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Conhecido como Harlem Hellfighters, e composto apenas por negros, o regimento enfrentou a discriminação para lutar no front europeu.
Conhecido como Harlem Hellfighters, e composto apenas por negros, o regimento enfrentou a discriminação para lutar no front europeu.| Foto: Domínio Público/ Wikipedia

Eu seu discurso na Howard University de Washington, em junho de 1924, quase seis anos depois do fim da Primeira Guerra Mundial, o presidente Calvin Coolidge homenageou os afro-americanos que lutaram no conflito:

“As pessoas de cor provaram repetidas vezes sua devoção aos ideais mais nobres do nosso país. Eles serviram o pais na guerra com o mesmo patriotismo e prontidão que os demais cidadãos. Os registros de recrutamento mostram que mais de2.250.000 homens de cor se alistaram. Os registros provam ainda que, longe de evitarem participar da defesa nacional, eles mostraram que queriam se alistar antes que o alistamento se tornasse obrigatório, e não tentaram desertar depois disso”.

O envolvimento norte-americano na calamidade europeia ainda gera controvérsias. Pessoalmente, considero um dos maiores erros de política externa desde o início do século XX (outro foi a Guerra do Iraque, de 2003). Mas é possível se opor às decisões políticas e ainda assim admirar o valor daqueles que estiveram no campo de batalha.

Quando Woodrow Wilson e o Congresso envolveram os Estados Unidos na guerra, em abril de 1917, os negros se perguntaram “Por que eu me envolveria nisso?” Wilson disse que os Estados Unidos deveriam “tornar o mundo um lugar seguro para a democracia”, mas internamente a democracia era negada aos negros. O próprio Wilson os considerava cidadãos de segunda classe. Ele promoveu a segregação em todo o governo federal e fez vistas grossas para a discriminação nos estados e municípios.

Apesar disso, os afro-americanos foram para a guerra, muitos esperando derrotar os alemães no exterior e o racismo no próprio país, se eles demonstrassem seu valor. A homenagem de Coolidge foi conquistada e ninguém a mereceu mais do que os homens do 369º. Batalhão de Infantaria do Exército, regimento voluntário conhecido como Harlem Hellfighters.

De onde veio o nome deles? O Harlem (em Nova York) era o lar de muitos recrutas. Ninguém sabe ao certo, mas parece que foram os franceses ou alemães que passaram a chamá-los de Hellfighters [algo como “guerreiros infernais”] por causa da ferocidade com que lutavam. E ninguém lutava com mais ferocidade do que Henry Johnson. Numa noite, em Argonne, Johnson, mesmo com 21 ferimentos, matou 4 alemães em combate corpo a corpo, e ainda resgatou um companheiro norte-americano — tudo em questão de minutos. Todo um batalhão de 28 alemães recuou ao ver os feitos de Johnson.

Formado a partir de uma unidade da Guarda Nacional de Nova York, os homens do 369º. aprenderam técnicas militares básicas no Camp Whitman, Nova York, antes de serem enviados para o Camp Wadsworth, em Spartanburg, na Carolina do Sul, para treinamento de combate. Eles não foram bem-recebidos por muitos dos habitantes do lugar, e alguns foram até mesmo submetidos à discriminação e xingamentos, apenas por causa de sua cor. em dezembro de 1917, eles foram enviados à França, onde lutariam na linha de frente.

Eles levaram um banho de água fria ao perceberem que o exército não pretendia usá-los para outra coisa que não trabalho manual. Até os rifles que eles trouxeram dos Estados Unidos foram confiscados pelos oficiais.

O comandante da Força Expedicionária, general John J. Pershing, hesitou em empregar tropas norte-americanas no front até que ele reunisse homens o bastante para garantir a vitória. Enquanto isso, os franceses estavam desesperados por força humana. Finalmente cedendo à pressão francesa, Pershing lhes cedeu o 369º. Apesar de algumas pessoas considerarem as tropas negras dispensáveis, eles se provaram ser imprescindíveis.

Veja só o incrível histórico dos Harlem Hellfighters. Nenhuma unidade norte-americana enfrentou mais combates do que eles — nada menos do que 191 dias sob fogo inimigo. Eles jamais perderam um centímetro de território. O inimigo jamais capturou um dos membros do pelotão. Eles sofreram as maiores baixas entre os regimentos norte-americanos. Ninguém desertou. Os franceses lhes concederam a maior honra militar do país, a Croix de Guerre. Muitos integrantes receberam a segunda maior honraria militar dos Estados Unidos, a Distinguished Service Cross. Postumamente, Johnson recebeu a Medalha de Honra em 2015. O 369º. acabou sendo o regimento norte-americano mais condecorado na guerra.

Outro ponto a se tonar nos Harlem Hellfighters era a banda do gripo, a maior e mais conhecida entre os regimentos norte-americanos. O líder era James Reese Europe, que se alistou em 1917, estimulando outros a se alistarem. Ele era um dos mais conhecidos músicos negros dos Estados Unidos e outros, como Noble Sissle, que se torno tenente e era o vocalista da banda de Europe, quiseram se alistar com ele.

A banda de Europe era muito popular entre os franceses, mesmo depois que Europe criou um arranjo especial para La Marseillaise, o hino nacional da França. A banda dos Hellfighters levou o jazz e o ragtime para a França, onde ninguém tinha ouvido esses estilos.

James Reese Europe foi tragicamente assassinado em 1919 por um membro da banda. Sissle fez fama na música e nos palcos. Ele estabeleceu uma parceria de longa data com o músico Eubie Blake. O musical que os dois produziram em 1921, Shuffle Along, teve mais de 500 apresentações na Broadway e é considerado um marco do movimento conhecido como Renascença do Harlem.

Nenhum texto sobre o Harlem Hellfighters, cuja história encorajo os leitores a explorarem, seria completa sem uma menção a um branco, o coronel William Hayward, do Nebraska. Hayward foi comandante do regimento desde o começo. Ele defendia os soldados negros e era amado por seus homens, nos quais Hayward jamais perdeu a fé. Ele defendia os direitos iguais para as pessoas de todas as cores. Quando o 369º. voltou a Nova York, em 1919, foi Hayward (não Wilson nem Pershing) quem se certificou de que houvesse um enorme desfile para recebê-los. Essa recepção pelas massas entusiasmadas nas ruas de Nova York foi um grande marco da harmonia racial.

Não importa o que você pensa sobre a entrada dos Estados Unidos na Primeira Guerra Mundial e não importa a cor da sua pele. Você pode e deve celebrar os heroicos Harlem Hellfighters. Eles foram os melhores.

Lawrence W. Reed é presidente emérito da FEE.

©2021 FEE. Publicado com permissão. Original em inglês
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