Em “Faça-os Ler!”, Michel Desmurget alerta para as consequências devastadoras dos baixos índices de leitura atuais na educação das próximas gerações.| Foto: Pixabay/Gary Cassel
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Diretor de pesquisa do Instituto Nacional de Saúde da França, o neurocientista Michel Desmurget é o autor de um dos livros mais importantes sobre os riscos do uso das novas tecnologias imersivas pelos mais jovens: "A Fábrica de Cretinos Digitais".

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Estimulado pela boa recepção da obra, ele escreveu "Faça-os Ler! — Para Não Criar Cretinos Digitais" (selo Vestígio), em que mostra por que o hábito da leitura na infância contribui para a formação dos três pilares fundamentais da humanidade das crianças: as competências intelectuais, emocionais e sociais.

No recorte a seguir, Desmurget alerta para as consequências devastadoras dos baixos índices de leitura atuais na educação das próximas gerações.

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O recuo generalizado da leitura é sentido de forma mais marcante pelo meio universitário.

Como indicou uma pesquisa recente, “os estudantes sabem que é importante ler, eles sabem que o professor espera que eles leiam e sabem que isso terá um impacto em suas notas, mas, apesar disso, a maioria não lê seus manuais”.

Isso é especialmente verdadeiro para as leituras obrigatórias, que 70% a 80% dos estudantes ignoram em parte ou totalmente.

Mais uma vez, a mudança é marcante. No início dos anos 1980, a taxa era de apenas 20%, ou seja, havia quatro vezes menos alunos resistentes do que hoje. Embora a queda seja menos acentuada para leituras pessoais, ela ainda é impressionante.

Entre 1994 e 2015, a porcentagem de estudantes ingressando no ensino superior que declararam não ter lido “por prazer” no ano anterior aumentou de 22% para 33%. Ao mesmo tempo, a taxa de leitores assíduos (mais de seis horas por semana) caiu de 12% para 8%.

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Naturalmente, o sistema acadêmico precisou se adaptar a essas quedas. Nos Estados Unidos, em uma universidade de elite privada, nos últimos cinco a dez anos, 49% dos professores reduziram o volume de leituras obrigatórias; 20% reduziram sua complexidade porque os estudantes “não estavam entendendo o que estavam lendo”; 32% passaram mais vídeos para compensar essas mudanças.

Tendências globalmente semelhantes foram identificadas na Noruega, em uma instituição pública menos seletiva. As porcentagens chegaram a 41% para a redução no volume de leitura, 56% para a redução na complexidade das obras e 24% para o uso substitutivo de vídeos.

E é aqui que a porca torce o rabo, porque os estudantes de hoje serão os professores de amanhã.

Ciclo de vicioso cria estudantes sem inspiração

Em outras palavras, como destacam os autores de um artigo científico sobre o assunto, “o cenário mais alarmante que emerge da pesquisa talvez se refira à possibilidade de um ciclo vicioso de ensino, produzindo um grande número de estudantes sem inspiração, muitos dos quais se tornarão professores que lutam para despertar nos alunos um amor pela leitura que eles nunca conheceram”.

Em consonância com esse receio, foi demonstrado que os professores que mais valorizam a literatura também são os mais capazes de ensiná-la e transmitir o gosto pela leitura aos alunos. Além disso, foi estabelecido que o declínio geracional na leitura também afetou a esfera educacional.

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Para confirmar isso, os pesquisadores compararam os hábitos de dois grupos de professores titulares (com idade média de 40 anos) e estagiários (com idade média de 25 anos).

Os resultados indicaram que os professores titulares haviam lido 1,3 vezes mais livros infantojuvenis e 2,7 vezes mais romances de ficção do que seus colegas estagiários. Entre esses últimos, 30% afirmaram não gostar de ler. Esse percentual era 15 vezes menor entre os professores titulares (2%).

O desempenho dos estudantes franceses no concurso de recrutamento de professores escolares confirma essas tendências preocupantes. Embora as análises ainda sejam qualitativas, as sínteses dos diferentes júris de avaliação do concurso de 2022 são contundentes. O relatório publicado pela Academia de Lille ilustra bem a tendência geral.

Em relação à prova escrita de francês, ele menciona “palavras infantis ou relacionadas a conversas entre amigos, histórias de vida, que marcam a ausência de reflexão ou de uma visão mais ampla que vá além da evocação de relações familiares pessoais. Muito poucos candidatos citam fontes que poderiam demonstrar uma cultura pessoal. Alguns o fazem citando um autor errado, citando um programa de reality show ou desenhos animados da Disney. Uma pequena minoria é capaz de citar algumas leituras pessoais. No âmbito da forma, muitos avaliadores ainda se surpreendem com a falta de domínio da língua francesa, apontam muitos erros ortográficos (concordâncias básicas), erros de sintaxe e expressões coloquiais”.

Nada disso inspira tranquilidade se considerarmos, talvez não seja inútil lembrar, que os dados aqui apresentados se referem a graduados do ensino superior, aos quais o Estado está prestes a confiar a educação de nossos filhos.

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Crianças e adolescentes gostam de ler por prazer. No entanto, na prática, eles não apenas leem muito pouco como também leem muito menos do que as gerações anteriores

Essa dinâmica resulta principalmente da concorrência inabalável das telas recreativas. Além disso, os usos atuais se concentram menos em livros clássicos e mais em revistas, mangás e quadrinhos.

Esse abandono da leitura é tão pronunciado que ecoa até o topo da pirâmide escolar. Até mesmo os estudantes universitários estão lendo menos; a ponto de seus professores estarem cada vez mais inclinados a substituir materiais de aprendizagem escritos por conteúdos de áudio e vídeo.

Uma espiral sombria, considerando que os estudantes de hoje se tornarão os professores que, amanhã, terão de transmitir a arte e o gosto da leitura a nossos filhos.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]
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