O programa de humor encontrou seu homem perfeito. Em junho de 2014, John Oliver encontrou-se com o renomado astrofísico britânico Stephen Hawking para uma entrevista.
“Você afirmou que poderia existir um número infinito de universos paralelos”, disse o anfitrião do programa “Last Week Tonight”, da HBO. “Isso significa que existe um universo onde eu sou mais inteligente do que você?”
“Sim”, Hawking respondeu de sua cadeira de rodas, seus lábios se dobrando em um leve sorriso. “E também um universo onde você é engraçado”.
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Hawking morreu na madrugada desta quarta-feira em sua casa, na Inglaterra, aos 76 anos de idade. Ao longo de sua carreira, como um dos cientistas mais proeminentes do mundo, ele regularmente aceitou participar de programas cômicos de língua inglesa como “The Simpsons” e “Late Night with Conan O’Brien”.
Essas incursões inusitadas ocorreram concomitantemente ao seu brilhante trabalho sobre o universo. O humor, no entanto, não era apenas um lado de sua personalidade, mas uma chave para superar a doença degenerativa do neurônio motor, a esclerose lateral amiotrófica, contra a qual lutou desde 1963.
“Manter uma mente ativa tem sido essencial para minha sobrevivência, assim como manter um bom senso de humor”, disse Hawking em um documentário de 2013. “Eu, provavelmente, sou mais conhecido por minhas aparições nos programas ‘The Simpsons’ e ‘The Big Bang Theory’ do que eu pelas minhas descobertas científicas”.
Esse humor foi ampliado diante de um prognóstico terrível.
“Quando eu fiz 21 anos, minhas expectativas foram reduzidas a zero. Era importante o fato de eu gostar do que fazia. Também é importante não se irritar, não importa o quão difícil é a vida, porque você pode perder toda a esperança se você não puder rir de si mesmo e da vida em geral”
Aos 21 anos, Hawking foi diagnosticado como portador de esclerose lateral amiotrófica, também conhecida como doença de Lou Gehrig. De acordo com a associação de médicos especializados nessa enfermidade, 50% das pessoas afetadas vivem pelo menos três anos após o diagnóstico, 20% cinco anos depois e apenas 10% viverão mais de dez anos.
A doença acabaria por desligar as funções motoras de Hawking, impedindo a sua fala e tornando-o incapaz de se mover sem uma cadeira de rodas. Os médicos disseram na época que ele estaria morto em dois anos. Seu caso, no entanto, provou ser uma versão rara e de ação lenta.
Hawking lutou bravamente contra o seu estado físico, conquistando a posição de célebre professor de matemática na Universidade de Cambridge e alterando a concepção popular da física com seu best-seller de 1988, “A Breve História do Tempo”.
O fato de Hawking ter sobrevivido tanto tempo é impressionante. “Ele é conhecido como um dos pacientes mais longevos, o que viveu mais tempo entre os sobreviventes com essa enfermidade na história”, escreveu o International Business Times, em 2012. “O que aconteceu com ele é espantoso”, afirmou Leo McCluskey, diretor médico da Universidade Médica da Pensilvânia, especializado nessa enfermidade. “Ele certamente é um ponto fora da curva”.
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Em uma sessão de perguntas e respostas de janeiro de 2016, Hawking creditou ao seu trabalho e ao “senso de humor” as causas para estar tanto tempo vivo.
“Quando eu fiz 21 anos, minhas expectativas foram reduzidas a zero”, disse ele. “Era importante o fato de eu gostar do que fazia. Também é importante não se irritar, não importa o quão difícil é a vida, porque você pode perder toda a esperança se você não puder rir de si mesmo e da vida em geral”.
As apresentações de Hawking na televisão aproveitavam as brincadeiras que fazia sobre si mesmo.
“Sua teoria de um universo em forma de rosquinhas é intrigante, Homer”, Hawkings disse ao pai da família retratada em “The Simpsons”, em um episódio de 1999. “Tenho de roubar isso”.
“Uau”, respondeu Homer. “Eu não posso acreditar que alguém que eu nunca ouvi falar está se saindo tão bem quanto eu”.
“Professor Hawking, é uma honra e um privilégio conhecê-lo, senhor”, disse Sheldon, um dos personagens geeky de “The Big Bang Theory”.
“Eu sei”, Hawking respondeu.
Ele exibia o mesmo humor fora da tela. No Twitter, na noite de terça-feira, Robert A. McNees, professor associado do Departamento de Física da Universidade Loyola, Chicago, lembrou-se de passar uma noite de “jantar e bebidas, e depois karaokê” com o renomado pesquisador. No final da noite, McNees disse que ele perguntou o quão tarde Hawking estava planejando ficar fora.
“Até as baterias da cadeira terminarem”, brincou o professor, de acordo com McNees.
Em 2009, Hawking organizou uma festa em Cambridge. Garrafas de champanhe foram distribuídas, balões espalhados pela sala. O evento, porém, contou com um detalhe bizarro: Hawking não enviou os convites até depois da festa. A festa não era para seus contemporâneos, como ele explicou em um vídeo do YouTube, mas para futuros viajantes do tempo.
“Espero que cópias [dos convites] sobrevivam por muitos milhares de anos”, explicou Hawking no vídeo. “Talvez um dia alguém que viva no futuro use uma máquina do tempo para voltar para minha festa, provando que a viagem pelo tempo um dia será possível”.
Ninguém compareceu.
“Que vergonha”, ele brincou. “Eu esperava que uma futura Miss Universo entrasse pela porta”.