O ministro Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania do Brasil, Silvio Almeida, cumprimenta Ed René Kivitz, pastor da Igreja Batista da Água Branca| Foto: Reprodução/Youtube
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Em meio ao fervor das discussões acerca do PL 1904, que propõe a equiparação do aborto ao homicídio a partir das 22 semanas de gestação, um discurso do ministro dos Direitos Humanos, Silvio de Almeida, no púlpito de uma igreja evangélica na capital paulista ao final do último mês de junho tomou as manchetes do país. Sua presença ali não era fortuita, mas parte de um esforço do governo Lula para se aproximar do eleitorado evangélico, entre o qual enfrenta altos índices de rejeição. Para tentar reverter o cenário, contou com o apoio do pastor Ed René Kivitz, líder da Igreja Batista da Água Branca (IBAB).

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"Quem quer que uma mulher que foi estuprada seja presa está envenenado pela ideologia do ódio", disse Sílvio Almeida durante o evento, sem mencionar a questão do aborto.

Muito mais do que o de Almeida — casado com uma evangélica, mas praticante do candomblé —, o nome de Ed René Kivitz é popular no meio protestante. Nascido em São Paulo em 14 de setembro de 1965 e neto de imigrantes da Letônia, Kivitz perdeu o pai aos dois anos e foi criado pela avó paterna, diretora de um orfanato, da Igreja presbiteriana. Aos 17 anos, ingressou no Seminário Teológico Batista do Sul do Brasil e, aos 21, tornou-se pastor. Concluiu mestrado em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo e, desde 1989, atua na IBAB, da qual é hoje o pastor titular.

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Adepto da Missão Integral, corrente protestante que se assemelha à Teologia da Libertação católica, Kivitz nunca escondeu suas preferências políticas. "Minha vida toda eu tive uma identificação com a esquerda. O campo político que eu me localizo é a esquerda, o progressismo, e isso desde os meus 17 anos", afirmou o pastor, em entrevista recente ao podcast Inteligência LTDA.

Foi desde meados de 2018, com sua oposição explícita ao então candidato Jair Bolsonaro, que Kivitz ganhou notoriedade, ainda que sem declarar voto em Fernando Haddad. “Quem me conhecia sabia em quem eu ia votar”, afirmou o pastor, alegando que nunca apoiou explicitamente o Partido dos Trabalhadores. “Eu entendo o ódio ao PT. Falei inclusive do púlpito: olha, eu sei que existe um ódio contra um partido que protagonizou o maior esquema de corrupção que a gente tem conhecimento na história do Brasil. Eu entendo, mas não precisa ir para Jair Bolsonaro".

Progressista, mas não o suficiente

Ed René afirma ter “críticas e limitações” com relação ao campo, mas raramente as explicita. A respeito da pauta LGBT, por exemplo, o teólogo insiste que sua igreja não é “inclusiva nem afirmativa” (no sentido de não abençoar e celebrar, explicitamente, uniões homossexuais) e, por isso, alega ser chamado de “homofóbico”. “Para tomar essa decisão, minha igreja precisa conversar, debater em assembleia. Quando eu abri a discussão, houve o apedrejamento contra mim, e houve uma angústia dentro da comunidade", afirmou, em entrevista. "Muitas pessoas na IBAB são homossexuais, têm relacionamentos homossexuais, frequentam a igreja e, com o tempo, elas vão decidir o que fazer com a vida delas". Kivitz também se diz a favor da descriminalização do aborto e das drogas, e da adoção de crianças por casais homossexuais.

A despeito de seu alinhamento ao progressismo, Ed René goza de algum respeito entre pastores e teólogos que não compartilham de todas as suas convicções. “Tenho a impressão de que o elemento inédito é um componente retórico de suas pregações, mas essa busca pelo ineditismo, muitas vezes, gera confusão”, avalia o teólogo Victor Fontana. Um exemplo da situação descrita é a que talvez seja a polêmica mais famosa na qual Kivitz se envolveu ao afirmar que a Bíblia deve ser atualizada, preceito que contraria a tradicional interpretação protestante da inerrância do texto sagrado (doutrina que sustenta que a Bíblia, em seus manuscritos originais, é completamente livre de erros e falhas em todas as suas afirmações).

A afirmação dizia respeito a um episódio bíblico no qual o apóstolo Paulo exorta um escravo fugido a retornar ao seu senhor, solicitando também que o patrão o receba como irmão. "Eu disse no meu sermão que aquela recomendação do apóstolo Paulo não serve até hoje. Se alguém chegasse na minha igreja com um caso como esse, eu faria uma denúncia, não mandaria o cara de volta com um bilhete meu. Foi aí que eu disse que a Bíblia precisa ser atualizada, e isso foi a minha morte”.

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Para Fontana, as “inovações” de Kivitz costumam ser bem fundamentadas e conhecidas por quem está inserido no meio acadêmico da teologia. Ainda assim, há falhas problemáticas: “O número de ocasiões em que o Ed teve que explicar o que ele quis dizer, no meu entendimento, é preocupante”.

Ademais, quando se trata do envolvimento entre política e religião, Kivitz guarda suas ambiguidades. “Eu nunca fui fazer política do púlpito da minha igreja. Nunca levei um político no púlpito da minha igreja. Acho um absurdo. A igreja é um espaço democrático, plural, eu disse do púlpito da minha igreja: vota em quem você quiser”, insiste o pastor, que parece não considerar o espaço cedido a Almeida uma exceção à regra.

“Assim como os cristãos e pastores responsáveis deste país ergueram a voz para condenar que políticos da família Bolsonaro estivessem no púlpito da Lagoinha defendendo seus ideais políticos com disfarce de aproximação cristã, nós também precisamos ser vocais para denunciar que ministros do governo Lula, durante o seu exercício, sejam convidados a falar no púlpito de igrejas”, avalia o pastor Yago Martins, da Igreja Batista Maanaim. “Ainda mais considerando que o púlpito da IBAB tenha sido ocupado por um discurso pró-aborto”.