O físico Stephen Hawking publicou artigos revolucionários sobre o cosmos até o final de sua vida.  | Foto: SC/seb/aaSHAUN CURRY

Dez dias antes de morrer, Stephen Hawking enviou mais uma visão escrita para o cosmos: um artigo, com co-autoria do físico Thomas Hertog, da Universidade Católica de Leuven, na Bélgica, abordando o problema de um multiverso.

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O artigo já havia sido publicado em uma plataforma onde cientistas compartilham rascunhos de artigos antes de serem publicados em periódicos revisados por pares. O trabalho inspirou muitos relatos entusiasmados de que o cientista teria previsto o fim do mundo e oferecido uma maneira de detectar universos alternativos. 

O estudo, publicado no Journal of High Energy Physics, não é assim tão sensacional. Trata-se de um paradoxo que o próprio físico ajudou a criar: se o Big Bang criou universos infinitos com um número inesgotável de variações sobre as leis da física, como os cientistas esperam responder a perguntas fundamentais sobre o porquê de nosso universo ser da maneira que é? 

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Hawking, que morreu em 14 de março aos 76 anos, superou uma doença neurológica devastadora para publicar insights revolucionários sobre buracos negros e outros mistérios do cosmos. 

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"É muito Stephen", disse Michael Turner, cosmólogo da Universidade de Chicago, sobre a nova pesquisa. "Até o final, ele não teve medo de enfrentar os problemas mais difíceis, e o problema que ele está enfrentando é o que me dá dor de cabeça.” 

Os cientistas acreditam que, exatamente quando o universo começou, cerca de 13,8 bilhões de anos atrás, passou por um processo chamado inflação – expansão exponencial em um período muito curto de tempo. Ao longo dessa rápida expansão, pequenas flutuações quânticas no espaço foram aumentadas para o tamanho cósmico, criando as sementes das estruturas que se tornariam galáxias e iluminariam o universo. 

Alguns dos arquitetos da teoria da inflação, incluindo o físico Andrei Linde, de Stanford, propuseram uma ideia paralela: As flutuações quânticas durante a inflação deram origem não apenas às galáxias, mas a universos inteiros. Mais estranho ainda, Linde sugere que a inflação ainda está acontecendo. Em entrevista no dia 2 de maio, ele comparou o cosmos a um bloco de queijo suíço que está sempre se expandindo. Os buracos são "universos de bolso", lugares onde a inflação parou localmente, permitindo que a matéria se condensasse e estrelas e galáxias se formassem. Pode ser que estejamos vivendo em um desses bolsos, envoltos em densos produtos lácteos, desconectados e alegremente inconscientes dos infinitos universos alternativos que existem ao nosso redor. 

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Se essa ideia te faz levantar as sobrancelhas, você não está sozinho. Alguns cosmólogos são cautelosos quanto à "inflação eterna" – e ao multiverso que pode derivar dela. Por um lado, se os vários universos de bolso forem desconectados, como iremos verificar se eles estão lá? Por outro lado, um multiverso infinito desafiaria a análise matemática, tornando difícil usar o modelo para entender como o cosmos deveria funcionar. 

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Em seu novo artigo, Hawking e Hertog "dão um corte de cabelo ao multiverso", disse Turner. Para fazer isso, eles recorrem à "teoria da não-fronteira" de Hawking – uma ideia desenvolvida na década de 1980 para explicar como o universo surgiu – e um conceito conhecido como "universo holográfico", que sugere que o universo pode ser visto como um holograma e que uma realidade tridimensional pode ser matematicamente comprimida em apenas duas dimensões para facilitar os cálculos. 

Como resultado, conseguiram trazer alguma medida de ordem ao multiverso incompreensível e disperso. Os universos de bolso neste modelo seriam menos numerosos e compartilhariam certas qualidades fundamentais, tornando-os mais fáceis de analisar. 

"Não estamos resumidos a um universo único e particular, mas nossas descobertas implicam em uma redução significativa do multiverso para uma faixa muito menor de universos possíveis", disse Hawking em entrevista à Universidade de Cambridge no outono passado. 

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O modelo proposto não está totalmente desenvolvido, disse Katie Mack, cosmóloga da North Carolina State University. "É mais como uma versão simplificada de algo apenas para ver o que acontece", dependendo de conceitos que ainda não são amplamente aceitos e ferramentas matemáticas que ainda são novas. 

Ela também destacou que Hawking e Hertog não oferecem previsões quantificáveis em seu trabalho, o que dificulta o teste da ideia. 

"Não é 42", concordou Turner - referindo-se a uma piada do livro "O Guia do Mochileiro das Galáxias", em que o número é "a resposta definitiva à questão da vida, do universo e de tudo mais". 

Mas, para os cientistas, é algo igualmente bom: não uma solução para todos os problemas do universo, mas uma ideia intrigante – embora um tanto maluca. Um caminho potencial a seguir, embora eles não saibam para onde isso pode levar. 

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Nesse aspecto, é um legado apropriado para o falecido físico. 

"Stephen Hawking era um ser humano", disse Linde. "Ele não era um gênio que dizia apenas coisas corretas todos os dias da semana. Ele estava lutando com os mesmos problemas científicos com os quais todos nós estamos lutando" – embora em meio a maiores adversidades e com uma visão mais aguçada do que a maioria das pessoas pode esperar. 

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Com este artigo, que a Universidade de Cambridge diz ser sua "teoria final sobre a origem do universo", Hawking deu a seus colegas mais uma coisa para pensar enquanto lidam com os problemas da "vida, do universo e tudo mais". 

"Mas é muito triste que Stephen não esteja aqui para falar sobre isso conosco", disse Linde.

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