No início da pandemia de Covid-19, colunistas preocupados com a história começaram a abrir seus livros e procurar o que aconteceu durante as pragas do passado. Talvez pudesse haver lições que servissem de guia para o futuro próximo. E, de fato, vimos a história se repetir: algumas pessoas se isolando por medo da doença; outras vivendo de forma mais hedonista, para aproveitar um pouco a vida antes do fim. Cidades se esvaziando e seus habitantes espalhando a doença no interior e no campo.
No final da Idade Média, encontramos movimentos religiosos extáticos tomando as ruas para fazer penitência diante de Deus. Em 2020, vimos protestos em todo o mundo. Pandemias podem causar tumultos. No passado havia bodes expiatórios, geralmente os judeus. No presente, assistimos ao prefeito de Nova York, Bill DeBlasio, criticar a comunidade judaica ortodoxa no Brooklyn por ir à sinagoga rezar, mesmo quando o movimento Black Lives Matter desafiou o distanciamento social e os toques de recolher impostos a todos os outros cidadãos.
Mas agora temos algo potencialmente novo em uma pandemia: um punhado de humanos e governos culpados.
Você deve ter notado que depois de um ano em que quase todas as autoridades de saúde cerraram fileiras para dizer que era ridículo acreditar que COVID-19 surgiu de um laboratório em Wuhan, agora não falta gente para falar sobre a teoria de vazamento em laboratório. O próprio Dr. Fauci, que rejeitou tal teoria como “não-científica”, agora está dizendo que não está “convencido" de que a Covid-19 surgiu na natureza ou em um mercado de animais silvestres. Até mesmo o chefe da Organização Mundial de Saúde disse que o vazamento do laboratório não poderia ser descartado, após uma investigação da OMS que foi praticamente direcionada para descartar essa teoria. Agora, o Wall Street Journal está informando que a inteligência dos EUA tem a informação de que vários funcionários do laboratório de Wuhan adoeceram e tiveram que ser hospitalizados em novembro de 2019, antes da pandemia ser oficialmente informada pelo governo chinês.
Sem entrar na questão ainda mais importante de se o vírus foi deliberadamente criado por como parte de um experimento de "ganho de função", se a teoria do vazamento de laboratório for verdadeira, a Covid-19 se torna o pior desastre causado pelo homem na história humana. Nada mais estaria remotamente perto.
O número final de mortos no desastre nuclear de Chernobyl é fortemente contestado. O número imediato de mortos é de 31 a 54. Mas isso mal chega aos efeitos da radiação, que afetou dezenas de milhares de pessoas, especialmente aquelas que estiveram envolvidas na limpeza e sepultamento do local. Mas mesmo na extremidade mais distante, quando extrapolamos generosamente a partir de aumentos mensuráveis de casos de câncer, é difícil encontrar danos diretos sérios além da escala de talvez dois milhões de pessoas, incluindo aqueles reassentados, aqueles que relataram quaisquer problemas de saúde ou abortados após as autoridades de saúde europeias aconselharem isso quase imediatamente após o acidente. O desastre da fábrica química Union Carbide em Bhopal, na Índia, matou com gás algo entre 15 mil e 20 mil pessoas e infligiu sérios problemas de saúde de longo prazo a talvez meio milhão de outras pessoas.
A Covid-19 supera todos esses. Até agora, a Organização Mundial da Saúde estima que quase 3,5 milhões de pessoas morreram de Covid-19 em todo o mundo. Algumas estimativas sugerem que entre US$ 16 e US$ 28 trilhões foram perdidos na produção econômica global devido às paralisações, lockdowns e interrupções na cadeia de abastecimento que se seguiram. O fechamento de escolas afetou 1,6 bilhão de pessoas. E isso sem falar sobre as pequenas, mas inesquecíveis perdas que as restrições impuseram às nossas vidas — as reuniões perdidas, ajuda a familiares, os funerais e casamentos aos quais nunca comparecemos.
Para muitos, seria psicologicamente mais fácil se Covid-19 fosse um produto da natureza. A crueldade e a inescrutabilidade da natureza são mais fáceis de aceitar.
Mas e se toda essa montanha de sofrimento nos últimos dois anos fosse produto de práticas de segurança inadequadas em um laboratório em uma cidade da qual a maioria das pessoas nunca tinha ouvido falar até 2020? Ou se foi em parte culpa de um partido político, o Partido Comunista Chinês — que, procurando evitar constrangimentos, impediu o mundo de descobrir a natureza desse surto quando houve tempo de fazer algo para evitar que se tornasse global? Ou se foi culpa das autoridades americanas que patrocinaram pesquisas de ganho de função no exterior, apesar dos riscos previsíveis de tentar tornar os vírus encontrados na natureza mais infecciosos em seres humanos?
Se a Covid-19 é um desastre causado pelo homem, tentar encontrar as pessoas, as instituições e os governos que criaram este desastre não é achar um bode expiatório, e sim uma necessária averiguação dos fatos antes de se fazer justiça.
Como pode ser essa justiça na prática? Pode incluir proibições globais de pesquisa de ganho de função. Essa medida por si só constituiria uma espécie de revolução silenciosa, uma admissão de que nem todo tipo de pesquisa científica é de fato benéfica para a humanidade. A reputação de todo o empreendimento científico sofreria imensamente com as consequências.
Se foi um projeto de pesquisa de ganho de função que deu errado, os funcionários de saúde pública que o apoiaram e autorizaram sofrerão uma queda dramática em relação à estatura que alcançaram no ano passado.
E se as pesquisas e investigações subsequentes puderem mostrar que as ações do governo chinês — a maneira como manipulou a Organização Mundial da Saúde no início da pandemia — contribuíram para um resultado global pior, pode ser hora de trazer a palavra “reparações” para as discussões internacionais novamente.
O processo de descoberta está apenas começando.
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© National Review 2021. Publicado com autorização. Original em inglês
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