De tempos em tempos (geralmente, depois de perder uma eleição presidencial), a esquerda brasileira resolve fazer uma autocrítica para tentar descobrir por que tem dificuldade de conquistar a lealdade dos brasileiros. A reação de algumas figuras públicas à morte de Silvio Santos mostra que parte da esquerda ainda não entendeu o problema.
O dono do SBT será lembrado muito mais pelas virtudes do que pelos defeitos. Ele era visto por milhões de brasileiros como um membro da família — carismático, alegre e generoso.
Para boa parte da esquerda, entretanto, Silvio Santos era o oposto: um homem responsável por alienar a população brasileira enquanto oprimia todo tipo de minorias. O fato de ele ser judeu neste momento em que a esquerda se alinhou com o grupo terrorista Hamas não ajudou muito.
Silvio Santos associado ao nazismo
Foram necessárias poucas horas para que a morte de Silvio Santos fosse usada como plataforma política por parte da esquerda brasileira.
O cartunista Renato Aroeira, que trabalha no site esquerdista Brasil 247 e já teve espaço no jornal O Globo, fez uma charge tão artisticamente pobre quanto moralmente condenável. O desenho mostra Silvio Santos prestes a descer uma escada que leva a um local em chamas embaixo da terra. Não há piada ou sentido oculto na charge: Aroeira achou que seria de bom tom mostrar o apresentador do SBT rumo ao inferno.
O Brasil 247 apagou a charge, mas Aroeira manteve a publicação em seu perfil no Instagram. A julgar pelos comentários, nem mesmo os seguidores do cartunista aprovaram a imagem de mau gosto.
Outro cartunista de esquerda, Allan Sieber, associou Silvio Santos ao nazismo em uma charge feita em 2019 e republicada por ele após a morte do dono do SBT. No desenho, ele grafou iniciais do apresentador com a mesma estética da SS (Schutzstaffel), o braço paramilitar do Partido Nazista. Sieber, que já teve suas tiras publicadas pela Folha de S. Paulo e hoje é colaborador da Piauí, desejou que Silvio "não descanse em paz". Para o cartunista, o apresentador era "um milionário que se divertia humilhando pobres em rede nacional" por décadas".
Parte das críticas da esquerda a Silvio Santos parece estar ligada à visão socialista de que a cultura tem de promover a causa revolucionária, e não entreter ("alienar") os trabalhadores.
“Morreu? Antes ele do que eu”, filosofou a jornalista Cynara Menezes, que se identifica como socialista. Ela listou os motivos para festejar a morte de Silvio Santos: “Racista, homofóbico, machista, classista. Cruel”.
O também jornalista Fernando de Barros e Silva, um dos principais nomes da revista Piauí, é outro que fez fez questão de anunciar que não gosta de Silvio Santos. "Essa mistificação sentimental da figura de SS faz parte das atrocidades adocicadas que nos definem. Não consigo embarcar nisso, não", escreveu.
A Revista Jacobina, uma das vozes da esquerda radical no Brasil, usou os adjetivos “oligarca bilionário da mídia, latifundiário e banqueiro” para comentar a morte do apresentador. Aparentemente, a publicação também encontrou uma ligação entre a carreira de Silvio Santos e a “raiz do bolsonarismo”.
Outro cartunista de esquerda, Carlos Latuff desenhou um militar idoso batendo continência para a lápide de Silvio Santos. "Vai fazer falta", diz o militar, que tem "Ditadura de 1964" escrito nas costas.
O comentário pouco cristão de Leonardo Boff
O teólogo Leonardo Boff tampouco encontrou algo positivo a falar de Silvio Santos.
Depois da morte ao apresentador, ele foi à rede social X afirmar que o apresentador "não ajudou a educar seus seguidores". Boff escreveu: “O lema era o dinheiro. Quem quer dinheiro? E tirava do bolso e jogava para o público. Havia pouco conteúdo de cidadania,de elogio ao trabalho e de colaboração para realizar a justiça social”.
A uma seguidora que o criticou, Boff deu uma resposta pouco cristã. “Escrevi mais de cem livros traduzidos em quase todas as línguas modernas e até no coreano, croata e indiano. Sempre na perspectiva social, coisa que faltava em Sílvio Santos”.
Youtuber popular entre a esquerda radical, Jones Manoel fez um vídeo descrevendo a carreira de Silvio Santos com termos marxistas: “Sempre teve boas relações, aproveitou essas boas relações para ascender à condição de burguês fazendo favores ao regime político de momento", ele descreveu, entre outros ataques ao apresentador.
Os esquerdistas que lamentaram a morte
Nem todas as figuras públicas de esquerda menosprezaram o legado de Silvio Santos.
O presidente Lula publicou um comunicado lamentando a morte do apresentador e exaltando o "a maior personalidade da história da televisão brasileira" e "um dos grandes comunicadores do país."
"Com seu talento e carisma lançou e deu apoio a muitos talentos da televisão, do humor e do jornalismo. Era uma das pessoas mais conhecidas e queridas do nosso país", diz a mensagem do presidente.
O deputado estadual e ex-senador Eduardo Suplicy (PT-SP) foi respeitoso. “Silvio Santos foi um dos maiores comunicadores da nossa TV e um grande empreendedor, que iniciou a vida como vendedor ambulante, construiu O SBT e encantou milhões de fãs por muitas décadas”, ele escreveu. O petista lembrou também que o apresentador contribuiu com causas sociais por meio do Teleton, uma campanha anual de arrecadação de recursos para entidades beneficentes.
O psolista Guilherme Boulos, que disputa a prefeitura de São Paulo, publicou uma mensagem elogiosa, mas curta: “Minha solidariedade aos familiares e amigos de Silvio Santos, grande comunicador brasileiro.
Silvio Santos morreu no sábado (17), aos 93 anos. O corpo do apresentador foi enterrado no dia seguinte, no Cemitério Israelita do Butantan, em São Paulo.
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