“Não vou fazer isso”. Assim declarou o professor Jordan Peterson, da Universidade de Toronto, num vídeo publicado no YouTube algumas semanas antes das eleições norte-americanas de 2016. Palavras ousadas e, para alguns, incendiárias. Peterson se tornou um homem marginalizado por dizer que não comprometeria a verdade (muito menos a gramática) se submetendo a uma determinação que ele acredita restringir significativamente a liberdade de expressão, mencionando sua intenção de continuar usando os pronomes certos para se referir às pessoas, e não os “pronomes designados”, que em geral não passam de uma “mentira designada”.
Girando em torno de entrevistas com Peterson, sua família, amigos e detratores (esses grupos não são excludentes), o documentário The Rise of Jordan Peterson [A ascensão de Jordan Peterson] é um retrato justo e equilibrado de como Peterson se transformou no professor mais famoso da América do Norte e líder por acaso de um movimento associado aos jovens homens e que gira em torno da autorresponsabilidade e da ideia de se criar ordem a partir do caos.
Mas antes Peterson se tornou um saco de pancadas para aqueles que querem controlar as palavras e talvez os pensamentos alheios, o “Professor contra o Politicamente Correto”, como ele mesmo se identificava em seus vídeos no YouTube. Provocador e às vezes belicoso, Peterson provou ser o homem certo para este momento. Os alunos organizaram protestos contra ele e, quando ele tentou falar em público, os alunos abafaram sua voz com instrumentos e alto-falantes tocando death metal. Peterson é mostrado simplesmente desconectando um alto-falante e se recusando a se calar.
O documentário reserva muito tempo para os oponentes ideológicos dele, que nas entrevistas dizem coisas como “quase vomitei sobre meu teclado”, como se sua incapacidade de controlar seu aparelho digestivo fosse culpa de Peterson. “Você me magoou, por isso quero prendê-lo” é uma ideia que ganha força dia após dia, e Peterson merece ser elogiado por ser um personagem raro na universidade a chamar isso de absurdo. As hordas raivosas que querem códigos de expressão ainda mais restritivos aparecem mal no filme, mas só porque o documentário os retrata com fidelidade.
Coescrito e dirigido por Patricia Marcoccia, The Rise of Jordan Peterson tenta captar a essência da persona pública de Peterson e “revelá-lo”, para usar um verbo muito caro ao professor. Solícito e educado, Peterson fala com uma voz calma e não resiste a se mostrar um provocador: Caco, o Incendiário. Às vezes essa alma calma parece o candidato improvável a chicotear exércitos oponentes. Ele talvez preferisse se ater a sua obra acadêmica em sistemas de crenças, mitos e arquétipos. Mas, como outras personalidades de direita, Peterson se sente motivado por uma incapacidade de permitir que as bobagens prevaleçam sem serem contestadas. Uma filha lhe dá um teste no qual Peterson tem que se autoavaliar em várias categorias. “Você não tem ideia de como eu fico realmente irritado”, diz ele num momento revelador. Ele também diz que não gosta tanto de debater quanto as pessoas pensam. “Eles me tiram do sério e eu não recuo de um debate”. Há um quê de diversão nisso tudo, claro. “Aprendi a ganhar dinheiro com os justiceiros sociais”, diz ele, com brilho nos olhos.
Embora Marcoccia seja solidária a Peterson, ela passa vários minutos mostrando o amigo e também professor Bernard Schiff, que já morou com a família Peterson e tem um filho transgênero. Schiff chega a considerar Peterson uma pessoa cruel e perigosa. Outro colega dele que continua sendo seu amigo, Will Cunningham, tem dificuldades para reconciliar o Peterson bombástico com o homem gentil que ele conhece. “Ele diz coisas horríveis às vezes”, afirma Cunningham. O documentário cita petersonismos como “Será que as feministas evitam criticar o Islamismo porque inconscientemente desejam ser dominada pelos homens?”. Numa entrevista para a televisão, Peterson é visto sugerindo que mulheres que usam sapatos de salto alto e maquiagem estão sendo hipócritas quando reclamam de assédio sexual no trabalho. É como se a imprensa levasse Peterson a se tornar a caricatura do direitista e ele obedecesse.
Hoje Peterson tem 2,3 milhões de inscritos no seu canal do YouTube e seu livro 12 Regras para a Vida continua sendo um dos principais livros de autoajuda do nosso tempo. Ele não é infalível em todos os temas, mas sua mensagem central é sólida e clara. Jovens que se aproximam dele não só em palestras, mas também na rua, agradecem-no por Peterson ter lhes dado algum propósito na vida. Graças a Peterson, “Limpe seu quarto” se tornou um meme (e ele diz que o único cômodo bagunçado em sua casa é aquele onde ele guarda as mercadorias inspiradas nele e que as pessoas lhe mandam; espalhar o evangelho da arrumação o está afundando em bagunça). Não deveríamos ter chegado a um estado tal em nossa cultura a ponto de as instruções de Peterson de “ande ereto” e “diga a verdade” parecerem necessárias e até contraintuitivas, mas chegamos e espero que Peterson possa continuar a inspirar jovens a assumirem o controle de si mesmos.
Kyle Smith é crítico da National Review.