Doenças”.

Os entusiastas do M-110 tentaram desvincular a implementação da iniciativa do aumento de mortes. Para eles, a crise das overdoses pode ser explicada pela maior abundância de fentanil do que de outros narcóticos, a falta de serviços sociais, os efeitos persistentes da pandemia e, principalmente em Portland, a escassez de moradias disponíveis – fatores que impulsionariam o consumo perigoso.

A questão é: por que, sabendo da existência dessas condições catalisadoras, o governo estadual não se absteve de dar luz verde às drogas sem primeiro tentar enfrentar as circunstâncias que aumentariam o seu uso indiscriminado?

Mas nunca é tarde para corrigir (a menos que o nome de alguém esteja incluído na lista das 1.256 mortes no Oregon por overdose em 2022, ou das 1.683 em 2023).

No dia 6 de março, uma maioria bipartidária na Câmara e no Senado do estado aprovou uma Lei, a 4.002, para “recriminalizar” até mesmo a posse de pequenas quantidades de fentanil e cocaína – e a governadora democrata Tina Kotek vai assiná-la.

Entre as mudanças previstas no texto está a pena de seis meses de prisão para quem for pego portando essas drogas nas quantidades estipuladas. E as penas só poderão ser evitadas se os usuários iniciarem uma terapia de desintoxicação.

Além disso, será facilitado o acesso à moradia às pessoas que estejam em tratamento, sem que a sua condição de toxicodependente seja um impedimento. Por fim, a polícia poderá coibir o consumo em áreas públicas e terá mais poderes para prender traficantes.

Em paralelo à influência que a lei pode ter na diminuição das mortes por overdose, espera-se que a reintrodução das restrições, acompanhada de uma maior presença policial, além de incentivos fiscais, convença muitas empresas a não abandonarem os seus investimentos na região.

ONGs progressistas veem a volta das restrições como um retrocesso

Grupos progressistas de ativismo social, como o Imagine Black, não concordam com a mudança de direção. Para a entidade, revogar a M-110 é um retrocesso que prioriza a posição da polícia sobre a comunidade negra.

Segundo Joy Alise Davis, diretora da ONG, os afro-americanos do Oregon são duas vezes mais perseguidos por porte de drogas que os brancos, e a nova medida apenas “aprofundará as disparidades já existentes”.

Danita Harris, outra ativista do Imagine Black, afirma que, desde a implantação da M-110, milhares de moradores do estado conseguiram se livrar da “falsa solução” de ir para a prisão – e que a medida trazia uma saída adequada para um problema de saúde. Por isso, o retorno ao rigor não a convence.

“Os legisladores usaram o M-110 como bode expiatório para os fracassos da legislatura, porque durante anos permitiram que a falta de acesso à habitação e a insegurança econômica em geral se agravassem, sem que houvesse investimento em soluções”, diz Danita.

Segundo ela, à luz destas condições, qualquer expectativa de que uma lei resolvesse todos os problemas sociais em menos de três anos seria irrealista. “A implementação foi ainda mais complicada graças à recusa das autoridades em utilizar o sistema de multas e infrações criado pela M-110.”

Ela ainda explica que “uma série de decisões políticas acabaram causando uma trágica falta de moradia e de serviços de apoio para comunidades vulneráveis ​​em todo o estado”.

Portanto, de acordo com Danita, as soluções para a atual crise das drogas “devem se afastar da dependência excessiva do sistema prisional e reconhecer que a ação policial é uma solução inadequada para os problemas de saúde”.

“Se essa abordagem tivesse funcionado, os Estados Unidos seriam o país mais seguro do mundo, uma vez que há mais pessoas presas aqui do que em qualquer outro lugar”, afirma.

Pode-se dizer que, de fato, as condições sociais influenciam a questão do tráfico, do consumo e das mortes por overdose.

A segregação por bairros de acordo com o nível socioeconômico ou a comunidade étnica, a maior ou menor desagregação familiar e as deficientes políticas de coesão pública, entre outras circunstâncias, podem dificultar, para quem vive nas zonas mais pobreS, a subida no elevador da mobilidade social e a ampliação de suas perspectivas de realização pessoal.

