Antes de eu começar a pesquisar sobre mortes por armas de fogo, as políticas de desarmamento me frustravam. Eu desejava que a NRA (National Rifle Association -Associação Nacional de Rifles) parasse de barrar reformas de desarmamento que seriam senso comum, como a proibição de fuzis de assalto, restrição a silenciadores, diminuição do tamanho de carregadores e outras medidas que poderiam tornar as armas de fogo menos mortais.
Então, eu e meus colegas da FiveThirtyEight passamos três meses analisando todas as 33 mil vidas que são tiradas por armas de fogo todos os anos nos Estados Unidos, e eu acabei frustrada de um jeito totalmente diferente. Nós analisamos quais intervenções poderiam ter salvo aquelas pessoas e a defesa das políticas que eu apoiava caiu quando analisei as evidências. As melhores ideias que se sustentaram foram intervenções específicas para proteger subgrupos de vítimas em potencial, não tentativas gerais de limitar a letalidade das armas.
Eu pesquisei as leis rígidas de desarmamento do Reino Unido e da Austrália e concluí que elas não indicavam muito como poderiam ser as políticas na América. Nenhum dos países apresentou diminuição de tiroteios ou outros crimes relacionados a armas de fogo que poderiam ser atribuídos às suas proibições ou recolhimentos de armas. Tiroteios eram muito raros na Austrália para ter evidências de que a sua falta pudesse ser atribuída ao programa de recolhimento de armas. E tanto na Austrália quanto no Reino Unido as restrições tiveram efeitos ambíguos em outros crimes e mortes por armas de fogo.
Quando eu olho para outras políticas muito elogiadas, percebo que nenhum portador de arma entra em uma loja para comprar uma “arma de assalto”. Essa é uma classificação inventada que inclui qualquer arma semiautomática que tem dois ou mais componentes, como uma baioneta, um lançador de granada por foguete, um estoque dobrável ou uma empunhadura de pistola. Mas armas são modulares, e qualquer entusiasta pode adicionar facilmente esses componentes em casa, como se estivesse montando peças de Lego.
Quanto aos silenciadores, eles merecem esse nome apenas em filmes, onde reduzem o tiro a um ruído suave. Na vida real, os silenciadores limitam os danos à audição dos atiradores, mas não tornam os tiros perigosamente silenciosos. Uma AR-15 com um silenciador é tão ruidosa quanto um martelo. A limitação do tamanho de carregadores parecia um pouco mais promissora, mas um atirador experiente ainda poderia trocar os carregadores com tanta frequência que tornaria o limite de tamanho insignificante.
Conforme os meus colegas e eu continuamos a analisar os dados, parecia cada vez menos claro que uma restrição ampla a armas de fogo pudesse fazer uma grande diferença. Dois terços das mortes por armas de fogo nos Estados Unidos por ano eram suicídios. Quase nenhuma das restrições propostas poderia tornar consideravelmente mais difícil para as pessoas com acesso a armas as utilizarem. Eu não conseguia responder nem a minha dúvida mais desesperadora: Se eu tivesse um amigo que tivesse armas na sua casa e um histórico de tentativas de suicídio, haveria algo que eu pudesse fazer para ajudá-lo?
No entanto, o segundo maior número de mortes por armas de fogo – 1 a cada 5 – eram homens jovens de 15 a 34 anos mortos em homicídios. Esses homens tinham maior probabilidade de morrer pelas mãos de outros homens jovens, geralmente em conflitos entre gangues ou outra violência urbana. E o último grupo notável de mortes similares foram as 1,7 mil mulheres assassinadas todo ano, geralmente como consequência de violência doméstica. Muito mais pessoas foram mortas desses modos do que em incidentes de tiroteios, mas poucas das políticas mais populares se voltavam para esses casos.
Quando publicamos o nosso projeto, eu não acreditava na quantidade de intervenções que escutei políticos empurrarem. Eu ainda era contra armas, pelo menos do ponto de vista da maioria dos portadores de armas, e eu não quero armas na minha casa, pois acredito que os riscos superam os benefícios. Mas eu não posso apoiar políticas cujo único ponto de destaque é que portadores de armas as odeiam. Políticas que geralmente parecem ter sido escritas por pessoas que só viram armas em figuras em relatórios ou em imagens nos jornais.
Em vez disso, eu encontrei mais esperança em intervenções mais específicas. Potenciais vítimas de suicídio, mulheres ameaçadas por seus parceiros abusivos e jovens envolvidos em vinganças nas ruas estão todos em perigo com armas, mas cada um exige proteções diferentes.
Homens mais velhos, que compõem a maior parcela de suicídios por armas de fogo, precisam de melhor acesso a pessoas que possam ajudá-los e oferecer cuidados. Mulheres em risco por causa de homens específicos precisam ser priorizadas pela polícia, que pode emitir ordens de restrição proibindo que esses homens comprem e portem armas de fogo. Homens jovens em risco de violência precisam ser identificados antes que eles tirem outras vidas ou percam as suas vidas e serem colocados em contato com mentores que possam ajudá-los a diminuir os seus conflitos.
Até mesmo as práticas mais apoiadas em dados, como o plano de Nova Orleans de identificar membros de gangues para intervenções baseadas em prisões anteriores e ferimentos por armas, acabam sendo mais pessoais do que a maioria das políticas que circulam. Os jovens em risco podem ser identificados por um algoritmo, mas eles têm que ser desarmados um por um, pessoalmente – não em massa, como se eles fossem todos iguais.
Uma redução das mortes por armas de fogo é mais provável de acontecer ao achar possibilidades de vitórias menores e expandir essas soluções ao máximo possível. Nós salvamos vidas ao focar em uma série de táticas para proteger os diferentes tipos de vítimas em potencial e reformar potenciais assassinos, e não estendendo proibições focadas apenas nas próprias armas.
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*Libresco é estatística e ex-jornalista do FiveThirtyEight, site de jornalismo de dados. É autora do livro “Arriving at Amen”
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