Algumas pessoas da esquerda estão começando a achar que estão sendo trolladas pela ‘alt-right’, a direita alternativa. Isso acontece porque a alt-right está se tornando agressivamente anticapitalista, a favor do Estado de bem-estar social e a favor de um governo que promove especificamente interesses brancos, não um livre mercado que oferece igualdade a todos.
“A alt-right está buscando expandir a sua abrangência”, declara o site de notícias Salon. “E líderes proeminentes do notório movimento de supremacia branca aparentemente acreditam que a esquerda é um alvo ideal para os seus esforços de recrutamento.” Isso sucede uma grande peça investigativa que apareceu no jornal The Nation, na qual um repórter da publicação foi a uma série de eventos da alt-right, onde ideias de esquerda eram novidade.
O Salon alerta a esquerda para não cair nessa:
“O ‘anticapitalismo’ da alt-right, então, é na verdade apenas um antissemitismo envolto em um véu econômico, desprovido de qualquer crítica real ao capitalismo. A sua virada econômica é apenas um meio de expandir o seu movimento e espalhar a sua ideologia racista.”
Há um fundo de verdade nessa declaração. Antissemitismo e racismo tem sido uma parte fundamental dos ataques ao mercado por séculos, o que levanta algumas questões interessantes sobre a própria esquerda antimercado.
A alegação do Salon minimiza o antiliberalismo exacerbado da ideologia da alt-right, um tópico que forma a tese do meu livro sobre esse tema. Na sua origem, essa perspectiva foi formada em oposição ao poder transformador dos mercados. Isso está enraizado em um ressentimento pela expansão da liberdade e prosperidade no começo do século 19, e o medo de que o capitalismo destruiria as velhas hierarquias, relações tradicionais e fronteiras nacionais. A revolta que eles favoreciam era sempre uma revolta contra o mercado.
Trollando a Esquerda
É verdade que nos tempos modernos, nos Estados Unidos, essa gangue ganhou notoriedade tentando se passar por libertários, participando de encontros, conferências e invadindo debates no Reddit. Isso funcionou durante algum tempo, devido ao comprometimento libertário à liberdade de associação e expressão. Mas então as pessoas ficaram espertas. No último ano, muitos líderes da comunidade libertária se esforçaram para preservar a integridade das ideias libertárias e se certificarem de que não estavam sendo prejudicados por essa gangue.
O libertarianismo então passou a ter baixo desempenho no recrutamento da alt-right. Foi aí que a mudança se tornou aparente. A nova linguagem da alt-right tem a ver com denunciar o capitalismo corporativista como um fracasso. Eles dizem que o capitalismo é muito politicamente correto, está excluindo-os das mídias sociais, impedindo-os de usar ferramentas financeiras para angariar dinheiro e está promovendo os seus inimigos em cooperação com a mídia.
A esquerda frequentemente acusa o capitalismo de fazer coisas pelas quais não é realmente culpado, como excluir os pobres, explorar os trabalhadores, destruir a terra, entre outros. A alt-right, no entanto, está atacando o capitalismo por coisas que as corporações estão de fato fazendo, e fazendo bem. Essas pessoas não são populares, e as suas perspectivas se provaram tóxicas em meios como o Twitter e Facebook, e elas foram banidas não por motivos politicamente corretos, mas simplesmente porque elas reduzem o valor das plataformas.
De outros modos, entretanto, o mercado – que não faz acepção de pessoas ou ideologias – tem sido um grande amigo da alt-right. A Amazon vende os seus livros. Os seus podcasts são mantidos por firmas capitalistas. Os seus canais de publicação são baseados em modelos de lucro e prejuízo. O mercado fez o mesmo pelas ideologias de esquerda e ambientais. O mercado é uma ferramenta para todos, sem exceção.
Barreiras Tribais
Também é verdade que o mercado sempre proporcionou um impulso inicial para quebrar barreiras tribais. Ele pensa em termos de direitos individuais porque é projetado para conquistar mentes individuais. Se o seu objetivo é a promoção da solidariedade de grupo e exclusão, o mercado não é uma boa ferramenta. As suas palavras de ordem são inclusão e poder para todos. Foi a liberação gradual dos mercados e das tecnologias e os valores universalistas que vieram com elas que proporcionaram o fim da escravidão, promoveram os direitos das mulheres e das minorias e criaram essa coisa que chamamos de classe média.
