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Rua dos Aflitos

Disputa identitária: luminárias japonesas são retiradas a pedido da militância negra em São Paulo

Imagens da Rua dos Aflitos, no bairro da Liberdade em São Paulo, colhidas em 23 de novembro de 2024, após a remoção das luminárias japonesas.
Imagens da Rua dos Aflitos, no bairro da Liberdade em São Paulo, colhidas em 23 de novembro de 2024, após a remoção das luminárias japonesas. (Foto: José Flávio Júnior/Gazeta do Povo)

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A Rua dos Aflitos, no bairro da Liberdade em São Paulo, é um beco sem saída com uma capela ao fundo que dá nome ao local: a Capela de Nossa Senhora das Almas dos Aflitos. Ela foi construída em 1779 e abriga um cemitério histórico de escravos. Por esta razão, o movimento negro tem interesse no local.

Na semana do Dia da Consciência Negra (20), a reivindicação prioritária de representantes do movimento, atendida pela prefeitura, foi a remoção de luminárias japonesas no local, também conhecidas como “lanternas Suzuranto”. O bairro da Liberdade, uma morada histórica de imigrantes japoneses e de outros países do Leste Asiático, continua com as luminárias em outras ruas.

Ativistas defendem a medida, público discorda

“As luminárias apagavam a memória preta e indígena da Liberdade”, afirmou o grupo Quilombo Periférico, uma “mandata coletiva” ligada à vereadora Elaine Mineiro, do PSOL. O grupo não conseguiu se reeleger em 2024, mas o partido conseguiu seis de 55 cadeiras da Câmara Municipal. “Seguiremos na luta pela construção do memorial e pela restauração da Capela dos Aflitos”, disse o grupo no Instagram.

“Não vejo polêmica alguma, mas a reparação de um apagamento histórico”, disse Douglas Nascimento, colunista da Folha de S. Paulo, em artigo reproduzido pela ONG Geledés, influente no movimento negro e beneficiária de verbas da Open Society de George Soros. Para o colunista, a instalação das luminárias nos anos 1970 foi resultado de “copiar modismos estrangeiros que o brasileiro adora”. “O apagamento da identidade negra, se intencional ou não, obteve grande êxito”, afirmou Nascimento, que também critica que o governo alterou o nome da estação de metrô mais próxima de “Liberdade” para “Japão-Liberdade”.

Os comentários mais populares na coluna discordam do autor. “Não acho que destruindo alguma coisa se promova outra”, disse o leitor José Cardoso. “Por que não enfeitar o beco com outros motivos indígenas e negros? Essa militância não tem criatividade, combate a suposta exclusão com mais exclusão”, disse o leitor Mário Tagara.

Valéria Fernandes da Silva, doutora em história que mantém o blog sobre cultura japonesa “Shoujo Café” há quase 20 anos, tem memórias afetivas da Liberdade, onde passou sua lua-de-mel em 2001. “De minha parte, considero realmente triste a retirada dos postes”, disse a estudiosa. Ela concorda que há um “apagamento da presença negra”, mas questiona se a remoção das luminárias “ajuda em alguma coisa”. Para Silva, o novo nome da estação foi um erro, mas o nome dado em 2023 à Praça da Liberdade foi um acerto: “Liberdade África-Japão”.

Em nota, a Prefeitura de São Paulo defendeu a remoção das lanternas Suzuranto da Rua dos Aflitos, afirmando que “buscou equilibrar o respeito às diferentes camadas culturais presentes no bairro da Liberdade, garantindo que a memória de cada grupo seja adequadamente representada”.

No início de 2022, a Mitra Arquidiocesana de São Paulo aprovou um projeto de restauração da Capela dos Aflitos, que é tombada como patrimônio pelo estado e o município. Em junho de 2023, a Prefeitura anunciou um projeto arquitetônico para um Memorial dos Aflitos, com um mirante para destacar a capela.

Aparência da Rua dos Aflitos ainda é de descaso

A reportagem da Gazeta do Povo esteve no local no sábado (23). A capela tem aspecto dilapidado, com pintura desgastada. Os toldos com o nome da capela e informações históricas estão sujos, e não há muitos sinais externos das obras previstas. O visitante é recebido com uma grade à frente da igreja. Moradores locais disseram que ela está fechada.

A União dos Amigos da Capela dos Aflitos (Unamca), cujo número já foi dado na entrada da capela para contatos a respeito de visitações, informou à Gazeta do Povo que a igreja esteve aberta pela última vez em 2 de novembro, sem perspectiva para reabertura devido à restauração. A entidade reproduziu nas redes sociais apoio à remoção das luminárias.

Toda a estética da rua é comprometida por pichações que tomam quase todos os prédios. Os postes com as luminárias já foram substituídos por postes de LED com design minimalista.

O serviço Google Maps mostra a Rua dos Aflitos como era antes da remoção, ainda este ano: os quatro pares de postes vermelhos, com três luminárias japonesas em cada, junto com a capela eram os poucos alentos estéticos na paisagem local. No modo street view, que permite visualizar a rua em três dimensões, a imagem ao fundo da rua não foi atualizada e data de 2019. Ela registra que as pichações pioraram muito em cinco anos.

Imagem da Rua dos Aflitos, no bairro da Liberdade em São Paulo, registrada em 2024, antes da remoção das luminárias japonesas, pelo Google Maps.Imagem da Rua dos Aflitos, no bairro da Liberdade em São Paulo, registrada em 2024, antes da remoção das luminárias japonesas, pelo Google Maps. (Foto: Reprodução/Google Maps)

Funcionários de um restaurante local expressaram desânimo com a remoção das luminárias. Já alguns visitantes mais jovens expressaram concordância com a decisão, reproduzindo jargão da militância.

Colaborou para esta reportagem José Flávio Júnior.

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