Eduardo I, rei da Inglaterra, sobreviveu por pouco ao envenenamento da lâmina de um Assassino| Foto: Wikipedia
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Era fácil reconhecer os Assassinos quando eles não estavam em missão. Eles se cobriam com vestes brancas e cordões vermelhos na cintura. Moravam em castelos dispersos em diferentes regiões dos atuais Irã e Síria. Organizavam-se seguindo uma hierarquia rígida, que definia funções claras. Acreditavam que sua missão era garantir a pureza do Islã. Líderes que eles considerassem corrompidos eram alvos de ataques.

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Agora, quando um alvo era definido, tornava-se praticamente impossível reconhecer um Assassino. Camuflados, misturados com os moradores de rua, caminhando de forma discreta e protegidos pela multidão, eles se tornavam invisíveis. Até que recebiam a ordem de agir. E então se aproximavam da vítima, portando uma adaga. Cumprida a missão, não cometiam suicídio. Tampouco fugiam. Esperavam pela prisão e pela morte na mão dos inimigos. E assim, segundo a crença do grupo a que pertenciam, garantiam a felicidade no Paraíso.

Influência de haxixe 

Reza a lenda que eles ingeriam haxixe antes de cometer o homicídio – em suas memórias, o explorador Marco Polo relataria que, dentro dos castelos, os jovens também recebiam drogas alucinógenas e bebidas, além de acesso a mulheres, para ter um vislumbre do que os esperaria caso cumprissem a tarefa que, a seu tempo, acabariam por receber.

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“O nome hashishiyya, com sua conotação de ‘o que consome haxixe’, foi dado a eles por seus inimigos muçulmanos. Chamavam-se a si mesmos fidayeen, do árabe fida’i – aquele que está pronto a sacrificar sua vida pela causa”, detalha o historiador britânico Bernard Lewis no livro 'A crise do Islã: Guerra santa e terror profano'.

Repetido ao longo do tempo, “hashishiyya” acabaria por derivar, na Europa, para o vocábulo equivalente de “Assassino”. De forma que a ação da seita dos Assassinos acabou por inspirar a origem da própria palavra que detona uma pessoa que tira a vida de outra, com cálculo e frieza. Como define Lewis, “parecem ter sido os primeiros a transformar o ato que lhes deu nome em um sistema e uma ideologia”.

A seita se manteve ativa e poderosa entre os anos de 1090 e 1275. E deixou marcas na cultura popular contemporânea. Os Assassinos inspiram desde o jogo Assassin's Creed até 'Baudolino', novela de Umberto Eco. Os Homens Sem Rosto, uma sociedade religiosa fictícia descrita em 'A Guerra dos Tronos', de George R. R. Martin, são inspirados nesta história real, que também deixa marcas em 'Anjos e Demônios', de Dan Brown.

Mas, acima de tudo, os Assassinos foram influentes. “São os verdadeiros predecessores de muitos dos chamados terroristas islâmicos de hoje, alguns dos quais explicitamente destacam esse ponto”, aponta Lewis. “O termo reapareceu no Irã, nos chamados Fida’i yan-i islã, os fida’is do islã, grupo terrorista político-religioso de Teerã que, entre 1943, quando começou suas atividades, e 1955, quando foi extinto, levou a cabo um grande número de assassinatos políticos”. A ala militante da Organização para a Libertação da Palestina também cita a seita como influência.

Clima de terror 

Os Assassinos faziam parte de uma organização ismaelita (uma seita xiita surgida no século 8) chamada nizari e fundada por Hasan-i Sabbah (1050-1124), um pesquisador de matemática, geometria e astronomia. Marco Polo se referia a Sabbah como O Ancião da Montanha, já que ele havia tomado para si e adotado como base o castelo de Alamut, instalado em uma área montanhosa de mais de 2.100 metros de altitude e a 100 quilômetros de Teerã.

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Nascido em Qom, atual Irã, ele se tornou um devoto fanático logo aos 17 anos. Depois de uma temporada de estudos religiosos no Egito, decidiu fazer um esforço missionário, que incluía também as vias militares. Para tomar Alamut, enviou seguidores para dominar cada uma das vilas do entorno, um esforço que durou dois anos. Passaria 45 anos instalado ali, fortalecendo os nizaris e formando e treinando seu braço de Assassinos, além de outros grupos importantes para a sobrevivência da seita, como um ramo de missionários que atuava, principalmente, no atual norte da Síria.

Os líderes que o sucederam depois de sua morte mantiveram o castelo como uma espécie de capital. As incursões para matar começaram a ser realizadas logo no início das atividades da seita. Uma das primeiras vítimas foi o vizir de Bagdá, Nizam al-Mulk, morto em 1092. Assim como ele, os alvos, em geral, eram muçulmanos sunitas. O objetivo final era derrotá-los, utilizando os assassinatos para enfraquecer suas lideranças.

Estima-se que, no auge, a ordem chegou a reunir mais de 60 mil pessoas. A parte do grupo dedicada a matar costumava receber treinamento desde a infância. Suas ações geraram pavor no Oriente Médio por quase dois séculos. O sultão – e sunita – Saladino foi alvo de duas tentativas frustradas de ataques. Foi um caso raro: em geral, as ações eram bem sucedidas. Nunca se sabia quando os Assassinos atacariam, o que dificultava o trabalho de proteger quem se opunha à visão de mundo dos nizaris.

Líderes de outras denominações religiosas não costumavam ser atacados, a não ser quando suas ações interferiam no jogo religioso e geopolítico local. Foi o caso de Conrado de Monferrato (1140-1192), nobre italiano que representou um papel importante na Terceira Cruzada e foi morto poucos dias depois de se tornar rei de Jerusalém.

“Havia um planejamento cauteloso, assim como um zelo fanático, no trabalho dos Assassinos. Vários princípios são discerníveis”, descreve novamente Bernard Lewis, agora em 'The Assassins', um livro dedicado exclusivamente a descrever a trajetória dos nizaris. “A tomada de castelos – alguns deles antigos covis de chefes ladrões – proporcionou-lhes bases seguras; a regra do sigilo ajudou tanto a segurança como a solidariedade. O trabalho dos terroristas foi apoiado por ações religiosas e políticas. Os missionários ismaelitas encontraram ou ganharam simpatizantes entre a população rural e urbana. Os enviados ismaelitas apelaram aos muçulmanos de alto escalão, cujos receios ou ambições poderiam torná-los aliados temporários da causa”.

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Fim violento 

Ao final do século 13, os mongóis acabariam por eliminar o grupo – não sem sofrer perdas importantes entre comandantes militares que foram mortos a golpes de adaga durante suas campanhas de conquista. Hulagu Khan (1217-1265) não parou enquanto não tomou os castelos nizaris, um a um. Poucos sobreviviam às ocupações. Era o fim dos Assassinos.

Ficou o legado, que permanece entre os grupos terroristas que formam jovens dispostos a matar e morrer para garantir um espaço no Paraíso.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]