Está faltando uma peça chave na discussão norte-americana sobre assédio sexual. O foco da mídia nessa epidemia terrível é bem-vindo para as mulheres, já que mostra que a cultura do silêncio está finalmente mudando. Mas e os homens?
Não estou me referindo aos homens que vitimizam as mulheres – que nos veem como objetos passíveis de serem apalpados, maltratados ou humilhados em piadas. Estou falando dos homens que testemunharam um assédio ou sabiam que ele acontecia, mas permaneceram covardemente em silêncio. Americanos precisam de uma alternativa à mídia tradicional. Mas isso não basta.
Depois que os episódios de assédio sexual supostamente realizados pelo produtor Harvey Weinstein chegaram nos jornais (e continuam chegando), Ben Affleck e Matt Damon afirmaram repudiar suas ações. Mas, de acordo com relatos, os dois atores tinham conhecimento do assédio sofrido pela colega e ex-namorada de Affleck, Gwyneth Paltrow.
Onde estava a convicção moral deles quando eles souberam do crime pela primeira vez? Onde estava o pedido por justiça feito por Damon quando ele soube do abuso realizado há algumas décadas?
O diretor Quentin Tarantino, assim como tantos outros, também admitiu saber do comportamento de Weinstein com mulheres. E afirmou: “eu sabia o suficiente para fazer mais do que eu fiz”.
Ainda que sua falta de ação no momento do abuso seja entristecedor, sua confissão honesta deveria servir como lição para todos os homens: se você sabe de um abuso, você tem a obrigação de falar sobre ele.
Se fazer de cego e ignorar essas ações significa que a vítima também é ignorada e permite que esse ciclo de abuso continue. O silêncio diz muito. E manda uma mensagem bastante clara para as mulheres: que você é cúmplice e até concorda com esse tipo de ação.
Quantas mulheres seriam poupadas se outras pessoas que tinham conhecimento da conduta de Weinstein o tivessem denunciado antes? Se as testemunhas tivessem deixado de lado as ramificações pessoais e agido, essa cultura abusiva de Hollywood poderia ter se enfraquecido antes de ter somado tantas vítimas e de ter arruinado tantas vidas.
Isso sem contar que canalhas como esse deveriam ser expostos o mais cedo possível, para evitar novas vítimas de suas ações.
Mas não é só Los Angeles que está começando a se livrar desse mal. O movimento #MeToo (#EuTambém) nos ensinou muitas coisas, incluindo que vítimas de assédio sexual estão presentes em nossas vidas. Muitas das nossas mães, esposas, filhas, irmãs, amigas e avós carregam o peso desse abuso por muito tempo, envergonhadas demais para admitir que são vítimas.
Veja o ambiente de trabalho, por exemplo. De acordo com um relatório sobre abuso sexual em escritórios, foi estimado que 75% dos incidentes de assédio não são relatados por medo de retaliação. Isso é inaceitável.
Homens, muitos de vocês estão quietos por muito tempo. É hora de falar e fazer a coisa certa. Isso começa com não tolerar as fofocas vulgares no banheiro. Significa não rir das piadas sexuais que tiram sarro das colegas de trabalho. Significa denunciar e se opor a atos ilícitos e comportamentos sexuais impróprios.
Mesmo que você não conheça a vítima e o abusador pessoalmente, você tem uma responsabilidade ética de repreender um abuso e, se for o caso, chamar as autoridades necessárias, caso testemunhe a sua ocorrência.
É fácil se juntar ao coro e condenar publicamente o mais novo abusador depois de que os fatos já aconteceram. Mas, se você não tem a coragem de denunciar o ato quando acontece, você não é diferente dos outros.
Publicado por Ideias em Sexta, 20 de outubro de 2017