O ditador cubano Fidel Castro profere discurso de abertura da cerimônia de formatura do primeiro curso para instrutores de arte, em 20 de outubro de 2004, na praça Che Guevara, na cidade de Santa Clara, 300 quilômetros a leste de Havana.| Foto: EFE/Alejandro Ernesto
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A Cuba pré-Fidel Castro não era um país livre de problemas, mas tinha uma economia vibrante, graças ao turismo e aos preços internacionais da cana-de-açúcar (principal produto de exportação da ilha). Também possuía uma classe média com um bom padrão de vida, e uma vida cultural intensa, a ponto de grandes nomes da música americana, como Frank Sinatra, se apresentarem nas casas de espetáculos da capital Havana. Em vez de cubanos fugindo desesperados do país, como acontece hoje, Cuba era ponto de chegada de imigrantes do mundo inteiro, que buscavam o “padrão de vida elevado” local, como chegou a admitir o próprio Che Guevara.

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Mesmo assim, não dá para esquecer que o país vivia sob uma ditadura violenta, comandada por Fulgêncio Batista, e que era comum a perseguição aos opositores e críticos do regime, que sofriam com prisões arbitrárias e até mesmo assassinatos. A censura era comum, e jornais eram tirados de circulação conforme as vontades do ditador. E os perseguidos não se limitavam à classe intelectual e artística: padres, pastores e trabalhadores comuns também estavam na mira de Batista. Empresários que não apoiavam o ditador sofriam retaliações.

Foi nesse ambiente de insatisfação com o crescente endurecimento do regime que alguns empresários viram em Fidel Castro, inimigo de Batista, a figura ideal para pôr fim a esta situação. É bom lembrar que Castro, até então, não demonstrava qualquer simpatia com o comunismo, e dava declarações indicando que faria eleições livres após derrubar a ditadura. Como depois os cubanos acabariam sabendo da pior forma possível, nada disso era verdade, mas na época Fidel representava a esperança de um futuro mais livre.

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Por isso, empresários contribuíram com a causa revolucionária. Pepín Bosch, executivo-chefe da destilaria Bacardi, deu US$ 38 mil para os guerrilheiros liderados por Fidel, uma quantia fabulosa que valia ainda mais na época (em valores atualizados, algo em torno de US$ 300 mil, ou R$ 1,5 milhão). Em 1957, Daniel Bacardi, dono da destilaria, chegou a organizar uma greve de empresários, na cidade de Santiago, contra Fulgêncio Batista. No mesmo ano, o maior produtor de cana-de-açúcar do país, Julio Lobo, dono de uma fortuna estimada em US$ 4 bilhões (R$ 20 bilhões, na cotação atual), doou US$ 50 mil para os revolucionários.

Conforme contam Leandro Narloch e Duda Teixeira no livro 'Guia Politicamente Incorreto da América Latina', o jornalista americano Jules Debois ficou surpreso com o apoio dos endinheirados a Fidel Castro. “Os homens mais ricos e proeminentes de Santiago, dos quais a maioria nunca se envolveu com política, estão apoiando o rebelde Fidel Castro como um símbolo de resistência a Batista”, escreveu o jornalista.

Quando os revolucionários finalmente tomaram o poder, no começo de 1959, a Bacardi chegou a publicar um agradecimento público aos rebeldes comandados por Fidel Castro e Che Guevara. “Obrigado ao povo de Cuba e à Revolução Cubana. Por causa de seus esforços e de seu sacrifício, podemos dizer uma vez mais ‘Que sorte tem o cubano!’.”

A sorte não duraria muito tempo. Em outubro de 1960, Julio Lobo foi chamado para uma conversa pessoal com Che Guevara, então ministro da economia de Cuba. Guevara o informou que não havia mais espaço para o capitalismo no país, e que todos os bens de Lobo seriam estatizados. Se Lobo, porém, concordasse em fazer parte do governo, poderia manter sua mansão e uma de suas 14 usinas. Lobo não concordou e dois dias depois partiu para os Estados Unidos, onde novamente fez fortuna. Nas mãos do governo comunista, a produção de cana-de-açúcar em Cuba se tornou ineficiente a ponto de o país, que foi o maior o produtor mundial, ter que importar toneladas nos anos seguintes.

No mesmo mês, o governo cubano confiscou as propriedades e as contas bancárias da destilaria Bacardi, sem nenhum tipo de compensação. Fundada em 1862, em 1965 a destilaria se estabeleceu na cidade de Hamilton, capital das Bermudas. Enquanto a economia de Cuba segue claudicante desde o fim da União Soviética, a Bacardi é uma das maiores empresas em seu setor, tendo faturado US$ 4,6 bilhões (R$ 23 bilhões) em 2021.

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Edifício Bacardí, em Havana (Cuba), foi sede da empresa até a revolução cubana. Foto: EFE/Alejandro Ernesto