Os manifestantes que vão participar do protesto “Unite the Right” (Unir a Direita) em Washington, neste domingo (12), vão ter dificuldades para encontrar lugares para dormir, comer e se locomover. A plataforma de hospedagem Airbnb alertou que pode cancelar as reservas e remover as contas dos participantes da marcha, se eles estiverem em desacordo com as políticas do site. Vários restaurantes da capital dos Estados Unidos também vão impedir a entrada dos manifestantes. Além disso, os motoristas do Uber poderão recusar os passageiros que estiverem na manifestação.
A marcha Unite the Right será realizada no aniversário de um ano do confronto entre manifestantes a favor da supremacia branca e antirracistas na pequena cidade americana de Charlottesville. O dia 12 de agosto de 2017, um sábado, foi um dia caótico e violento. Centenas de nacionalistas e supremacistas brancos, neonazistas e membros da Ku Klux Klan fizeram uma manifestação e entraram em confronto com manifestantes contrários. Uma pessoa acabou morta e 19 feridas.
Donos de restaurantes de Washington relataram ao site de notícias The Washingtonian que as decisões de barrar os manifestantes ou de fechar as portas no final de semana foram motivadas pela preocupação com a segurança dos funcionários. Os restaurantes que abrirem vão dar aos funcionários a opção de tirar o dia de folga ou de receber um reembolso para usar transporte alternativo, caso queiram evitar o transporte público.
O Uber afirmou ao site The Washingtonian que se um motorista considerar que as ações de um passageiro sejam discriminatórias – por ideologia, símbolos e comentários associados com supremacia racial ou neonazismo – ele tem o direito de encerrar a corrida. O passageiro pode também ser banido da plataforma. O Uber acrescentou que investiga todos os casos, e que essa é uma política implementada pela empresa diariamente, e não apenas em eventos de tensão elevada.
Essa não é a primeira vez que o Airbnb isola pessoas que apoiam a marcha da alt-right. A companhia já havia cancelado reservas e contas de usuários antes da marcha Unite the Right original, no ano passado em Charlottesville, segundo a rede de notícias ABC News.
Guerras de informação
Outro caso recente deu lenha para o debate sobre os limites de ação das empresas privadas. Na semana passada, o site Infowars, que é dirigido pelo polêmico apresentador americano Alex Jones, foi banido ou teve conteúdo retirado da maioria das plataformas de redes sociais, simultaneamente.
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YouTube, Apple, Facebook e Spotify citaram “discurso de ódio” como causa da remoção de conteúdo. A exclusão simultânea levantou suspeitas sobre a decisão e a motivação de cada plataforma. Comentaristas, especialmente os mais alinhados à direita e conservadores, afirmam que esse e outros casos revelam o viés ideológico das empresas do Vale do Silício.
Discussão semelhante aconteceu no Brasil após a remoção de páginas e contas pessoais do Facebook, algumas ligadas ao Movimento Brasil Livre.
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Como as políticas dessas empresas muitas vezes não são claras aos usuários, muitas dúvidas e teorias acabam surgindo. Os banimentos acontecem por desrespeito às regras da comunidade, ou existe um movimento de perseguição ideológica? As empresas, que são privadas, mas que no caso das redes sociais assumem o papel de praça para o diálogo público, podem censurar quem elas quiserem? Há limites para isso, e quem os estabelece?
Richard Moon, professor de Direito na University of Windsor (Canadá) e especialista em Liberdade de Expressão, disse à Gazeta do Povo que o discurso tem o potencial de causar dano, e por isso é passível de ser restringido. “A verdadeira questão é sobre o que consideramos como ‘dano’, e como medimos isso. Esse é o maior desafio. Para algumas pessoas, ‘causar dano’ significa que elas se sentem ofendidas por um discurso. E se elas estão falando sobre a experiência subjetiva de simplesmente estarem abaladas ou em desacordo com algo que é dito, eu não acho que isso posa ser considerado como ‘causar dano’”, afirmou.
Moon lembra que nós aceitamos as restrições a anúncios enganosos, discurso que difama alguém ou que viola certos direitos, e discurso de ódio, na maioria dos países.
O professor acredita que é papel do governo garantir que haja acesso livre e justo às plataformas das redes sociais. “Provedores de serviços privados não podem unilateralmente decidir o que é discurso aceitável e não aceitável. A maneira como organizar isso é um desafio, mas acho que é preciso alguma regulação do governo para proteger a liberdade de discurso”.
“Essas redes privadas carregam certas responsabilidades, e uma delas é não restringir arbitrariamente o discurso dos usuários”, ressaltou Moon, acrescentando que esse é um modelo muito diferente do que temos hoje, em que as companhias podem decidir o que quiserem sobre os usuários.
Amanda Lotz, professora de Comunicação da University of Michigan (Estados Unidos), disse neste artigo para o The Conversation que as companhias de comunicação americanas são guiadas mais pelo lucro do que pela liberdade de expressão quando decidem sobre conteúdo controverso, e que a regulamentação do governo não muda muita coisa.
“A minha pesquisa sobre indústrias da comunicação torna claro que as regras do governo e as regulamentações fazem pouco para limitar que programas de televisão, álbuns de música, vídeo games e conteúdo de redes sociais estejam disponíveis para o público. Preocupações dos negócios sobre lucratividade são restrições muito mais fortes”, relatou.
Lotz afirma que as empresas de comunicação, tanto estúdios de cinema e canais de televisão quanto o YouTube e Facebook, fazem um autopoliciamento e sabem: distribuir conteúdo extremamente controverso é ruim para o negócio.
Conteúdo extremamente controverso é o caso do produzido por Alex Jones, conhecido por espalhar teorias conspiratórias como a que diz que o massacre de Sandy Hook teria sido uma encenação. Mas mesmo algumas pessoas que não aprovam esse tipo de conteúdo têm apontado o terreno escorregadio que são as ações de censura das redes sociais, e se mostrado preocupadas sobre quem será o próximo alvo.
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