Philip Goff: ateu que agora se diz cristão| Foto: Nino Kadić/CEU
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Britânico, filósofo, professor universitário e com óculos arredondados de intelectual: Philip Goff provavelmente faz parte do grupo demográfico com maior percentual de ateus no mundo.

E ele de fato foi um descrente por quase três décadas, desde que se recusou a ser confirmado na Igreja Católica no começo da adolescência. Autor de quatro livros (um deles, "O Erro de Galileu - Bases para uma Nova Ciência da Consciência" — foi traduzido para o português), Goff não acreditava haver evidências suficientes para a existência de Deus. Mas ele acaba de anunciar publicamente que mudou de lado: Goff agora é um cristão que frequente a Igreja Anglicana e ora diariamente.

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Ele falou sua conversão em uma entrevista a Cameron Bertuzzi, do canal Capturing Christianity. “Eu nunca pensei que iria me tornar um cristão”, confessou o ex-ateu, que descreveu sua jornada como o resultado de sua maturidade intelectual.

“Depois de muito tempo lendo, e de muitas conversas com diferentes tipos de pensadores cristãos, eu descobri uma forma de Cristianismo que faz sentido para mim do ponto de vista intelectual e que também ressoa profundamente", disse o filósofo, que é um dos autores mais influentes no campo da Filosofia da Mente e tem quase 2.500 citações acadêmicas segundo a plataforma Google Scholars.

A teologia defendida por ele tem diferenças importantes com o que ensinam as correntes mais ortodoxas do Cristianismo. Ainda assim, a conversão de Goff é uma guinada e tanto.

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Como um filósofo ateu se converte ao Cristianismo

A mudança começou há seis anos, quando Goff foi convidado pela Universidade de Durham, onde leciona, para ensinar a disciplina Filosofia da Religião. Como preparação para o curso, ele passou a analisar com mais atenção os argumentos a favor da existência de Deus. O filósofo ficou surpreso com a solidez da posição teísta.

"Eu me peguei pensando que, na verdade, esses argumentos são bastante convincentes”, explicou Goff ao anunciar sua conversão.

Dois argumentos em especial o convenceram a mudar de postura. O primeiro foi o ajuste fino do universo — a teoria de que Deus é a melhor explicação para uma infinidade de constantes físicas que permitem a existência da vida. "Esta é uma descoberta recente, das últimas décadas: muitos dos números na física são incrivelmente improváveis e na medida exata para permitir a vida", disse Goff.

O segundo argumento que o impulsionou a abandonar a descrença foi a explicação teísta para a existência de seres conscientes. Embora acredite na teoria da evolução, Goff afirma que o processo evolutivo por si só não tem boas explicações porque as pessoas têm consciência. Se a adaptação para a sobrevivência é o único critério que importa, por que existem seres capazes de escrever tratados de filosofia?

"A evolução deseja criaturas que se comportem de tal forma que sobrevivam bem. Por isso, é difícil entender por que a seleção natural teria a motivação de nos dar consciência, de nos dar uma experiência interna do mundo. Por que não apenas mecanismos muito complexos que sobrevivem bem, como máquinas de sobrevivência?", indagou o ex-ateu.

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Cristianismo não-ortodoxo

O Cristianismo de recém-convertido Philip Goff não é convencional, e certamente seria classificado como herético por muitos fiéis.

Por exemplo: ele acredita que a melhor forma de explicar a existência do mal é aceitar que Deus não é onipotente. Na visão do filósofo recém-convertido, a quantidade de sofrimento no mundo talvez seja o fruto de certas limitações na natureza divina. "Se Deus não é todo-poderoso, talvez Ele não tivesse muita escolha. Talvez a única maneira pela qual Deus poderia criar vida inteligente fosse criando um universo com características físicas que eventualmente evoluíssem para a vida inteligente", especulou.

Goff também acredita que, ao morrer na cruz, Jesus não estava pagando pelos pegados dos homens (uma teoria conhecida como "substituição penal" no meio teológico), mas religando a humanidade a Deus.

"O homem e Deus não se encaixam bem. Então, qual é a solução? A solução é Deus se tornar um pouco mais como nós, assumir uma natureza física, entrar em nossa forma de existência. A ideia é que isso fecha a lacuna entre Deus e a criação, permitindo que Deus e o universo entrem em um estado de unidade profunda, como a videira e seus ramos", afirmou ele, ao apresentar sua teoria.

Tanto em um tema quanto em outro, Goff se alinha com linhas teológicas mais liberais.

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Goff, entretanto, não tem dúvidas de que Jesus Cristo existiu em forma humana e foi crucificado. “Existe algo único sobre Jesus. Em algum sentido, ele era Deus encarnado”, afirmou.

Ele também explicou o sentido das suas orações diárias. "O que eu tento fazer quando oro todo dia é orientar a mi mesmo de forma que o meu compromisso fundamental é com o propósito de Deus", descreveu.

Os benefícios sociais da conversão

No caso de Philip Goff, embora a via intelectual o tenha levado à fé, outros dois aspectos da religião o atraíram: a satisfação espiritual e a participação em uma comunidade.

Ele afirma que sua conversão o tornou menos ambicioso e mais realizado. "Ainda há coisas que realmente quero fazer, porque acredito que são boas. Quero convencer o mundo de certas coisas. Mas há menos necessidade disso para a minha própria felicidade, e acho que estou conseguindo viver mais no momento presente e aproveitar minha família e amigos", disse ele.

Segundo Goff, trocar o ateísmo pela religião cristã não apenas fez sentido do ponto de vista intelectual, mas também o tornou uma pessoa mais satisfeita com a vida: "Essa concepção do Cristianismo ressoa comigo — a ideia de que Deus quer estar intimamente envolvido conosco. Eu realmente sinto isso em um nível espiritual e em minha comunidade na igreja. Acredito que estou mais feliz."

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Outras conversões famosas

A conversão de Philip Goff do ateísmo ao Cristianismo pode chamar atenção por acontecer em uma era na qual a direção inversa parece ser mais comum.

Mas histórias como a dele estão longe de ser inéditas. E, por alguma razão, um número desproporcional delas vêm do Reino Unido.

Um dos ex-ateus mais influentes do século 20 foi o também britânico C.S. Lewis, autor das Crônicas de Nárnia.

Outro britânico, o filósofo Antony Flew, era um dos mais notórios defensores do ateísmo até que, em 2008, publicou o best-seller "Deus existe". Flew não aderiu ao Cristianismo, mas admitiu que as evidências apontavam para a existência de um Criador.

Mais recentemente, a escritora Ayaan Hirsi Ali também anunciou sua conversão ao Cristianismo. E até o ateu mais famoso do mundo, o biólogo Richard Dawkins, afirmou que se considera "culturalmente cristão". Embora continue não acreditando em Deus, ele disse se identificar com os aspectos civilizacionais do Cristianismo.

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Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]