A atriz Noomi Rapace em cena de “Onde Está Segunda?”: tirania cientificista| Foto: Divulgação
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Em um mundo cada vez mais complexo e imprevisível, criar uma distopia que pareça distópica de fato tem se tornado uma tarefa desafiadora para os cineastas. Neste sentido, os roteiristas de “Onde Está Segunda”, filme lançado em 2017 e atualmente disponível no Netflix, fizeram um bom trabalho.

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A história se passa em 2073, décadas depois de, para reduzir as consequências dramáticas do aumento populacional no planeta, cientistas terem convencido a Europa a implementar, a força, uma política de filho único.

Ao mesmo tempo, por causa de alimentos geneticamente modificados desenvolvidos para reduzir a escassez de comida no globo, gestações múltiplas se tornaram mais comuns. O filme conta a história de sete irmãs que, logo após o nascimento, foram salvas pelo avô e escaparam do “crio-sono”, uma espécie de criogenia forçada e sem prazo de validade.

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O avô (interpretado por Willem Dafoe) resolveu burlar as regras rígidas do sistema e conseguiu criar as sete meninas escondidas, por meio de um método engenhoso: cada uma das sete irmãs só pode sair de cada um dia por semana -- o dia com cujo nome elas foram batizadas. Para os registros oficiais, apenas uma criança existe. Manter a farsa exige que elas se revezem na escola e, mais tarde, no trabalho. O esquema funciona bem até que um dia, sem deixar pistas, Segunda não volta para casa ao fim do expediente. Com medo, as irmãs armam um plano para tentar recuperá-la sem serem notadas pelos agentes onipresentes da polícia estatal.

Um dos elementos únicos do filme é o fato de as sete irmãs serem interpretadas pela sueca Noomi Rapace, que consegue dar vida às personalidades distintas de cada uma. Com o bom trabalho de edição, o espectador até se esquece de que, na verdade, está diante de uma única atriz exercendo múltiplos papéis.

Embora ofereça reflexões filosóficas sobre a natureza da ditadura dos iluminados (as medidas de filho único são, teoricamente, resultado da aplicação de verdades científicas e fundamentadas em princípios humanísticos), o filme  não economiza nas sequências de ação -- inclusive com certo grau de violência e, ademais, outras cenas pouco recomendáveis para menores de idade.

O espectador não pode ser exigente ao máximo com o realismo nas cenas de perseguição ou com a plausibilidade do enredo como um todo. Com um mote tão rico, talvez fosse possível construir uma narrativa mais cuidadosa e bem-acabada. Ainda assim, o roteiro criativo e engenhosidade na execução fazem o “Onde Está Segunda” valer a audiência. Além de garantir duas horas de diversão, o filme oferece uma boa reflexão sobre o advento da tirania dos esclarecidos, frequentemente escamoteada por argumentos cientificistas.

“Onde Está Segunda” acerta ao mostrar que a predileção por uma vida autêntica, com uma identidade individual e liberdade de escolha, é inerente à nossa natureza. E que nenhuma tirania é capaz de apagar certas verdades da alma humana.

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