Na vida real, contudo, não parece que a descriminalização superficial do consumo e do tráfico de drogas ajude a modificar os problemas subjacentes acima mencionados, e poucas pessoas no Oregon perceberam uma melhoria com o “faça o que quiser”.

Uma pesquisa publicada em fevereiro pela conslutoria GS Strategies repetiu o mesmo resultado de um estudo realizado em agosto de 2023: 61% dos entrevistados consideraram a política um fracasso total, em comparação com 26% que pediram mais tempo para “ver se funcionava”.

A descriminalização e a suposta desestigmatização não resultaram em taxas de segurança mais elevadas ou em menos mortes, nem tiraram ninguém da pobreza.

Talvez, pelo contrário, tenham ajudado a perpetuar a desiguldade – como temem os que lutam contra a legalização em outros lugares do mundo. Um exemplo é a Holanda, “pioneira” na legalização da maconha.

O presidente da Câmara de Roterddam, Ahmed Aboutaleb, diz que está sendo construída uma opinião favorável à legalização nacional da venda e do consumo de cocaína. Seu homólogo em Amsterdam é abertamente partidário, mas ele não concorda.

Aboutaleb alerta que esse impulso favorável deriva do fato de a cocaína ser usada principalmente pela classe média. O seu consumo – ele disse ao jornal The Guardian – é normalmente visto como uma forma de socialização.

“O uso da cocaína tem sido considerado menos grave, da mesma forma que a criminalidade entre pessoas de classes superiores é normalmente considerada menos grave. Isso pode acabar arrastando a miséria e a corrupção para grupos inteiros de jovens de bairros da classe trabalhadora.”

Revisão da descriminalização vem sendo observada em outras regiões dos EUA

Um processo semelhante ao da recriminalização da posse e do consumo em público no Oregon vem acontecendo em outros estados americanos.

No vizinho Washington, por exemplo, falhou a tentativa de submeter à consideração dos eleitores, durante as eleições de novembro de 2022, uma consulta sobre a Iniciativa 1922.

A medida propunha financiar com fundos públicos a investigação sobre as consequências do consumo de drogas, ao mesmo tempo em que descriminalizava a sua posse e autorizava a anulação de certas condenações.

A ideia não entusiasmou a população. Eram necessárias pelo menos 324 mil assinaturas para incluir a proposta na votação, e apenas 200 mil foram coletadas. Diante disso, os entusiastas do projeto – entre eles a progressista União Americana pelas Liberdades Civis – anunciaram em junho daquele ano que o engavetariam.

Outros, porém, não tiveram de ver o problemas enfrentados pelos vizinhos para perceber onde estariam se metendo. Na Califórnia, governada pelos democratas, está ganhando apoio uma iniciativa que será votada em novembro e amplia as punições para ações que conspiram contra a segurança e a saúde públicas.

A Iniciativa-23-0017A1, denominada “Lei de Redução dos Sem-Abrigo, da Dependência de Drogas e do Roubo ”, procura corrigir até certo ponto a Proposição 47, que os californianos aprovaram em 2014.

A intenção, naquele momento, era reduzir a população carcerária, reduzindo o rigor das medidas punitivas contra roubos e o tráfico e posse de entorpecentes.

Os defensores da modificação se dizem a favor da norma de 2014, embora admitam que ela causou “problemas imprevistos na última década”.

Entre eles roubos repetidos e muitas vezes organizados em lojas, fechamento do comércio em centros urbanos e dificuldades em convencer as pessoas a procurarem tratamento de drogas e saúde mental – consequências que podem ser corrigidas pelos eleitores nas urnas com emendas à Proposição 47.

São necessárias 547 mil assinaturas para a incluir a iniciativa nas urnas. Segundo a CNN, 75% delas já haviam sido asseguradas no início de março.

©2024 Aceprensa. Publicado com permissão. Original em espanhol: Despenalización de las drogas: Las barbas de Oregón

Conteúdo editado por:Omar Godoy
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