Encerramento da cerimônia de premiação do Jabuti Acadêmico: lista de finalistas reflete o predomínio da ideologia de esquerda no ambiente universitário.| Foto: Divulgação/Câmara Brasileira do Livro/Maria Comuniqueira
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Mais de 30 pesquisadores e cientistas brasileiros estarão em um estande exclusivo na Bienal Internacional do Livro de São Paulo, que começa na sexta-feira (6). 

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Eles estão entre os autores finalistas e vencedores da primeira edição do Prêmio Jabuti Acadêmico, e participarão de sessões de autógrafos até o final do evento, no dia 15. 

Braço técnico do tradicional certame literário brasileiro, realizado desde 1959, o novo concurso contou com 2 mil títulos inscritos – todos publicados em 2023. Uma prova de que a produção de conhecimento vem crescendo no Brasil, bem como o mercado editorial voltado para esse tipo de trabalho. 

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Mas a relação dos premiados também confirma um fato que não choca mais ninguém: o predomínio da ideologia de esquerda no ambiente universitário. 

Quase metade dos livros trata de pautas identitárias, defende o ativismo ambiental ou tem como base pensadores com viés marxista. E essa porcentagem aumenta se o recorte englobar todos os finalistas (cinco em cada uma das 29 categorias). 

Mesmo uma obra como ‘Atenção Primária à Saúde em Municípios Rurais Remotos no Brasil’ (vencedora no segmento Enfermagem, Farmácia, Saúde Coletiva e Serviço Social) traz influências progressistas – sua principal referência é o pensamento socialista do geógrafo Milton Santos, um dos intelectuais mais citados pela ala woke da academia. 

Há exceções que confirmam a regra, como os premiados das ciências exatas. Ou a estatueta concedida ao pesquisador Sérgio Lazzarini por ‘A Privatização Certa: Por que as Empresas Privadas em Iniciativas Públicas Precisam de Governos Capazes’ (categoria Administração Pública e de Empresas, Ciências Contábeis e Turismo). 

Professor do Insper, em São Paulo, ele é um crítico das intervenções políticas do Executivo em empresas estatais (com e sem capital aberto). E, em entrevistas recentes, alerta que o PT está repetindo erros de seus governos anteriores nesse sentido. 

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Porém, de forma geral, o Jabuti Acadêmico teve fortes cores politicamente corretas. Vide sua primeira grande homenageada, a advogada e docente Silvia Pimentel – uma ativista pioneira do feminismo no Brasil.

Em um depoimento exibido em vídeo durante a cerimônia de premiação (ocorrida na capital paulista, no dia 6 de agosto), Silvia explica que se tornou feminista por causa "de um casamento machista e da repressão patriarcal, que me trouxe grandes sofrimentos". 

E o que dizer do protagonismo da filósofa Marilena Chauí? Ícone do esquerdismo acadêmico (e conhecida por seu preconceito antirreligioso), ela foi a única vencedora de duas estatuetas. 

Seu livro ‘Introdução à História da Filosofia: Volume 3: a Patrística – Introdução ao Nascimento da Filosofia Cristã’ ficou em primeiro lugar nos segmentos de Filosofia e Divulgação Científica (cada obra premiada recebeu R$ 5 mil). 

Para curador, hegemonia da esquerda nas universidades é um “falso mito”

Organizadora do Jabuti, a Câmara Brasileira do Livro convidou o professor Marcelo Knobel para assumir, ainda em 2023, a curadoria de sua versão exclusivamente voltada para obras acadêmicas. 

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Dono de uma premiada trajetória como físico experimental, Knobel desenvolve projetos na área da divulgação científica e tem no currículo experiências como gestor em importantes instituições de ensino superior (foi reitor da Unicamp e presidente do Insper). 

Questionado pela reportagem da Gazeta do Povo acerca da percepção pública da ciência no Brasil, ele cita um dado preocupante para o setor: “Uma pesquisa recente mostrou que menos de 20% da população sabe que se produz ciência no país. E uma quantidade ainda menor de pessoas soube citar o nome de um cientista brasileiro”.

Mas de quem é a “culpa” por esse desconhecimento? “É uma questão multifatorial, que envolve a qualidade do ensino de ciência, a grande parcela de pessoas que não frequenta a universidade e a postura dos próprios cientistas, que muitas vezes ficam fechados no seu mundo”, afirma o professor de 56 anos. 

Ainda assim, ele acredita que o aquecimento do mercado editorial e o surgimento de canais do YouTube e podcasts sobre temas científicos indicam uma evolução nesse cenário. Com um porém: a “desordem da informação”, como ele define “o excesso de fontes, muitas delas não muito bem estabelecidas”. 

