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Sociedades capitalistas criam uma rede maior de confiança que alcança a todos.
Sociedades capitalistas criam uma rede maior de confiança que alcança a todos.| Foto: Pixabay


Existe uma história apócrifa sobre um homem que vê seu vizinho procurando algo sob a luz de um poste. Sendo um bom vizinho, esse homem oferece ajuda. O homem que está procurando algo diz que perdeu as chaves do carro. Os dois procuram, mas as chaves não estão em nenhum lugar. “Tem certeza de que você derrubou as chaves aqui perto do poste?”, pergunta o vizinho preocupado. “Não tenho certeza”, responde o homem que perdeu as chaves. “Mas aqui ao menos temos luz”.

Se você alguma vez já ficou procurando um item perdido no mesmo lugar repetidas vezes, sabe que existe uma tendência natural a recorrer ao que se conhece em busca de soluções. A tendência à disponibilidade pode nos levar a dar atenção e importância indevidas a informações imediatamente disponíveis, ao mesmo tempo em que pode fazer com que ignoremos indícios maiores que claramente existem, mas que não são lembrados ou acessados com facilidade.

Dia após dia, a imprensa promove a narrativa de que os políticos são toda a fonte de bondade em nossas vidas. Mas não culpe a imprensa parcial. Muitas pessoas assistem, hipnotizados, à CNN, Fox News e MSNBC. Algumas passam horas por dia gravitando em torno da luz que a imprensa lança sobre os políticos, com uma interminável cobertura sobre quem está concorrendo, quem pode concorrer e quem deveria concorrer a determinado cargo. Será que os que assistem a isso realmente acreditam que o “segredo” para uma vida feliz está na disputa política?

Se você vive numa bolha ideológica, talvez se surpreenda ao saber que muitas pessoas bem-intencionadas consideram Alexandria Ocasio-Cortez brilhante e apoiam a plataforma socialista-democrata. Elas acreditam que indivíduos brilhantes detêm o conhecimento capaz de resolver os problemas sociais que elas percebem ao seu redor e que apenas a falsidade de pessoas sem compaixão impede a implementação dessas soluções. Essa ideia quanto ao conhecimento é um equívoco. As pessoas não entendem que o conhecimento útil não é um produto a ser empregado para determinado fim; ao contrário, o conhecimento deve ser descoberto ao longo de um processo.

“Por que não podemos nos ajudar mais e resolver esses problemas?”, elas se perguntam. “Temos de fazer alguma coisa”, dizem. Elas estão tão focadas em soluções governamentais que não percebem que processos de descobertas ocorrem todos os dias. Como diz Jonah Goldberg no livro Suicide of the West [O suicídio do Ocidente], “o capitalismo é o sistema mais solidário já criado para a melhora pacífica da vida das pessoas”. Goldberg continua: “O sistema de mercado é tão eficiente em fazer com que as pessoas – do mundo todo – trabalhem juntas que mal notamos o quanto estamos colaborando uns com os outros”.

Um passeio pelo mercado

Minha família consome refeições ricas em alimentos frescos. Moramos numa região rural; no verão, somos abastecidos pelos agricultores locais. Quando a temporada de colheita termina, as compras ficam mais difíceis. Uma loja pode ter recebido um carregamento de couve-manteiga, outra de couve-chinesa, outra de toranja. Somos consumidores ansiosos à procura de produtos frescos e de qualidade.

Recentemente, minha esposa e eu passamos um fim de semana em Boston. A caminho de casa, paramos para comprar várias coisas em diferentes saídas da autoestrada: primeiro no Wegmans, depois no Costco, Trader Joe’s, Market Basket, Whole Foods e, por fim, na cooperativa local.

Cada um desses mercados tinha um estacionamento lotado e uma atmosfera animada e próspera. Nenhum político ou economista criou regras para estabelecer quais produtos cada loja deve ter em estoque. Ao voltarmos para casa, nosso carro estava cheio de dádivas. Aqueles que queriam nos servir produziram, ao nosso alcance, uma profusão de coisas que nem mesmo um rei ou um Rockefeller poderiam ter imaginado há apenas um século.

Políticos como Elizabeth Warren podem até reclamar das grandes empresas. Mas que poder essas lojas exercem sobre nós? Redes de supermercados que não nos atendem bem perecem. O consumidor é quem manda, não os “capitalistas, os empreendimentos ou os fazendeiros”, como explica Ludwig von Mises em seu livro Burocracia:

Os consumidores, comprando ou se abstendo de comprar, decidem quem deve deter o capital e administrar as indústrias. Eles determinam o que deve ser produzido, em que quantidade e com qual qualidade. As atitudes deles resultam em lucro ou prejuízo para o empreendedor. Eles enriquecem os pobres e empobrecem os ricos. Eles não são chefes fáceis. Eles são cheios de caprichos e desejos, mutáveis e imprevisíveis. Eles não se importam com o mérito pretérito.

Assim que algo lhes é oferecido, algo de que eles gostam mais e que é mais barato, eles abandonam seus antigos fornecedores. A eles nada é mais importante do que sua própria satisfação. Eles não se importam com os interesses escusos do capitalismo nem tampouco com o destino dos trabalhadores que perdem seus empregos se, enquanto consumidores, eles deixam de adquirir o que costumavam comprar.

