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Luís Carlos Prestes durante julgamento, em 1937, após a malfadada Intentona Comunista. | Reprodução
Luís Carlos Prestes durante julgamento, em 1937, após a malfadada Intentona Comunista.| Foto: Reprodução

Os motivos não ficaram muito claros, mas o general Villas Boas, o comandante do Exército, resolveu reabrir os arquivos a respeito da Intentona Comunista — o Exército, por meio de sua assessoria de imprensa, afirmou não ter mais informações. “Determinei ao @exercitooficial que rememorem a Intentona Comunista ocorrida há 83 anos (27 Nov 1935)”, ele postou em sua conta no Twitter, no último domingo.

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“Antecedentes, fatos e consequências serão apreciados para que não tenhamos nunca mais, irmãos contra irmãos vertendo sangue verde e amarelo em nome de uma ideologia diversionista”. 

Mas o que foi, afinal, a Intentona Comunista? 

A palavra “intentona” significa “ataque imprevisto”, “projeto insensato”. Foi assim que o movimento foi batizado, pejorativamente, pelas forças do governo. O “comunista” é bem literal e óbvio: os participantes do “ataque imprevisto” eram, em geral, alinhados ao comunismo e pretendiam tomar o poder. 

O mais curioso é que, por mais que os militares em geral tenham sua imagem ligada a movimentos políticos de direita, este movimento, realizado no ano de 1935, foi levado adiante por um grupo de homens fardados e de esquerda. Seu principal líder era um ex-tenente que vivia no Brasil ilegalmente: Luís Carlos Prestes.  

“Todo o poder à ANL!” 

A Intentona foi um movimento militar. Começou dentro de quarteis de três estados, Rio Grande do Norte, Pernambuco e Rio de Janeiro. Os revoltados pegaram em armas para reagir a uma decisão do presidente Getúlio Vargas, que havia colocado na ilegalidade a Aliança Nacional Libertadora (ANL), um consórcio de partidos políticos de esquerda. 

Prestes era um de seus principais líderes, desde que havia voltado escondido para o Rio de Janeiro, em dezembro de 1934, quando retornara de um período de três anos vivendo na União Soviética

A ANL havia sido formada em março de 1935 por lideranças principalmente do Partido Comunista do Brasil, que naquele momento estava na ilegalidade. Um de seus porta-vozes, curiosamente, era Carlos Lacerda, que depois se tornaria anticomunista ferrenho e um dos principais defensores civis do golpe militar de 1964.

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Dentro dos quarteis, Agildo Barata Ribeiro era um dos principais expoentes da ANL. Colega de turma do futuro presidente militar Ernesto Geisel, Agildo participou da Revolução Constitucionalista de 1932, e por isso passou dois anos no exílio em Portugal. Na volta, foi colocado no 3º Regimento de Infantaria na Praia Vermelha, no Rio de Janeiro. Ali, teria um papel expressivo na sublevação. 

Em 5 de julho de 1935, Carlos Lacerda leu um discurso, escrito por Prestes, em celebração ao aniversário do movimento tenentista, um levante de militares de baixa patente que, em 1922, havia se sublevado em busca de mudanças na estrutura política do Brasil. 

O texto declarava: “Abaixo o fascismo! Abaixo o governo odioso de Vargas! Por um governo popular nacional revolucionário! Todo o poder à ANL!” 

Apenas seis dias depois, apoiado na Lei de Segurança Nacional, o presidente Vargas colocou a ANL na ilegalidade. A reação foi violenta. Começou em Natal (RN).  

Três dias de comunismo 

Na noite de 23 de novembro de 1935, um sábado, o sargento Quintino Clementino de Barros liderou um grupo de militares rebeldes. Eles precisaram de poucas horas para ocupar a estação ferroviária, as centrais de telefone e de telégrafo e o palácio do governo – o governador se refugiou, primeiro na casa do cônsul do Chile, depois numa embarcação francesa ancorada na cidade. 

Na manhã de 24 de novembro, os comunistas estavam no poder. Um Comitê Popular Revolucionário, formado por seis integrantes do movimento, decretou a destituição do governador e a dissolução da Assembleia Legislativa. Também instaurou a gratuidade para o uso dos bondes. 

As pessoas foram às ruas. Saquearam um depósito militar e passaram a andar com roupas de militares. Enquanto isso, o movimento seguia para o interior. Chegou a tomar 17 cidades do estado.

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Na terça-feira, começou a reação: tropas vindas da Paraíba e de Pernambuco começaram a se encaminhar na direção de Natal. Os boatos de que a capital potiguar seria bombardeada foram suficientes para que as principais lideranças fugissem. Na quarta-feira, a situação estava novamente controlada e o governador Rafael Fernandes, recolocado no posto. 

Natal havia sido uma cidade comunista por apenas três dias. 

Simultaneamente, no dia 24 de novembro, em Recife, o 29º Batalhão de Caçadores era tomado pela ANL. Os militantes seguiram pelas ruas até o Largo da Paz, onde começou um confronto que durou 24 horas. Um grupo formado por sindicalistas e civis tentou tomar a cidade de Olinda, mas não conseguiu. 

Enquanto isso, Prestes tentava aproveitar o momento para mobilizar revoltas simultâneas no Rio de Janeiro, no Rio Grande do Sul e em Minas Gerais. As cartas que enviou para os aliados mineiros e gaúchos nunca chegaram ao destino. Mas o grupo carioca pegou em armas.

No dia 26, o 3° Regimento de Infantaria da Praia Vermelha, de Agildo Barata Ribeiro, se sublevou, assim como o 2º Regimento de Infantaria e no Batalhão de Comunicações, na Vila Militar. 

Os rebeldes do Rio também tentaram tomar, sem sucesso, a Escola de Aviação, no Campo dos Afonsos, com o objetivo de ter acesso a aviões de guerra. Eles chegaram a ter acesso a alguns aviões, mas os militares fiéis ao governo bombardearam a pista a fim de inviabilizar decolagens. 

Dúvidas antigas 

Os manifestantes acabaram presos. Muitos foram torturados, até que o paradeiro de Luís Carlos Prestes viesse à tona. Foi por consequência da Intentona Comunista, portanto, que Prestes seria localizado e preso, assim como sua esposa, Olga Benário. Olga morreria num campo de concentração na Alemanha, sua terra natal. Prestes seria libertado em abril de 1945. Foi o secretário-geral do Partido Comunista do Brasil até 1980. 

Independentemente das motivações da curiosidade do general Villas Boas a respeito do episódio, que faz aniversário em novembro, o fato é que a Intentona deixou dúvidas até hoje não inteiramente resolvidas.

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Não se sabe, ainda hoje, o total exato de mortos em decorrência do incidente. Nem qual era o tamanho da influência do movimento comunista internacional dentro da ANL — Prestes estava acompanhado por lideranças indicadas por Moscou, como o alemão Artur Ernst Ewert, o argentino Rodolfo Ghioldi e o ucraniano Pavel Stuchevski, mas a influência exata do grupo sobre os demais líderes do levante ainda é discutida. 

O que se sabe é que o grupo foi dissolvido depois da Intentona. E que o incidente fortaleceria a posição do presidente Getúlio Vargas: o Congresso Nacional declarou estado de sítio e, na sequência, milhares de pessoas foram presas, em todo o país, incluindo políticos de oposição — o escritor Graciliano Ramos, por exemplo, seria detido em março de 1936. 

Em 1937, Vargas se valeria de uma ameaça comunista, desta vez falsa, para dar um golpe e instaurar o Estado Novo.

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