Minha família adquiriu um PlayStation 5 (PS5) há alguns anos. É uma decisão que às vezes lamento, porque meu filho mais novo, que tem sete anos, gosta de jogá-lo demais. (Em resposta ao abuso, desplugamos e guardamos.)
Mas é fácil esquecer o quão maravilhosa é a modernidade do PS5.
Quando comecei a jogar videogames no início a meados dos anos 80, Galaga era o jogo mais popular no fliperama local, que basicamente consistia em algumas máquinas de videogame na sala de calefação da pista de patinação no gelo. Eu gastava bolsos cheios de moedas para jogar um game com aparência pixelizada.
Quando conseguimos um Atari em 1984, achei que era a coisa mais incrível do mundo, embora meu jogo favorito, Jungle Hunt, parecesse muito pior que Galaga. Atari usava apenas 128 bytes de memória RAM e tinha uma resolução máxima de 160 pixels de altura por 192 pixels de largura.
Quando você compara esses jogos com a experiência que os usuários têm hoje no PS5, que pode ser comprado por menos de US$ 400 (R$ 2 mil, jogo incluído), é um lembrete de como os jogadores de hoje têm sorte. (Os PS5 têm 16 gigabytes de memória RAM, ou 16 bilhões de bytes.)
Eu trago tudo isso à tona, em parte, porque um clipe que está viralizando nas redes sociais revela que essa invenção maravilhosa só poderia ser produzida em um sistema capitalista. O clipe, que acumulou cinco milhões de visualizações no X após ser compartilhado por Dylan Allman, apresenta o economista marxista Richard Wolff, que foi entrevistado pelo streamer americano Destiny em 2022.
Na entrevista, um ouvinte faz a Wolff uma pergunta provocativa: “No seu sistema de cooperativas de trabalhadores, eu ainda conseguiria meu PlayStation 5?”
Wolff, professor emérito de economia na Universidade de Massachusetts em Amherst, ofereceu esta resposta:
"Com certeza. Você teria que lutar um pouco por isso. Você teria que conversar com seus colegas de trabalho. Você teria que falar sobre a distribuição de renda. Você teria que comparar seu desejo por um PlayStation contra todos os outros interesses de todas as outras pessoas. Não seria algo que você resolveria sozinho com seu chefe específico, de forma alguma. Teria que ser uma decisão democrática. Você teria que aceitá-la da maneira que se faz com decisões democráticas agora em nossa sociedade, na medida em que as temos."
É uma resposta longa, sinuosa e praticamente incoerente. Wolff responde que sim, você com certeza teria um PS5 — e então prossegue para ilustrar todas as razões pelas quais um PS5 não seria criado em um sistema socialista.
Sobre preços e consumidores
Quando Wolff diz “você teria que comparar seu desejo por um PlayStation contra todos os outros interesses de todas as outras pessoas”, ele está pedindo o impossível.
Não há modo de medir o desejo mais do que há para determinar o valor intrínseco de algo.
O valor é subjetivo. Algumas pessoas não se importam se têm um PS5, enquanto outras choram de alegria quando recebem um PS5 no Natal. E então há a questão do contexto. Atualmente, valorizo meu PS5 muito mais do que valorizo meus sapatos e o bife de costela de 600 gramas no meu freezer. Mas se eu não tivesse sapatos ou mal tivesse comido nos últimos dias, isso poderia mudar rapidamente.
É por isso que temos preços. Em um mercado livre, os empreendedores demonstram sua demanda por recursos — capital, trabalho, espaço, e por aí vai — pelo preço que estão dispostos a pagar por eles, assim como os consumidores decidem se compram um produto por um determinado preço ou usam seu dinheiro em outro lugar.
Os preços são um pilar da economia de mercado livre. Eles são sinais que indicam oferta e demanda para compradores e vendedores, e a melhor ferramenta do universo para alocar recursos escassos de forma eficiente.
Wolff não menciona preços de forma alguma enquanto discute a construção de um PS5, mas ficamos com a impressão de que o ouvinte conseguirá seu console de videogame desde que possa convencer seus colegas de trabalho de que seu desejo por um justifica isso quando ponderado contra os interesses de “todas as outras pessoas.”
Esse é um pensamento econômico retrógrado e aponta para um ponto importante que separa um sistema socialista de um capitalista. Tradicionalmente, sob o socialismo, não são os empreendedores e consumidores que ditam o que é produzido, mas os planejadores centrais. Isso é o oposto do capitalismo, onde os consumidores em última análise decidem quais produtos falham e quais têm sucesso. O economista Ludwig von Mises descreveu isso como soberania do consumidor:
“Os capitalistas, os empreendedores e os agricultores são instrumentais na condução dos assuntos econômicos. Eles estão no leme e dirigem o navio. Mas eles não são livres para moldar seu curso. Eles não são supremos, são apenas timoneiros, obrigados a obedecer incondicionalmente às ordens do capitão. O capitão é o consumidor.”
Se você duvida disso, basta olhar para a história da Atari.
Atari: uma breve história
O console de jogos Atari 2600 chegou à cena no final dos anos 1970 e início dos anos 1980 como um gigante. Em poucos anos, a receita anual explodiu de US$ 75 milhões para US$ 2 bilhões (R$ 32 bilhões, corrigindo para inflação desde 1983, na cotação atual).
A Atari foi fundada em 1972 por Nolan Bushnell e Ted Dabney, que viram o potencial de mercado da tecnologia emergente de videogames. Em 1979, a Atari, que havia sido comprada pela Warner Communications em 1976 por US$ 28 milhões (R$ 788 milhões), vendeu um milhão de unidades de consoles domésticos. Até 1982, estava vendendo 10 milhões.
