O Bitcoin e outras criptomoedas estão em polvorosa agora.
As moedas eletrônicas não atreladas ao governo e descentralizadas, como o Bitcoin, existem há anos. Mas nos últimos meses o assunto esteve na linha de frente do debate nacional, depois que personagens importantes como Elon Musk compraram a moeda e o Bitcoin alcançou valores recordes.
Muitos norte-americanos talvez não tenham acompanhado a tendência de perto e agora estão buscando entendê-la. Assim, para ajudar os leitores a entenderem a novidade tecnológica, a FEE entrevistou Will Luther, professor de economia, diretor do Sound Money Project do American Institute for Economic Research e pesquisador do Cato Institute.
No que o Bitcoin é diferente do dólar?
Uma forma fácil de compreender o Bitcoin é compará-lo com o dólar.
“O Bitcoin é semelhante ao dólar em vários aspectos”, explicou Luther. “Ambos não valem intrinsicamente nada, o que quer dizer que não têm um papel como meio de troca. Ambos são irresgatáveis, o que quer dizer que não têm lastro em nenhum outro bem. E ambos são moedas digitais. O Bitcoin é totalmente digital, enquanto o dólar é só 99,96% digital”.
Mas as moedas também têm diferenças importantes.
Primeiro, o governo norte-americano centraliza o controle sobre o dólar e sua emissão. O Bitcoin é descentralizado, o que quer dizer que não há uma autoridade o controlando.
“A emissão de Bitcoin é pré-programada”, disse Luther. “Jamais haverá mais do que 21 milhões de Bitcoins em circulação e a emissão cumprirá uma trajetória determinada até atingir o máximo. Por outro lado, a oferta de dólares depende de decisões do Federal Reserve”.
Uma consequência disso é que o governo pode usar o dólar para causar inflação como bem entender, emitindo moeda. Ninguém pode usar o Bitcoin para causar inflação porque a oferta da moeda não é centralizada nem está sujeita à manipulação.
Outra diferença importante, de acordo com Luther, é que o “Bitcoin tende a dar mais privacidade financeira nas transações digitais”.
As trocas com o uso de dólar só são privadas se feitas pessoalmente, com dinheiro. As trocas digitais com o uso de dólar requerem um terceiro envolvido que registra a transação — como o seu banco. Isso abre espaço para violações da privacidade.
“Como o Bitcoin pode ser transferido sem o uso de terceiros, ele tende a dar mais privacidade financeira do que os mecanismos de pagamento tradicionais”, explica Luther.
O Bitcoin é uma “moeda” ou um “bem”?
Boa parte das notícias sobre o Bitcoin falam de pessoas ganhando ou perdendo dinheiro com a compra da criptomoeda e depois a vendendo em meio à volatilidade. À primeira vista, o Bitcoin parece mais semelhante a um bem, como uma ação, do que com uma moeda, no sentido de ser um meio de troca.
Mas o Bitcoin é as duas coisas, explica Luther.
“Antes de mais nada, o Bitcoin é uma moeda (ou uma moeda em potencial”, diz o economista.
Mas “todas as moedas são bens”, diz Luther. E alguns bens se valorizam. Por esse motivo, algumas pessoas pensam no Bitcoin como investimento. Mas essa é uma característica secundária. Na verdade, o preço do Bitcoin só aumentará se (1) ele se tornar mais útil com moeda e (2) ele foi mais usado como moeda no futuro. Por isso mesmo os que se interessam pelo Bitcoin apenas com investimento devem entender o papel dele como moeda”.
Por que o Bitcoin é tão volátil?
O Bitcoin é famoso por sua volatilidade, o que significa que seu preço sobe e desce drasticamente ao longo de períodos relativamente curtos de tempo. E isso o que o torna um atraente alvo de especulação para alguns, mas também uma barreira para sua adoção como moeda de troca.
“Como a oferta de Bitcoin é fixa, seu preço flutua de acordo com a demanda”, diz Luther. “O Bitcoin é mais volátil do que outros bens porque é um meio de troca. Ele é mais volátil do que outros meios de troca porque não tem uma fonte confiável de demanda”.
“Os meios de troca estão sujeitos ao que os economistas chamam de efeito cascata”, explica. “Ninguém quer usar uma moeda que ninguém mais usa. Todos querem usar a moeda que seus parceiros usam”.
“Portanto, minha decisão de aceitar Bitcoin o torna mais desejável para você, e vice-versa”, acrescenta Luther. “O efeito em cascata quer dizer que os picos de demanda são superdimensionados, já que qualquer coisa que torne o Bitcoin atraente para mim também o torna para você e a todo mundo simplesmente por ter se tornado mais atraente para mim. O mesmo processo vai na direção contrária, quando algo se torna menos atraente para mim”.
Novamente, a comparação entre Bitcoin e dólar nos ajuda a compreendermos esse fenômeno.
“As outras moedas contam com um grupo de usuários que todos sabem que as aceitarão”, diz Luther. “O governo, por exemplo, está disposto a aceitar dólares no pagamento de impostos e taxas. E é muito improvável que ele deixe de aceitar. Esses usuários do dólar afetam pouco a demanda pela moeda. Logo, a demanda tende a ser bastante estável”.
“O mesmo não acontece com o Bitcoin”, acrescenta o economista. “Não é ilógico pensar que a demanda possa chegar a zero. E estamos sempre atentos a essa possibilidade. Acontecimentos de menor importância levam algumas pessoas a reavaliarem suas posições. E, por causa disso, o preço do Bitcoin flutua”.
O Bitcoin será usado como moeda cotidiana?
Se o Bitcoin é só uma moda ou se ele será usado diariamente é uma questão a ser debatida. Luther diz que a moeda já pode ser usada em muitas trocas.
“Você pode comprar um sofá novo na Overstock.com”, diz. “Pode pagar usa conta da AT&T”. Me diga o que você quer e há uma boa chance de haver alguém por aí aceitando Bitcoin. Mas o fato de ele não ser mais usado, apesar de muita gente o aceitar, sugere que ele não seja adequado a muitas transações”.
“O Bitcoin é ótimo para pagamentos internacionais”, diz Luther. “É bom para pagamentos privados. Mas poucas das minhas transações mensais envolve pagamentos internacionais ou requerem mais privacidade do que a dada pelo meu banco. Por isso eu não gasto Bitcoin com frequência. Acho que as outras pessoas fazem o mesmo cálculo. Não que isso seja impeditivo para o Bitcoin. Só estou reconhecendo que ele tende a funcionar mais como moeda de nicho, o que deve se manter no futuro próximo”.
Brad Polumbo é jornalista e editor de opinião na Foundation for Economic Education.