Pouco mais de um ano após Donald Trump assumir a Casa Branca é possível dizer que houve uma mudança substancial na forma como a América do Sul é vista| Foto: MANDEL NGAN AFP

A importância da América do Sul diminuiu para os Estados Unidos. Pouco mais de um ano após Donald Trump assumir a Casa Branca é possível dizer que houve uma mudança substancial na forma como a região é vista.

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“Passou a ser encarada mais como um espaço para fazer negócios do que um importante parceiro nas relações internacionais, como era considerada na época de Obama”, diz Thiago Gehre Galvão, professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB). 

Um dos desafios de Trump na sua primeira viagem internacional à América do Sul, nos dias 13 e 14, é conter a investida chinesa na região e fortalecer os laços comerciais com os países da região. “Ele vem para marcar um território que foi deixado de lado no final da gestão Obama.” 

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A China tem um forte interesse em matérias-primas para sustentar o seu forte crescimento. O Fundo Monetário Internacional projeta que a segunda maior economia mundial cresça a um ritmo superior a 6% ao ano até 2022. 

Os investimentos são grandes. Dados da Comissão Econômica das Nações Unidas para a América Latina e o Caribe (Cepal) apontam que, no ano passado, os investimentos chineses tinham investido US$ 115 bilhões na região, 47% a mais do que em 2016. 

A maior parte (81%) dos recursos estão direcionados para três países: Argentina, Brasil e Peru. E 80% são direcionados para dois segmentos: mineração e hidrocarbonetos. 

Mesmo no Brasil, a presença chinesa vem crescendo de importância em relação aos Estados Unidos. O país asiático é o principal parceiro comercial brasileiro. Os negócios (exportações e importações) foram de US$ 74,8 bilhões em 2017, segundo a Secretaria de Comércio Exterior (Secex). É um crescimento de 27,9%, comparativamente a 2016. O volume de negócios com os EUA, o segundo parceiro comercial, teve um aumento menor: 10,1%.

Cúpula das Américas

Trump vai estar na Cúpula das Américas, que discutirá a crise da Venezuela. 

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A agenda de Trump prevê uma visita ao Peru, onde participará da Cúpula das Américas, e à Colômbia, um importante aliado americano na região, onde se encontrará com o presidente Juan Manuel Santos. 

Apesar de o tema do encontro dos presidentes estar ligado ao combate à corrupção, um dos temas em discussão será a situação na Venezuela, que passa por uma grave crise econômica e política. Desde 2015, segundo estimativas do FMI, a economia encolheu 31% e a inflação chegou perto dos 13.000%. A escassez toma conta do país do ditador Nicolás Maduro, que estatizou grande parte das empresas. 

O convite para Trump participar da reunião foi feito pelo ex-presidente peruano Pedro Pablo Kuczynski, que renunciou em fevereiro após envolvimento em um escândalo de compra de votos no Legislativo. PPK, como também é conhecido, era um dos líderes do Grupo de Lima - que busca uma saída negociada para a situação venezuelana – e tinha proximidade com dirigentes da oposição daquele país. 

“Dificilmente Trump iria a Lima se não tivesse um convite pessoal de PPK”, diz Ricardo Mendes, sócio da consultoria Prospectiva. Ele lembra que o presidente norte-americano é adepto de uma “diplomacia pessoal”, negligenciando a forma tradicional de os países se relacionarem na esfera internacional. 

Os especialistas apontam que não deve se esperar nenhum resultado concreto da Cúpula, mesmo em relação à Venezuela. O timing não é apropriado para grandes resultados. Países relevantes na região, como o Brasil e a Colômbia, que poderiam ter alguma atuação mais ativa nas discussões estão em processo eleitoral ou pré-eleitoral. 

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Mesmo a presença do presidente americano não anima. “Não vejo como os Estados Unidos poderiam assumir algum compromisso real para com a questão venezuelana”, diz Mendes. 

Galvão acredita que o máximo que pode acontecer em relação à Venezuela na Cúpula de Lima é uma menção, no documento final, à situação naquele país e à necessidade de equilíbrio. “Só teria algo de diferente se o regime de Maduro pedisse.” 

Menos olhares americanos para o Brasil 

Não é só a América do Sul que vem perdendo espaço no radar norte-americano. A mesma situação se aplica ao Brasil. Um dos termômetros é a não inclusão do país no roteiro de Trump. O país também não esteve na agenda de Rex Tillerson, ex-secretário de Estado, que visitou cinco países da América Latina e do Caribe em fevereiro. 

É uma situação completamente diferente de sete anos atrás, quando o Brasil foi visitado por Obama, o antecessor de Trump, em sua primeira viagem à América do Sul. 

Duas razões estão por trás da perda desse espaço: a crise política e a falta de adaptação à nova forma que os Estados Unidos conduzem as suas relações diplomáticas. Trump valoriza muito as relações pessoais. Era interlocutor frequente de Kuczynski e teve parcerias comerciais com a família de Macri, nos anos 80, em Nova York. 

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Segundo Mendes, da Prospectiva, o Brasil tem dificuldades para entender esta nova dinâmica nas relações com os EUA. Trump não tem nenhum relacionamento particular com Temer, apesar de os líderes terem conversado várias vezes. “Assim, fica mais complicado.” 

Thiago Galvão, da UnB, aponta que o contexto político brasileiro, de muita instabilidade, acentua a falta de importância. Esta característica é um fator que também afeta a realização de investimentos. “A Argentina é mais liberal. É um país mais ideal para se confiar e visitar.” 

Uma das implicações da crise política verificada nos últimos anos foi o forte encolhimento da economia brasileira, que atingiu de 6,9%, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 2015 e 2016. O FMI acredita que a economia só retomará os níveis pré-crise após 2020. 

Isto também contribuiu para tirar a relevância do Brasil enquanto parceiro dos Estados Unidos na América Latina. “Não somos uma economia madura. O Brasil também teve um declínio social”, enfatiza Galvão. 

Ele acredita que o “ostracismo” tem prazo para terminar: 1° de janeiro de 2019, quando assume o novo presidente brasileiro. “Haverá uma normalização das relações com os Estados Unidos. Isto vai acontecer independentemente de quem for eleito.” 

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Segundo ele, bem ou mal o Brasil é um país de referência. Conta a favor do Brasil, a dimensão econômica – é a nona maior economia do mundo -, e a política – é o maior país da América Latina.

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