O que não percebemos sobre a economia

Às vezes o comum pode se revelar como algo milagroso. O estacionamento do mercado Whole Foods em Bedford, New Hampshire, está sendo reformado. Cartazes dividem o tráfego de veículos de consumidores e de entrega. As lojas precisam de fornecedores e clientes. Uma loja próspera não despreza seus clientes, mas às vezes os clientes não dão o devido valor aos fornecedores.

Todos os dias, caminhões trazendo alimentos de todo o mundo chegam ao Whole Foods. Os fornecedores confiam que serão pagos no prazo acordado. Fabricantes e agricultores que vendem seus produtos aos distribuidores confiam que serão pagos no prazo acordado. Os clientes acreditam que estão comprando produtos de qualidade.

Imagine o que aconteceria se não houvesse essa relação de confiança. Imagine o aumento de custos se fornecedores e agricultores não tivessem certeza de que seriam pagos, se os consumidores não confiassem no frescor e na qualidade dos produtos que estão comprando. Imagine como a atividade comercial seria completamente paralisada.

Nas sociedades tribais, a confiança naquilo que vem de fora da tribo é limitada. Nas sociedades capitalistas, há uma rede maior de confiança, um efeito benéfico intangível que alcança a todos.

Em seu livro Capitalismo consciente, o fundador do Whole Foods, John Mackey, diz que “a confiança é fundamental para uma boa relação com os consumidores”. Mackey cita o cofundador da Home Depot, Bernie Marcus, que disse: “Eu realmente amo os clientes. Quando entrava nas lojas, abraçava e beijava os consumidores porque sabia que tudo o que tenho na minha vida vinha deles”. Em vez de se ater ao resultado final, Marcus acreditava que “se tratarmos bem o consumidor, acabaríamos por alcançar o resultado final”.

Será coincidência o fato de algumas empresas extremamente confiáveis não gastarem praticamente nada com publicidade? Mackey diz que a rede de mercados Trader Joe’s gasta menos de 1% do faturamento em publicidade. Numa entrevista com Mackey, Doug Rauch, ex-presidente do Trader Joe’s, explica porque a rede não precisa “tentar criar uma demanda artificial e temporária” por meio da publicidade:

O Trader Joe’s tem uma missão muito clara e dá uma atenção especial à experiência do consumidor. Com o tempo, isso fez com que os consumidores se tornassem fãs da rede, embaixadores voluntários e agentes de marketing da empresa. Não só os funcionários das lojas como também os vendedores fazem publicidade para elas!

A Market Basket é uma adorada rede de mercados da Nova Inglaterra cujos clientes fizeram greve durante uma tentativa hostil de obrigar a empresa a ser vendida há alguns anos. A Market Basket, assim como a Wegmans, é conhecida pela lealdade dos clientes e funcionários.

Muitas coisas boas são criadas por capitalistas que podem ser demitidos a qualquer momento pelos consumidores. O socialismo destrói a confiança e a cooperação humana. Como exemplo, veja a Venezuela.

Por que insistimos em procurar respostas nos lugares errados?

Em vários textos, falo do apelo duradouro do socialismo. Alguns, por exemplo, acreditam que as boas intenções são mais importantes do que tudo; outros acham que o socialismo é mais solidário.

Há um metamotivo para as pessoas insistirem em procurar respostas nos lugares errados. Nosso ego é narcisista; nosso ego assume seu trono no centro do Universo. Nosso ego ignora o que não compreende, o que ele não criou e o que não pode controlar.

As redes de supermercado surgem e desaparecem. Marcas de alimentos vêm e vão. Compras virtuais e a entrega de alimentos podem ganham popularidade. Dietas especializadas ganharão e perderão popularidade. O que não muda é o pano de fundo do sistema de mercado que gerará todos esses fenômenos. É um pano de fundo que nenhum ser humano é capaz de controlar e compreender totalmente.

Deixe de ficar procurando sob a luz do poste por políticos que prometem resolver problemas. O ganhador do Prêmio Nobel F. A. Hayek, em seu capítulo clássico “O cosmos e os táxis”, no volume 1 de Law, Legislation and Liberty [Lei, legislação e liberdade], nos mostra um caminho diferente. Boa parte da cooperação para a qual não damos o devido valor na vida é um fenômeno espontâneo que não pode ser controlado por nenhum indivíduo nem por nenhum grupo.

Como escrevi em meu texto “Melhor do que a autoestima é a estima pela realidade”:

Hayek joga um balde de água fria sobre a forma como nosso ego compreende a realidade. Não estamos no controle de nada. Não podemos entender totalmente o milagre da ordem sem planejamento que dá origem à vida moderna. Hayek nos ensina que a ordem espontânea tem um “grau de complexidade” que “não está limitada ao que a mente humana é capaz de entender”. Muitos não conseguem conceber a ordem surgindo a partir de bilhões de ações diárias de indivíduos sem a coordenação de um cérebro central.

Enquanto o “pastel de vento” não virar a dieta da moda, as pessoas continuarão procurando sob a luz do poste por um político que prometerá salvá-las. Antes que seja tarde demais, celebre os milagres do mundo moderno construído por um processo de descoberta mercadológica. Admire a ordem intangível próxima, que estimula a cooperação humana e que permitiu que os seres humanos tirassem bilhões de pessoas da pobreza num intervalo incrivelmente curto de tempo.

*Barry Brownstein é professor emérito de Economia na Universidade de Baltimore.

Tradução de Paulo Polzonoff Jr.

© 2019 FEE. Publicado com permissão. Original em inglês.

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