Em sua viagem a Cuba, nesta sexta-feira (15), Lula encontrará ainda mais opressão e pobreza do que da última vez que esteve na ilha, em 2020. Antes de ir para a Assembleia Geral da ONU, em Nova York, o petista tem uma agenda confirmada em Havana, no dia 16 deste mês, com o ditador Miguel Diaz-Canel, onde também participa da Cúpula do G77 – grupo que conta hoje com 134 países do chamado Sul Global, grande parte deles não considerados democracias. No tour pelo país, Lula poderá contemplar uma Cuba tão repressiva quanto a dos primeiros anos do castrismo, com a população sofrendo pela escassez de itens básicos, como energia, alimentos e remédios.
Após os protestos de julho de 2021, que reuniram milhares de cubanos nas ruas contra a situação política e econômica do país, o regime apertou ainda mais o cerco às liberdades individuais e de expressão no território. Somente nos sete primeiros meses de 2023, o número de presos políticos triplicou na ilha, segundo a ONG Prisioners Defenders. Foi uma média mensal de 17 presos, três vezes mais do que o que se costumava registrar entre 2018 e meados de 2021.
A maioria dos 1.047 presos políticos cubanos são civis, sem filiação a movimentos políticos. A ONG também denuncia que cidadãos detidos por manifestações contra o regime recebem sentenças judiciais ou têm a liberdade limitada por promotores, sem direito à defesa, o que fere o direito ao devido processo legal. Pessoas que professam alguma religião também relatam que perseguições, ameaças e cerceamento à liberdade de culto estão em alta no país.
Torturas e assassinatos
As táticas de intimidação da ditadura de Miguel Díaz-Canel incluem violações de direitos humanos como a recente convocação de uma menina de três anos de idade para depor no caso do pai, Idael Naranjo, condenado a dez anos de prisão por ter participado dos protestos de 11 de julho de 2021.
Às prisões arbitrárias, somam-se outras ações repressivas, como ameaças, agressões, multas, proibições de viagens ao exterior, além de idosos e doentes em extrema pobreza sendo privados de assistência adequada. De acordo com o Observatório Cubano de Direitos Humanos (OCDH), somente em julho ocorreram 338 ações de repressão contra a população civil.
Embora Cuba alegue não aplicar há duas décadas a pena de morte prevista no Código Penal desde a revoução, observadores de direitos humanos apontam que a afirmação é falaciosa e que a morte misteriosa de opositores da ditadura segue ocorrendo. Segundo a ONG Cuba Archive, desde 2021, o país teve cerca de 21 assassinatos extrajudiciais. De 1959 para cá, foram mais de 4 mil execuções, sendo 3 mil delas sem o devido processo legal.
Jornalistas e ativistas
Um dos relatórios mais recentes sobre os direitos humanos na ilha, publicado no fim de agosto pela organização Artigo 19, que defende a liberdade de expressão, também mostra uma rotina de agressões do regime contra jornalistas independentes e ativistas no primeiro semestre de 2023. Segundo o documento, foram 41 casos de agressões a jornalistas e 47 a ativistas cubanos no período, a maior parte registrada na capital, Havana. Entre os perpetradores estão estatais, como o Departamento de Segurança do Estado (DSE), a Polícia Nacional Revolucionária (PNR), a Empresa de Telecomunicações Etecsa, as Forças Armadas Revolucionárias (FAR), o Ministério do Interior (Minint) e o Escritório Provincial do Partido (BPP). “Os ataques com o objetivo de inibir e limitar o trabalho investigativo, jornalístico e de ativismo na ilha são realizados pelo Estado de maneira sistemática”, afirma o relatório.
Fome e crise na saúde
Com uma inflação no mercado informal estimada em 500%, os cubanos amargam uma severa escassez de alimentos, medicamentos e combustíveis, nos últimos anos. Recentemente, camponeses da província de Guantánamo denunciaram a falta de insumos, como fertilizantes, para a produção de alimentos e o atraso no pagamento de safras, enquanto o regime exige produtividade. A situação de insegurança alimentar tem levado comerciantes a denunciarem o aumento de furtos de alimentos básicos, como arroz, açúcar, grãos em geral e carne. Com uma cesta básica que garante a subsistência das famílias por no máximo dez dias no mês, estima-se que apenas metade da população do país se alimente de forma adequada.
Já a escassez de energia, que tem gerado filas em postos de combustíveis nos últimos meses, também afeta indústrias locais e o transporte na ilha, além do fornecimento de serviços básicos, como água potável e eletricidade.
Nos últimos meses, a ilha também padece de um sério déficit de 250 medicamentos – aproximadamente 40% da tabela total –, graças à paralisação de fábricas produtoras de remédios, após problemas nos maquinários, além da dificuldade na aquisição de matérias-primas. O problema afeta de forma especial os aposentados, que são os mais dependentes desse tipo de item e não conseguem acessar o mercado paralelo, com seus cerca de 10 dólares por mês.
Escassez de dinheiro
Em agosto, o vice-presidente do Banco Central de Cuba (BCC), Alberto Quiñones Betancourt, afirmou em um programa televisivo que a escassez de dinheiro é “crítica” no país. Isso porque o regime iniciou um processo de bancarização das operações financeiras, o que reduziu as cédulas em circulação na ilha. Como a maior parte da população usa dinheiro em espécie, em decorrência das limitações tecnológicas, muitas pessoas acabaram sem recursos para o próprio sustento. A falta de saldo no BCC resultou em mais de seis mil trabalhadores sem salário na província de Guantánamo, em julho.
Falta de professores
Nesta segunda-feira (4), o ano letivo se inicia em Cuba, mas a falta de docentes, sobretudo nas províncias de Havana, Sancti Spíritus, Mayabeque e Matanzas preocupa o regime, e a solução encontrada tem sido “importar” professores de outras regiões para suprir as mais carentes de profissionais. A escassez de professores está ligada aos baixos salários do setor educacional e ao crescente fluxo de pessoas tentando fugir da ditadura para outros países.