Faz todo sentido, então, que a alt-right se revelasse antiliberal, não apenas na política, mas também na economia. Aliás, a esquerda deveria ficar desconfortável com o fato de que a alt-right se sente confortável com as ideias econômicas do socialismo, e não é a primeira vez que isso acontece. O que sempre uniu os Hegelianos da direita e da esquerda foi a sua oposição compartilhada à sociedade livre. Os detalhes da sua crítica e alternativas propostas são diferentes dependendo da tribo política, mas a própria liberdade econômica ser o alvo de ambos não é algo novo.
Relembre que no começo, o partido nazista pedia apenas boicotes a negócios judeus, e até mesmo instruía membros do partido a não usarem violência física. Isso foi em 1 de abril de 1933. A esperança era de que isso inspiraria o país a causar a falência dos judeus e expulsá-los do país. Isso não funcionou. As pessoas continuaram fazendo negócios com médicos, comerciantes e intelectuais judeus. O próximo passo foi absolutamente necessário: os nazistas aboliram o próprio mercado com as Leis de Nuremberg em 1935. A história nos mostrou que, se qualquer grupo visar controlar o mercado, ele primeiro deverá aboli-lo.
A Junção da Esquerda e Direita
A porta giratória entre a esquerda e a direita tem se movido por dois séculos. Pessoas como John Ruskin ou Thomas Carlyle foram conservadores não-marxistas em todos os aspectos, mas eles consideravam o mercado o maior inimigo das suas agendas de controle econômico e social. Os progressistas também, divididos entre ramificações da esquerda e da direita, cada um ansioso para usar o estado para deter o movimento do mercado que espalha os benefícios da prosperidade para todas as pessoas.
O modo estranho como a extrema esquerda e direita estão ligadas uma à outra foi percebido por liberais consistentes durante muito tempo. A sua associação é fluida, conforme escreveu Max Eastman em 1956, observando que “cada julgamento e escolha, cada traço e modo de comportamento, que uma vez atribuíram significado à palavra ‘Direita’ agora é suportado e aprovado por aqueles que todos concordam em chamar de ‘Esquerda’ ou ‘Esquerdistas’”.
Igualmente, houve períodos na história nos quais o que costumava ser chamado de esquerda repentinamente passou a ser chamado de direita, conforme ilustrado pela mente magicamente adaptável de Werner Sombart, que rapidamente fez a mudança do comunismo para o nazismo.
Na releitura muito truncada e caricata na eleição presidencial de 2016, muitos comentadores observaram o modo estranho com que era difícil distinguir as plataformas de Bernie Sanders e Donald Trump: anticomércio, “pró-trabalhador”, prometendo um sistema de saúde universal e, de modo geral, se voltando contra o globalismo e o poder financeiro do capitalismo. Que eles se odiavam não era uma surpresa. Isso se encaixa na narrativa histórica na qual as tribos políticas guardam os seus ataques mais injuriosos para aqueles cujas perspectivas são mais próximas das suas.
(Felizmente para o povo americano, o vencedor daquela eleição acabou descobrindo que desregulamentação e cortes tributários são mais populares para o público do que protecionismo e centralização executiva.)
A virada da alt-right para o anticapitalismo não é surpreendente, nem novidade, nem contraintuitiva. Isso não parte apenas de antissemitismo, mesmo que seja uma parte inevitável disso. Todo tipo e forma de coletivismo se opõem à liberdade econômica. É uma questão de tempo: toda forma de coletivismo acaba soando mais ou menos igual.
Jeffrey Tucker foi Diretor de Conteúdo para a Foundation for Economic Education. É sócio-gerente da Vellum Capital, fundador do Liberty.me, Membro Honorário Notável do Mises Brasil, consultor econômico para a FreeSociety.com, associado de pesquisa no Acton Institute, consultor político no Heartland Institute, fundador da CryptoCurrency Conference, membro do conselho editorial do Molinari Review, consultor na construtora de aplicativos blockchain Factom e autor de cinco livros, o mais recente deles “Right-Wing Collectivism: The Other Threat to Liberty” (“Coletivismo de Direita: A Outra Ameaça à Liberdade”, em tradução livre), com prefácio de Deirdre McCloskey (FEE 2017). Escreveu 150 introduções para livros e mais de dez mil artigos publicados na imprensa popular e científica.
Conteúdo publicado originalmente no site da Foundation for Economic Education.