Tendências e pautas de direita ao redor do mundo são o campo de atuação de Steve Bannon, ex-estrategista de Donald Trump e um dos responsáveis pela retórica nacionalista que fez o republicano chegar à Casa Branca. A iniciativa começou na Europa, onde Bannon criou o que chama de “Movimento” e posou ao lado de Marine Le Pen, na França, e Matteo Salvini, na Itália. Agora, passada a eleição europeia, Bannon elege um novo foco: a China, considerada a “maior ameaça econômica e de segurança nacional que os EUA já enfrentaram”.
Além da eleição de Trump e do site Breitbart, Bannon também foi conselheiro da Cambridge Analytica, consultoria acusada de fornecer dados de milhões de usuários do Facebook para influenciar as eleições presidenciais americanas de 2016. Desde que foi mandado embora da Casa Branca, em 2017, ele perdeu parte do prestígio nos EUA e Trump chegou a dizer que o ex-assessor “perdeu a cabeça”.
Agora, Bannon se concentra em agitar uma onda nacionalista de direita fora dos EUA, fomentando o que outros conservadores chamam de guerra cultural nos campos ideológico e político.
A dedicação ao Movimento é parte do cotidiano de Bannon: o americano passa o dia em reuniões, palestras e jantares com integrantes ou interessados. Quando está em Washington, os primeiros compromissos na “embaixada Breitbart”, como chama a casa onde vive, começam antes das 7 horas - e os últimos convidados chegam por volta das 21 horas.
Ideias
Bannon aposta no populismo como o futuro da política, seja de direita ou de esquerda. “É muito simples para esses políticos: você é um populista eleito, foi eleito com apoio popular. Só mantenha as promessas que fez às pessoas e estará bem”, afirma.
“A diferença entre populismo de esquerda ou de direita é sobre intervenção do Estado. Mais intervenção do Estado na economia, nas nossas vidas, leva a um completo fracasso. O populismo de direita que foca na classe trabalhadora e classe média é o futuro”, continua Bannon, que ressalta que a agenda nacionalista pode ser feita sem a intervenção do Estado – ponto que destaca o populismo de direita, que foca no nacionalismo, colocando o país “em primeiro lugar”.
A onda de eleições de presidentes conservadores é uma prova do sucesso deste modelo, de acordo com Bannon. Para ele, Donald Trump, Matteo Salvini e Jair Bolsonaro se conectam com a classe trabalhadora “de uma forma visceral”. “É por isso que penso que o capitão Jair Bolsonaro é uma figura histórica não só para o Brasil. É emblemático o que pode fazer no restante do mundo”, diz.
Braços pelo mundo
Na América do Sul, O Movimento é liderado pelo deputado Eduardo Bolsonaro. O começo da atuação na América Latina, segundo Bannon, ocorreu com a conferência de Eduardo Bolsonaro nos Estados Unidos em novembro de 2018.
“Estou muito orgulhoso de me juntar ao Steve Bannon como líder do ‘The Movement’ no Brasil, representando nações Latino-Americanas. Trabalharemos junto com ele pra reconquistar a soberania tomada pelas forças da elite global e expandir o nacionalismo para todos os cidadãos da América Latina,” anunciou o deputado.
“Vamos restaurar a dignidade, liberdade, e oportunidade econômica à nossa grande pátria e nossos vizinhos. Vamos caminhar nessa missão de unir as forças nacionalistas. O trabalho do Senhor Bannon na Europa é vital e apoiaremos sua campanha contra o perigoso Pacto Global de Migração. Poderemos fazer mais unindo forças para promover a prosperidade e nossa cultura ocidental,” complementou.
Bannon anunciou uma conferência de populistas na América do Sul, ainda no segundo semestre de 2019, “provavelmente no Brasil”. O objetivo é reunir todos os agentes ligados ao Movimento na região.
