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No bar A Repichoca, em Corunha, noroeste da Espanha, um grupo de jovens se reúne para beber e tocar instrumentos como gaitas de fole. Eles falam galego entre si e com quem mais estiver perto, sem se importar se o interlocutor responde em espanhol ou em português. Quase sempre, todo mundo se entende.
A estudante Raquel Pérez, 25, faz parte do grupo. "Minhas avós sabiam galego, mas só aprendi no colégio", conta. Desde a faculdade, ela decidiu usar só a língua local. "Percebi que não havia sentido em viver aqui e não falar galego."
No entanto, o uso da língua entre os jovens tem diminuído. "Temos uma falta de uso nessa faixa etária. Eles sabem ler e escrever, mas não usam tanto quanto as pessoas mais velhas", explica Valentín García, secretário de Política Linguística da Xunta de Galícia, o governo local.
Segundo a RAG (Real Academia Galega), há cerca de 2 milhões de falantes do idioma, para uma população local de 2,7 milhões de pessoas.
No entanto, a língua é pouco ouvida em grandes cidades da região, como Corunha e Vigo, e tem presença mais forte nos povoados do interior.
"Tem havido uma diminuição no número de pessoas que a usam como primeira língua, e um aumento das que a utilizam como segundo idioma", avalia Henrique Monteagudo, secretário da RAG.
Uma das razões que afastam os jovens é que a maior parte do conteúdo que buscam nos meios digitais está em inglês ou em espanhol. Embora haja muitos perfis em galego nas redes sociais, é raro que as séries tenham dublagem na língua local, por exemplo.
Entre os motivos para a falta de protagonismo do idioma estão a censura no passado e o preconceito social. "O castelhano era a língua das elites, e o galego, dos camponeses e dos pescadores. Havia o estigma de ser uma língua das classes baixas", explica García.
Parte dessa má imagem tem origem na ditadura de Francisco Franco, que comandou a Espanha entre 1936 e 1975. No período, o galego sofreu censura e foi banido das escolas. O governo buscava sufocar o uso de línguas locais por temer que pudessem estimular o separatismo.
Antes de Franco, o galego vivia um momento de renascimento. A língua surgiu no século 12, como galaico-português. Na Idade Média, a capital galega, Santiago de Compostela, se consolidou como destino de peregrinos, o que ajudou a impulsionar a língua.
Separados pelo rio Minho, os reinos da Galícia e de Portugal desenvolveram versões próprias do galaico-português nos séculos seguintes. Entre as diferenças, o galego usa o x em casos em que o português usa o j (como em "xustiza") e mantém termos do espanhol, como "pero" em vez de "mas".
O reino da Galícia foi incorporado ao império espanhol, que fez do castelhano o idioma oficial. Com isso, o galego entrou em declínio a partir do século 16. Houve um movimento de resgate a partir do século 19, interrompido com a ascensão de Franco.
Com a volta da democracia, a Galícia se tornou comunidade autônoma e decretou o galego como língua oficial. Em 1983, uma lei incluiu aulas do idioma nas escolas e traduziu os nomes oficiais dos lugares. Assim, La Coruña virou oficialmente A Coruña.
Em 1997, outra lei obrigou o uso do idioma em todos os documentos e ações oficiais. No verão, os avisos aos banhistas na praia são anunciados em dois idiomas.
A Xunta investe 8 milhões de euros (R$ 34,7 milhões) anuais em ações para estimular o galego, como a produção de livros e shows. O dinheiro também vai para TVs, rádios e jornais. No entanto, há críticas pelo fato de nenhum diário impresso atualmente ser escrito 100% em galego.
Nos últimos anos, houve reveses. Em 2009, o PP (Partido Popular), de direita, assumiu o comando da Xunta e aprovou medidas como a redução do ensino da língua nas escolas públicas.
"Antes, no mínimo 50% das aulas eram em galego. Com a mudança, o conteúdo mínimo passou a ser de 33%", aponta Monteagudo. "Aprender o galego faz com que os jovens possam se comunicar mais facilmente em outros idiomas, inclusive em português", diz.
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