Knobel também lamenta a disseminação de conceitos como terraplanismo, antivacinismo e negacionismo climático. “Estou em Campinas agora e sinto uma grande dificuldade para respirar. É inegável que existe uma emergência climática”, afirma, referindo-se ao efeito das queimadas no interior de São Paulo. 

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Sobre a predominância de temas woke entre os premiados no Jabuti e a hegemonia da esquerda no ensino superior público, ele é enfático: “Isso é um falso mito. A universidade reflete a diversidade da sociedade, inclusive sua polarização. Existe de tudo na academia”. 

O professor ainda comentou o sistema de cotas étnico-raciais e o vestibular indígena da Unicamp, implantados durante seu período como reitor da instituição. 

“Sempre fui guiado pela prática do diálogo. Saber ouvir argumentos bem embasados, principalmente de quem não concorda com você, é algo que deve ser valorizado na universidade”, afirma o físico, que nasceu na Argentina e chegou ainda criança ao Brasil, trazido pelos pais que fugiam da ditadura no país vizinho. 

Alarmismo climático, anticapitalismo e Paulo freire também são temas dos livros finalistas

Oitenta e sete jurados (três por categoria) avaliaram os 1.953 livros inscritos no primeiro Jabuti Acadêmico. Veja a seguir alguns dos trabalhos woke que ficaram entre os finalistas, acompanhados de trechos de suas sinopses. 

‘Exu-Mulher o Matriarcado Nagô: Sobre Masculinização, Demonização e Tensões de Gênero na Formação dos Candomblés’, de Claudia Alexandre (vencedor – Ciências da Religião e Teologia)

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“A masculinização e a demonização foram as principais transformações de Exu na travessia atlântica. Mesmo nos terreiros fundantes, que ainda são matriarcais, tensões demonstram como as religiões de matrizes africanas estão submetidas ao patriarcado. A figura feminina de Exu, além de não introduzida no Brasil, é desconhecida em algumas casas e silenciada nas mais tradicionais.” 

‘Do futebol moderno aos futebóis transmodernos: a utopia da diversidade revolucionária’, de Denis Prado, Osmar Moreira de Souza Júnior e Ricardo Souza de Carvalho (vencedor – Educação Física, Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional) 

“Um itinerário narrativo errante, mas em alguma medida articulado a uma ideia prévia dos organizadores, que consistiu em partir do futebol moderno e percorrer as periferias deste futebol moderno afirmando sua exterioridade a partir dos futebóis da cultura popular que se nutrem desta matriz hegemônica e a superam, anunciando a emergência dos futebóis transmodernos.” 

‘Incerteza, um Ensaio: Como Pensamos A Ideia Que Nos Desorienta’ (e Orienta o Mundo Digital), de Eugênio Bucci (vencedor – Comunicação e Informação) 

“O capitalista decifra as dissimulações do mercado traiçoeiro e fica mais rico. No século XXI, então, o negócio da incerteza orienta os destinos do mundo digital. As máquinas participam da gestão do dinheiro e das coisas públicas. Os algoritmos mapeiam intimidades e decifram o circuito secreto do desejo de cada indivíduo.” 

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‘Elza Freire e Paulo Freire: Noites de Exílio, Dias de Utopia’, de Nima Spigolon (vencedor – Educação e Ensino) 

“O livro pesquisa as inserções do casal de camaradas Elza e Paulo na África. Descreve, analisa, interpreta e mapeia os percursos de Elza, de Paulo e dos cinco filhos na diáspora freireana. Entremeia processos políticopedagógicos, históricos e biográficos de 1964 a 1979. Os cenários vão do nacional ao internacional, dos manuscritos de Elza à elaboração da ‘Pedagogia do Oprimido’, do ‘Educação como Prática da Liberdade” ao texto ‘Setembro de 1977’.” 

‘Arriar o Butô em 7 Encruzilhadas: Micropolíticas do Corpo’, de Thiago Abel (finalista – Artes) 

“O que acontece quando macumbeiros resolvem gerar uma experiência de dança a partir das inquietações do Ankoku Butô? A partir de uma interlocução entre os saberes e fazeres de Tatsumi Hijikata e as ciências encantadas das macumbas, a obra apresenta pistas de como os pensamentos e criações deste artista japonês oferecem estratégias para a desestabilização dos sistemas de controle, dominação e extermínio; como também de conscientização e libertação dos corpos e dos desejos por meio da dança, criando estratégias para uma vida menos cafetinada pelo neoliberalismo e menos ceifada pelo colonialismo.”

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]
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