Em nosso conflito atual com a China, uma batalha importante parece ter sido vencida pelo adversário: a batalha pelas artes e pelo entretenimento.
Com uma população de 1,4 bilhão de pessoas, muitas das quais com meios financeiros para pagar e consumir toda sorte de entretenimento, a China hoje concorre diretamente com o país que produz programas de televisão, filmes e obras de arte, os Estados Unidos.
Com um governo poderoso e que não hesita em restringir a imprensa e as mensagens que os cidadãos consomem, a China é capaz de reduzir o faturamento de um filme pela metade, de diminuir a audiência dos programas de TV e de negar totalmente às celebridades e artistas qualquer forma de notoriedade no país.
O impacto chinês sobre os filmes norte-americanos é enorme, mas muito sutil – tão sutil que passaria despercebido pelo público, não fossem alguns espectadores com olhos de águia.
Esse estilo de influência se manifesta na omissão ou alterações sutis do conteúdo, e não numa mensagem clara e inequívoca. Um exemplo disso ocorreu em 2021, quando a aguardada sequência do filme “Top Gun: Ases Indomáveis”, intitulada “Top Gun: Maverick”, gerou revolta dentro dos Estados Unidos depois que o trailer revelou que a jaqueta de couro usada por Tom Cruise no filme, a mesma que ele usou na produção de 1986, teve as bandeiras do Japão e de Taiwan substituídas por símbolos aleatórios.
Isso não teria importância se a jaqueta não fosse idêntica à do filme original. O fato de as bandeiras desses países terem sido substituídas é uma demonstração inequívoca da coerção chinesa. Essa conclusão vale sobretudo quando se considera os conflitos que a China tem com os dois países.
Um dos casos mais constrangedores de uma celebridade cedendo à pressão chinesa foi o do ator John Cena, durante uma entrevista de promoção do filme “Velozes e Furiosos 9”. A mera sugestão de que Taiwan pudesse ser um país independente foi demais para a China, o que colocou Cena numa encruzilhada. O que ele fizesse poderia lhe custar a carreira e reputação.
Inevitavelmente, o ator optou pela saída mais fácil, constrangedoramente se dizendo um simpatizante da China e mostrando que se importa mais com o dinheiro chinês do que com o aliado dos Estados Unidos, Taiwan.
Os filmes da série “Velozes e Furiosos” faturaram duas vezes mais na China do que nos Estados Unidos. Claro que o estúdio pressionou Cena para que ele pedisse desculpas. Ele o fez em mandarim, num vídeo no qual implorava perdão por seu “erro”. “Eu cometi um erro. Sinto muito, muito mesmo por esse erro. Desculpe. Sinto muito. Vocês têm que entender que amo e respeito a China e o povo chinês. Desculpe”, disse ele.
Como resultado dessa controvérsia, Cena virou piada na Internet. Chamado de “John Xina”, ´é possível encontrar montagens dele como se fosse Mao Tsé-tung. Como se isso não bastasse, Lady Gaga foi impedida de se apresentar na China por ter visitado o Dalai Lama em 2016. Brad Pitt foi banido por quase 20 anos por ter estrelado o filme “Sete Anos no Tibet”.
Recentemente, Keanu Reeves teve problemas com os censores chineses por ter ido a um concerto beneficente em prol do Tibet.
Esses são apenas alguns exemplos da censura do governo chinês a grandes artistas, muitos dos quais famosos e outros tantos não tão famosos. O principal problema é que o sistema econômico chinês serve a um objetivo duplo: ele emprega uma espécie de capitalismo de Estado que estimula o crescimento industrial por meio de investimentos privados e ao mesmo tempo o governo orwelliano mantém a vigilância, à espera de que esses empreendimentos sejam bem-sucedidos para que eles possam se aproveitar dos lucros por meio de novas tecnologias.
Isso serve tanto para o mundo do entretenimento quanto para o setor de tecnologia, uma vez que a influência do governo chinês invade os domínios de ambos. O governo chinês, por exemplo, obrigou o WeChat, rede social popular na China, com mais de 1 bilhão de usuários, a fornecer todos os dados dos usuários a fim de que o governo possa monitorá-los melhor.
O WeChat não existiria sem investimento privado e não estaria fazendo mau uso dos dados dos usuários não fosse pelo governo.
A verdade termina onde começa a censura. Isso serve para muitos aspectos da vida, incluindo as artes, redes sociais e espaços públicos. Quando alguém é silenciado, as ideias não se desenvolvem e, consequentemente, a verdade jamais se revela.
Para um governo que busca manter o controle sobre o cotidiano dos cidadãos, a censura é um instrumento eficiente, porque convence os cidadãos a acreditarem no que o Estado quer. Mas haverá um dia em que as pessoas se importarão mais com os ideais de liberdade do que com o entretenimento que consomem.
Quando essa hora chegar, a escolha entre a censura e a liberdade se materializará e os estúdios norte-americanos terão de decidir qual mercado preferem.
Armstrong Williams é colunista do “Daily Signal” e apresentador do programa "The Armstrong Williams Show".