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O refugiado Yaouba Hamadou (à frente, no centro), de 13 anos,  chega em Lolo, em Camarões, vindo da República Central Africana. Ele finalmente se encontrou com sua irmã depois de três anos separado. | REINNIER KAZEAFP
O refugiado Yaouba Hamadou (à frente, no centro), de 13 anos,  chega em Lolo, em Camarões, vindo da República Central Africana. Ele finalmente se encontrou com sua irmã depois de três anos separado.| Foto: REINNIER KAZEAFP

Há alguns anos, ouvi o ícone dos direitos humanos Natan Sharansky contar como ele e os companheiros refuseniks, na União Soviética, sentiram a coragem renovada graças aos comentários feitos sobre eles por Ronald Reagan. Chegara ao gulag a notícia de que o líder da nação mais poderosa do planeta falara em defesa de seu direito de autodeterminação. Os EUA, na pessoa de seu presidente, lhes dera esperança – e ela é uma defesa poderosa contra a opressão. 

Enquanto ouvia Sharansky, eu me lembrei do quanto fora importante para mim e os outros prisioneiros de guerra saber, de acordo com os recém-chegados em nossas fileiras, que o governador da Califórnia, Ronald Reagan, volta e meia defendia nossa causa, exigindo tratamento digno e exortando o país a não se esquecer de nós. 

Em seu intuito contínuo de nos deixar desesperados e acabar com nosso apego pela pátria, os captores norte-vietnamitas insistiam em dizer que tanto o governo como o povo dos EUA nos tinham esquecido. Provocavam, dizendo que estávamos sozinhos, à mercê deles. Conseguimos nos agarrar às provas do contrário e nos permitimos a esperança de, um dia, podermos voltar para casa com a honra intacta. 

E foi essa crença a base de nossa resistência. É bem provável que muitos de nós, talvez todos, tivessem se rendido ao desespero e trocado a honra pelo alívio do fim da violência se realmente acreditassem que fôramos esquecidos pelo nosso governo e nossos compatriotas. 

Em um pronunciamento recente aos funcionários do Departamento de Estado, o Secretário Rex Tillerson disse que condicionar nossa política externa exclusivamente a valores cria obstáculos ao avanço de nossos interesses nacionais. Com essas palavras, enviou um recado para os oprimidos do mundo: "Não esperem nada dos EUA. Nossos valores nos fazem simpáticos à sua causa, mas só quando for conveniente nos manifestaremos oficialmente a favor dela. Acontece que fazemos políticas para servir aos nossos interesses, que não têm nada a ver com os seus valores, ou seja, se vocês, por acaso, estiverem atrapalhando o nosso relacionamento com seus opressores, aqueles que podem reforçar nossa segurança e nossos interesses econômicos, boa sorte. Vocês terão que se virar sozinhos." 

Há aqueles que justificam o ponto de vista de Tillerson como o esclarecimento franco e objetivo, ainda que sem nenhuma compaixão, de uma política externa baseada no realismo –, mas se por realismo entendem uma política baseada no mundo atual, não naquele que queremos que seja, não poderiam estar mais errados. 

Eu me considero um realista. Com certeza já tive a minha cota do mundo como ele realmente é, e não como eu gostaria que fosse. E o que aprendi foi que é bobagem achar que o realismo e o idealismo são incompatíveis, ou achar que nosso poder e riqueza podem sofrer se exigirmos justiça, moralidade e consciência. 

No mundo real, aquele vivido e vivenciado pelas pessoas reais, a necessidade dos direitos humanos e de dignidade, o desejo de liberdade, justiça e oportunidade, o ódio da opressão, da corrupção e da crueldade são reais. Ao negarmos essa experiência, estaremos negando as aspirações de bilhões de pessoas e estimulando um ressentimento duradouro. 

Os EUA não inventaram os direitos humanos; eles são comuns a todos os povos; nações, culturas e religiões não podem simplesmente escolher deixá-los de fora. 

Os direitos humanos existem acima do Estado e além da história. Não podem ser rescindidos por um governo da mesma forma que não podem ser cedidos por outro. Eles habitam o coração humano e ali, embora possam ser restringidos, jamais serão extintos. 

Somos um país com consciência. Desde sempre acreditamos que as preocupações morais devem ser parte essencial de nossa política externa, e não uma exceção a ela. Somos os principais arquitetos e defensores de uma ordem internacional governada por regras geradas a partir de nossos valores políticos e econômicos; de acordo com elas, nós nos tornamos muito mais ricos e poderosos. Nunca uma parcela tão grande da humanidade se viu vivendo em liberdade e longe da pobreza justamente por causa desses princípios. 

Nossos valores são a nossa força e nosso maior tesouro. Nós nos distinguimos dos outros países porque não fomos criados a partir de uma terra ou uma tribo, ou uma raça ou credo particulares, mas sim de um ideal, o de que a liberdade é um direito inalienável da raça humana, alinhado com a natureza e o universo do Criador. 

Encarar a política externa como um ato simplesmente transacional é mais perigoso do que os proponentes acreditam ser. Tirar dos oprimidos qualquer tipo de esperança pode nos custar o mundo que construímos e no qual prosperamos, nossa reputação na história como a nação diferente de todas as outras por nossas conquistas, nossa identidade e nossa influência duradoura na humanidade. Nossos valores são a base dos três. 

Se não fossem, ainda assim seríamos uma grande potência, em meio a tantas outras ao longo da história; conquistaríamos riqueza e poder durante um tempo, antes de fazermos parte de um passado discutível, mas somos mais que isso; somos excepcionais. 

Vimos o mundo como ele era e fizemos dele um lugar melhor. 

*John McCain é senador republicano pelo Arizona
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