“Eventualmente, esperamos alcançar cidadãos em todas as nações que se sentem abandonados pela ordem mundial globalista e querem que seus governos reinstituam a soberania”, disse Mischaël Modrikamen, advogado belga e sócio de Bannon no Movimento.
Ações
No início de 2019 Bannon anunciou a criação de uma “escola de gladiadores”, um centro de formação religiosa filosófica, voltada ao conservadorismo populista. A escola já ganhou sede: um mosteiro do século 13 no topo das montanhas de uma comuna italiana. A “Academia Ocidental Judaico-Cristã” quer atrair financiamento de doadores privados para formar jovens “gladiadores”, como define o americano. O parceiro de Bannon é Benjamin Harnwell e a ideia seria começar com cursos curtos de verão para depois lançar programas de especialização.
“Estamos fazendo entrevistas com o possível corpo docente”, disse Bannon. O jornal Financial Times revelou que moradores da região protestaram contra a instalação da escola e entendem que é preciso levantar uma bandeira antifascista contra radicais.
Bannon anunciou que um dos professores convidados seria o escritor brasileiro Olavo de Carvalho, quem conheceu em janeiro e reencontrou em março, com a ida de Bolsonaro a Washington.
“A história mostrará que ele é um dos grandes conservadores e filósofos. O que ele faz no Brasil, sua obra, está cada vez mais conhecidos nesse movimento”, diz Bannon. “Acho que ele será mais e mais conhecido a cada ano, não só para o Brasil, mas para o entendimento desse movimento em uma perspectiva mundial”, completa.
Antes mesmo de começar as atividades, o projeto está sendo impedido pelo Ministério da Cultura da Itália devido a “violações de várias obrigações contratuais”. Especula-se que a violação seja o fracasso da organização de Bannon em empreender a prometida restauração do monastério em ruínas, que possui um labirinto, um moinho de água, celas de monges e uma farmácia centenária – a concessão foi concedida ainda em 2018 ao Instituto Dignitatis Humanae, uma associação católica conservadora fundada pelo já citado Benjamin Harnwell.
Além disso, alega-se que um documento de aprovação do plano de negócios para o desenvolvimento do mosteiro era falso. Segundo Harnwell, as alegações são um complô da “extrema esquerda” para desacreditar o projeto e Bannon.
“Por que nos daríamos ao trabalho de falsificar uma carta dessas que poderíamos facilmente pedir a qualquer banco para fornecer? Simplesmente não faz sentido”, afirma Harnwell. [3] “O Instituto Dignitatis Humanae contestará essa manobra ilegítima com todos os recursos à sua disposição, não importa quantos anos leve. E nós venceremos”, continua.
Contraponto
O otimismo de Bannon com O Movimento, por outro lado, pode ser a causa de sua ruína. Mischaël Modrikamen disse que reduziu seus planos originais para o projeto. Além disso, céticos na Europa afirmaram que seu entusiasmo por Bannon diminuiu e, na verdade, eles não estão mais interessados em trabalhar com ele.
“Bannon tem sido um pouco otimista demais com o que conseguimos alcançar”, disse Modrikamen, que lançou o Parti Populaire, na Bélgica, em 2009, e participou da fundação do Movimento em 2016.
Seus planos na Europa são dificultados por barreiras legais, que o impedem de fazer campanha política e divulgar análise eleitoral nos países, além do descrédito por parte dos políticos locais, que preferem não se associar a uma figura que não é da Europa.
Os partidos de direita que Bannon e Modrikamen abordaram na Suécia, Finlândia, Dinamarca, Polônia, Áustria e Alemanha indicaram que não iriam participar do Movimento. Depois de se encontrar com Bannon em Praga, o presidente populista da República Tcheca, Miloš Zeman, não demonstrou disposição em participar do projeto. “Ele pediu uma audiência, conseguiu 30 minutos, e depois de 30 minutos disse a ele que eu discordo de suas opiniões. E então acabei com o encontro”, contou.
Procurado pela Gazeta do Povo, “O Movimento” não respondeu aos questionamentos até o fechamento desta reportagem.