O fóssil de 57 milhões de anos é ao mesmo tempo assustador e cômico: um pinguim com bico comprido, 1,7 metro de altura e cerca de 100 quilos.
"Tinha a altura de um homem de tamanho médio", disse Gerald Mayr, paleontologista do Instituto de Pesquisa Senckenberg em Frankfurt, na Alemanha, e principal autor do artigo que anunciou a descoberta no periódico científico Nature Communicatons.
Em comparação, a maior espécie de pinguim da atualidade, o pinguim-imperador, chega a cerca de 1,22 metro de altura. O fóssil, que foi chamado de Kumimano biceae, era mais alto que o pinguim-imperador e que todos os outros pinguins antigos conhecidos.
(Em 2014, outra equipe de pesquisadores estimou que há 34 milhões de anos uma espécie media cerca 1,83 metro, mas basearam a estimativa em apenas dois fragmentos de ossos. )
Vida fora d’água
O kumimanu não é apenas excepcionalmente grande. Também está entre os fósseis de pinguins mais antigos já encontrados. Sua idade e tamanho fazem dele uma peça importante para entender a transformação da linhagem de um pássaro voador para um nadador que não voa.
As 18 espécies modernas de pinguins, presentes da costa da Antártica até as Ilhas Galápagos, na linha do Equador, são impressionantemente adaptadas à vida aquática. As asas rígidas, em forma de lâmina, permitem que mergulhem a 35 km/h. O recorde humano de nado não chega aos 9 km/h.
Mas as adaptações à água fizeram com que não conseguissem mais voar. Quando os pinguins caminham, apenas se balançam em suas pernas curtas. "São tão diferentes que muitas pessoas nem sabem que são aves", disse Mayr.
Mesmo que os pinguins não se assemelhem a outros pássaros, seu DNA mostra um parentesco próximo a espécies como albatrozes e petréis. Essas aves também voam sobre a água para caçar, dando uma dica de como os antecessores dos pinguins talvez fizessem.
As tordas, que mergulham a até 30 metros, podem ser um modelo atual dos primeiros pinguins.
Os pássaros acumulam mutações no seu DNA a taxas precisas, permitindo aos cientistas estimarem quando suas linhagens se separaram. Estudos sugerem que os pinguins apareceram por volta da época da extinção em massa que ocorreu na Terra há 66 milhões de anos.
Acredita-se que a combinação de massivas erupções vulcânicas e o impacto de um asteroide seja responsável pela catástrofe global. Entre as vítimas, estavam répteis marinhos gigantes e dinossauros (com exceção dos pássaros, que são dinossauros com asas). A extinção em massa marcou o fim da Era Mesozoica e o começo da Cenozoica, que continua até hoje.
O primeiro fóssil de pinguim foi descoberto em 1859, e desde então mais de 50 espécies foram identificadas. A mais velha delas, encontrada na Nova Zelândia, tem cerca de 60 milhões de anos. Chamados de Waimanu, os mais velhos pinguins conhecidos viveram apenas poucos milhões de anos após a extinção em massa.
Bico de cegonha
O novo fóssil de pinguim foi descoberto a partir de ossos que estavam em uma rocha em uma praia da Nova Zelândia. Percebendo que era quase tão antigo quanto o waimanu, Mayr e seus colegas rapidamente estudaram o kumimanu para ter uma imagem melhor das primeiras evoluções dos pinguins.
Para entender as relações com outras espécies, os cientistas desenharam uma árvore evolutiva e descobriram que o kumimanu e o waimanu pertenciam a troncos mais distantes. Suas linhagens foram extintas há dezenas de milhões de anos.
Por outro lado, todas as espécies de pinguins atuais pertencem a um tronco jovem da árvore. Eles têm um antecessor comum que viveu há apenas milhões de anos.
O kumimanu e o waimanu já não voavam, mas ainda apresentavam alguns traços primitivos que não são encontrados nos pinguins de hoje.
"O bico parecia mais o de uma cegonha. Provavelmente, o usavam como um arpão para pescar as presas", disse Mayr.
As asas de pinguins primitivos ainda não eram as lâminas curtas e rígidas dos pinguins de hoje em dia. "Possivelmente, podiam envergá-las um pouco mais do que os pinguins conseguem hoje. Talvez fossem mais flexíveis", disse Mayr.
A diferença entre o waimanu e o kumimanu está na altura. O primeiro tinha apenas 76 centímetros de altura, e o segundo, mais que o dobro dessa altura.
"Já sabíamos que os pinguins estavam por aí, e sem voar, apenas alguns milhões de anos após a extinção", disse Daniel T. Ksepka, paleontologista do Museu Bruce, em Greenwich, Connecticut, que não esteve envolvido no novo estudo. "O novo fóssil mostra que eles atingiam um tamanho enorme muito rápido também, o que é ótimo."
Origem do pinguim
Mayr especula que a dramática origem dos pinguins foi provocada pela extinção em massa que marcou o começo da Era Cenozoica. De repente, os oceanos deixaram de ter seus maiores predadores. Os pinguins puderam se adaptar a buscar presas embaixo d'água sem grande competição ou medo.
"É uma hipótese que faz sentido, mas não há evidência sólida", disse Mayr.
Uma forma de testar a hipótese seria descobrir fósseis mais antigos. "Seria ótimo ter um antecessor voador dos pinguins", disse Mayr.
Os oceanos primitivos do Cenozoico não apenas abriram caminho para a evolução de pássaros aquáticos não voadores, especula Mayr. Talvez tenham também ajudado na evolução para os tamanhos grandes.
A seleção natural favorece pássaros voadores leves porque é preciso muito esforço para se manter no ar. Pinguins não pagam esse preço. Além disso, o fato de que ficaram maiores talvez tenha trazido vantagens. Um corpo grande torna as presas mais difíceis de matar.
Gigantes
A árvore desenhada por Mayr e seus colegas também mostra que os pinguins se tornaram gigantes muitas vezes. Enquanto o kumimano pertence a uma antiga linhagem de grandes pinguins, outras linhagens produziram seus próprios gigantes, há 27 milhões de anos.
O aumento dos mamíferos marinhos pode ter sido o inferno dos pinguins gigantes. Quando os mamíferos se mudaram para o mar e evoluíram para baleias e focas, podem ter ultrapassado as aves.
Focas e pinguins precisam de praias seguras onde possam acasalar e criar seus filhotes, por exemplo. É possível que as primeiras tenham expulsado os pinguins gigantes, e os menores sobreviveram.
"A grande questão para mim é: por que havia tantos pinguins gigantes no começo do Cenozoico, mas não há pinguins gigantes atualmente", disse Mayr.