A Warner Communications, que havia investido enormes quantias de capital no desenvolvimento e promoção do novo console de jogos da Atari, estava colhendo as recompensas.
"As receitas da Atari representavam enormes 70% da renda da Warner", diz o influenciador Dagogo Altraide em um documentário sobre a Atari no canal ColdFusion.
Todo esse sucesso atraiu a concorrência, no entanto. Todos queriam lucrar com os videogames.
Em pouco tempo, o Atari 2600 não estava apenas competindo contra rivais antigos como o Magnavox Odyssey, o Intellivision da Mattel e o Bally Astrocade, mas com uma série de outros consoles de jogos desenvolvidos mais tarde, como o ColecoVision, que foi lançado em agosto de 1982.
As empresas estavam investindo quantias massivas de capital em seus próprios consoles de videogames numa tentativa de destronar o Atari. O que se seguiu foi um evento que foi rotulado como o Crash dos Videogames de 1983, "uma recessão em larga escala na indústria de videogames que ocorreu de 1983 a 1985."
Muitos argumentariam que o crash foi o resultado de uma "falha de mercado", mas isso ignora o próximo capítulo na história dos videogames. A "recessão" terminou com a chegada de um novo console de jogos lendário: o Nintendo Entertainment System (NES).
“Incessantemente destruindo o antigo, incessantemente criando o novo”
A ascensão do NES marcou o fim da dominação do Atari nos jogos. Estatísticas da indústria mostram que até 1987, a participação de mercado do Atari em consoles de videogames caiu de 80% para 24%.
O "Nintendinho", por sua vez, enfrentou uma pressão implacável de concorrentes. Enfrentaria outros desafios, como o Genesis da Sega, lançando sistemas novos e melhores, como o Super Nintendo e o Nintendo 64. No fim, o Xbox da Microsoft e o PlayStation da Sony destronariam a Nintendo, embora a empresa fizesse um retorno em 2017 com seu Nintendo Switch (no qual você pode agora acessar jogos clássicos do Sega Genesis).
Esse processo contínuo de criação, inovação e destruição na busca por lucros é algo contra o qual o socialismo nunca poderá fazer frente. Não é como se países socialistas não pudessem produzir videogames ou consoles de videogames. Eles podem e têm.
Muitos se esquecerão de que os videogames eram bastante populares na União Soviética no final dos anos 1970 e 1980, e os soviéticos até vendiam seu próprio console de videogame.
O Turnir era um console lançado em 1978 pelo Ministério da Indústria Eletrônica da URSS. Ele custava 150 rublos (cerca de R$ 3,8 mil em 2024) e foi fabricado até 1982. O Turnir foi um dos poucos consoles de jogos que surgiram na URSS, mas o que é notável é a ausência de melhorias nesses modelos.
De fato, a falta de inovação era tão ruim que, imediatamente após a queda da União Soviética, o console de videogame mais popular na Rússia e nos ex-Estados soviéticos era o Dendy, uma versão barata e falsificada do popular NES da Nintendo.
A competição de décadas pela primazia nos videogames que viu o NES substituir o Atari, e o Xbox substituir o Nintendo, e o PS5 por fim — mas não permanentemente — substituí-los a todos (desculpe, fãs do Xbox) não é uma característica do socialismo. É uma característica do capitalismo.
A inovação persistente dos sistemas de jogos para atender aos desejos dos consumidores é um exemplo clássico do que o economista Joseph Schumpeter descreveu como destruição criativa, em que a estrutura econômica é "incessantemente revolucionada… de dentro para fora, incessantemente destruindo o antigo, incessantemente criando o novo."
Este processo de destruição criativa, que Schumpeter acertadamente viu como o motor da prosperidade e inovação comercial, é notoriamente ausente nos sistemas socialistas, e por um bom motivo: Marx e seus discípulos o detestavam.
Enquanto Schumpeter celebrava a destruição criativa, Marx a via como "aniquilação".
"…a destruição do capital através de crises significa a depreciação dos valores que os impede de renovar mais tarde seu processo de reprodução como capital na mesma escala", Marx escreveu ponderadamente em Das Kapital. Ele continuou:
“O que um perde, o outro ganha. Valores usados como capital são impedidos de agir novamente como capital nas mãos da mesma pessoa. Os velhos capitalistas vão à falência. (...) Uma grande parte do capital nominal da sociedade, isto é, do valor de troca do capital existente, é de uma vez por todas destruída, embora essa mesma destruição, uma vez que não afeta o valor de uso, possa muito bem acelerar a nova reprodução. Este também é o período durante o qual o interesse monetário se enriquece à custa do interesse industrial.”
Dessas palavras (e outras), pode-se ver que o próprio processo que Schumpeter reconheceu como o motor da inovação e dinamismo em uma economia de mercado Marx viu como uma falha inerente.
Wolff, como Marx, parece completamente alheio ao que impulsiona a inovação de mercado. Acreditar que um PS5 surgiria de um processo de indivíduos conversando entre si sobre quanto devem ser pagos e pesando o interesse de um por videogame contra os interesses de colegas de trabalho que desejam algo diferente é ignorar tanto a história quanto os fundamentos da economia.
Mas talvez isso não deva nos surpreender.
"Se os socialistas entendessem de economia", brincou o economista ganhador do Prêmio Nobel, F. A. Hayek, "eles não seriam socialistas."
©2024 Foundation for Economic Education. Publicado com permissão. Original em inglês.
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