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Mais uma vez, a Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ) volta à carga pela obrigatoriedade do diploma em jornalismo para exercer a profissão. “Trata-se de prática histórica”, argumenta Samira de Castro, presidente da entidade.
“Os jornalistas brasileiros assumiram a defesa da exigência da formação de nível superior específica em jornalismo desde o início da organização do movimento sindical. Esta luta começou na primeira metade do século passado, quando a categoria passou a reivindicar a formação em jornalismo em curso universitário. Os primeiros cursos foram implantados na década de 1940 e, em 1969, os jornalistas conquistaram a inclusão, na regulamentação da profissão, da exigência do diploma para o registro profissional”.
Desde 2009, por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), o diploma não é obrigatório para o exercício da profissão — foram 50 anos de obrigatoriedade, com início por decreto publicado durante a ditadura militar.
Em 2012, uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) restabelecendo essa exigência foi aprovada no Senado. Ela tramita na Câmara dos Deputados desde então. Mas por que o diploma de graduação em jornalismo deveria ser obrigatório para o exercício da profissão? Ele não poderia limitar a diversidade de pensamento nas redações?
“Profissionais de outras áreas sempre puderam colaborar com o jornalismo como colunistas, comentaristas, articulistas, apresentadores e fontes de matérias. Quando falamos em exercício profissional do jornalismo, estamos falando em atividade habitual remunerada de uma categoria de trabalhadores”, diz Castro.
Nomes de peso discordam. Leia agora o que seis dos mais renomados jornalistas do mundo (a maioria sem diploma na área) já comentaram sobre o que realmente importa para atuar na profissão.
Tom Wolfe (1930-2018)
Importância: Um dos expoentes do chamado novo jornalismo, que utiliza técnicas da literatura na produção de reportagens, é autor de Radical Chique (1970) e A Palavra Pintada (1975), em não ficção, e A Fogueira das Vaidades (1987) e Um Homem por Inteiro (1998) no campo da ficção.
Formação acadêmica: Graduação em Inglês, especialização em Estudos Americanos.
Diploma em jornalismo: Não.
O que pensava sobre a profissão: Nada de diploma. Wolfe dizia que o tempo que ele passou na universidade aumentou seu desejo de evitar o circuito acadêmico. Para ele, o bom jornalista era uma pessoa curiosa, sempre com papel e caneta a postos e boas perguntas para os entrevistados.
Truman Capote (1924-1984)
Importância: Escritor, roteirista e dramaturgo norte-americano, que produziu contos, peças, reportagens, adaptações para TV e roteiros para filmes. Entre suas obras, destaque para a novela de não-ficção A Sangue Frio (1966) e do clássico da ficção Breakfast at Tiffany's (1958), adaptado com sucesso para o cinema em 1961.
Formação acadêmica: Ensino médio.
Diploma em jornalismo: Não.
O que pensava sobre a profissão: Aos cinco anos de idade, Capote já andava com um bloco de notas e um dicionário a tiracolo. Com 11, mantinha o hábito de escrever três horas por dia. Considerava que um bom jornalista precisava, antes de mais nada, ser um bom escritor – e, para tal, inteligência e estilo são fundamentais.
Gay Talese (1932)
Importância: É autor de reportagens icônicas, como “Frank Sinatra Está Resfriado”, de 1966, em que afirma: “Sinatra resfriado é Picasso sem tinta, Ferrari sem combustível – só que pior”. Começou na década de 50, servindo café para a equipe da redação do jornal The New York Times e rapidamente se tornou um dos jornalistas mais influentes que já viveram.
Formação acadêmica: Graduação em jornalismo pela Universidade do Alabama.
Diploma em jornalismo: Sim.
O que pensa sobre a profissão: “A escola não ensina o que vai fazer de você um sucesso. Minha vida era fora da escola e o que fiz para ser bem-sucedido foi fora da escola”, ele já explicou em entrevista ao Correio Braziliense. “O jornalismo não deveria estar interessado no furo. Deveria se interessar pela literatura da realidade”.
Joan Didion (1934-2021)
Importância: Pioneira do chamado Novo Jornalismo ao lado de Gay Talese, Hunter S. Thompson e Tom Wolfe, em 1968 ela produziu a coleção de ensaios “Rastejando até Belém”, até hoje considerada uma das mais importantes referências a respeito do movimento hippie e da contracultura. Manteve-se uma observadora crítica da cultura e da política americana.
Formação acadêmica: Graduação em Inglês.
Diploma em jornalismo: Não.
O que pensava sobre a profissão: Ela passou a adolescência digitando as obras de Ernest Hemingway para aprender sobre as estruturas das frases. E afirmava: “Minha única vantagem como repórter é que sou tão pequena, tão discreta e tão inarticulada que as pessoas tendem a esquecer que minha presença vai contra seus melhores interesses. E sempre acontece”.
Seymour Hersh (1937)
Importância: Ganhou reconhecimento em 1969, ao expor o massacre de My Lai, durante a Guerra do Vietnã, assim como o esforço para encobrir o incidente. Na década de 1970, expôs bombardeios secretos americanos no Camboja e, em 2004, detalhou a rotina de abusos contra os prisioneiros de Abu Ghraib, no Iraque.
Formação acadêmica: Graduação em História.
Diploma em jornalismo: Não.
O que pensa sobre a profissão: Insistência, rigor com os fatos e, principalmente, não aceitar “não” como resposta, são as principais receitas de Hersh para alcançar sucesso no jornalismo investigativo. “Rastrear pessoas que não queriam ser encontradas era vital para o que eu fazia para viver, e eu era bom nisso”.
Bob Woodward (1943)
Importância: Ao lado de Carl Bernstein, produziu uma série de reportagens que, no limite, provocaram a renúncia do presidente Richard Nixon. Já publicou mais de 20 livros investigativos a respeito de política americana e bastidores das relações exteriores dos Estados Unidos com seus adversários e aliados.
Formação acadêmica: Bacharelado pelo Corpo de Formação de Oficiais da Reserva Naval.
Diploma em jornalismo: Não.
O que pensa sobre a profissão: Assim como Hersh, não vê na graduação um caminho para superar os principais desafios da profissão: “O dilema central do jornalismo é que você não sabe o que não sabe. A capacidade de um repórter de manter o vínculo de confidencialidade geralmente permite que ele aprenda os aspectos ocultos do governo.”