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Diane Cutler, uma investigadora que teve acesso a mais de 50 mil documentos relativos à concessão de fundos para pesquisa do governo americano, suspeita que houve duplo pagamento para suprimentos médicos, equipamentos, viagens e salários utilizados para pesquisa com coronavírus em Wuhan, na China. A intermediária de verbas para o Instituto de Virologia de Wuhan (IVW), a partir dos Institutos Nacionais de Saúde (NIH) e a Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID), foi a EcoHealth Alliance, antiga ONG ambientalista transformada em notável da virologia pelo cientista Peter Daszak. Essas pesquisas poderiam estar por trás da manipulação genética e vazamento laboratorial acidental na origem do vírus da Covid-19.
“O que encontrei até agora são evidências que apontam para a cobrança dupla, um roubo em potencial de verbas do governo. É preocupante, especialmente por envolver patógenos perigosos e pesquisa de risco”, disse Cutler à CBS News. Ela tem experiência de mais de 20 anos de inquéritos para o governo americano em crimes de colarinho branco e fraude no sistema de saúde. Nessa investigação, atuou a serviço do senador republicano Roger Marshall, do Kansas. O canal de notícias americano teve acesso aos documentos para confirmação e declarou que “fontes que são familiarizadas com os registros das verbas não contestaram” as suspeitas. Dezenas de milhões de dólares podem ter sido desviados.
O senador Marshall disse em nota na segunda-feira (13) que “perdemos tragicamente 1,1 milhão de americanos para a pandemia de Covid-19. Precisamos chegar à verdade de como ela começou”. Ele acrescentou que “a investigação em curso segue o dinheiro, incluindo as verbas de pesquisa americanas que passaram pela EcoHealth Alliance (...) para o Instituto de Virologia de Wuhan. As evidências indicam que Peter Daszak pode ter cobrado ao mesmo tempo os NIH e a USAID pelo mesmo trabalho, o que seria fraude”. A USAID reagiu abrindo um inquérito sobre as atividades da EcoHealth no mesmo dia da nota, segundo o senador, mas não quis falar com a imprensa a respeito. A assessoria de imprensa dos NIH também preferiu o silêncio.
Ele também pediu que uma moratória em pesquisa de “ganho de função” (que altera o material genético de vírus, geralmente os tornando mais perigosos) seja instituída. Houve uma moratória anterior, entre os governos Obama e Trump, mas ela tinha uma brecha que permitia que autoridades dos NIH como Anthony Fauci e Francis Collins concedessem fundos para pesquisas do tipo.
Como noticiou a Gazeta do Povo em outubro passado, a ONG teve renovação de uma verba de mais de US$ 650 mil (R$ 3,44 milhões) pelos NIH. O projeto de pesquisa tem como objetivo investigar “o potencial para uma futura emergência de coronavírus de morcego em Myanmar, Laos e Vietnã”. Até o momento, excluindo uma amostra do IVW, o vírus mais aparentado ao SARS-CoV-2 é o Banal-52, encontrado em morcegos no Laos.
Apesar da proximidade do material genético, o parente não tem uma importante estrutura molecular chamada “sítio de clivagem da furina”, presente no coronavírus da Covid, que facilita sua capacidade de infectar humanos. A EcoHealth já atuou no passado coletando vírus de morcego no Laos e pediu à Darpa, agência de fomento de pesquisa do Departamento de Defesa, em 2017, verba para inserir essa exata estrutura no material genético de coronavírus em laboratório. Esse é um dos indícios moleculares que apontam para a possibilidade da origem laboratorial, mas alguns cientistas discordam e dizem que a estrutura pode ter sido adquirida por meios naturais. Não se sabe se a ONG, apesar da recusa da verba, realizou a pesquisa com outros fundos.
Republicanos abrem investigações
Este ano, o Departamento de Energia declarou que a origem da pandemia por vazamento laboratorial é a mais provável, mas deu a essa proposta uma “convicção baixa”. O Departamento Federal de Investigação (FBI) defende o mesmo desde 2021, mas com “convicção moderada”. Agora que a Câmara dos Deputados americana tem uma maioria de republicanos, o tema já começou a ser investigado com mais afinco do que era feito sob domínio democrata no ano passado, antes das eleições de meio de mandato em novembro.
Já foi ouvido pelos parlamentares Robert Redfield, ex-diretor dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças. Em depoimento, ele alegou que foi excluído por Anthony Fauci de conversas sobre a origem do vírus no começo de 2020 por suspeitar do vazamento laboratorial. E-mails descobertos pelos congressistas revelaram que Fauci articulou nos bastidores um artigo científico em uma revista do grupo Nature que negasse a plausibilidade da origem laboratorial, mas agiu como se não soubesse quem eram os autores do artigo em coletiva de imprensa ao lado do então presidente Donald Trump.
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