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Para criticar Moro, Haddad elogia o Plano Real, renegado pelo PT

O Plano Real acabou com a hiperinflação, que por mais de uma década corroeu o poder de compra do brasileiro | Pixabay
O Plano Real acabou com a hiperinflação, que por mais de uma década corroeu o poder de compra do brasileiro (Foto: Pixabay)

O pacote anticrime apresentado pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, na última segunda-feira (4), foi alvo de críticas pelo ex-ministro da Educação Fernando Haddad (PT). No Twitter, Haddad o classificou como “frustrante”.

“Li o pacote anticrime do Moro: para quem esperava o Plano Real da Segurança, que viesse solucionar problemas relativos à criminalidade, letalidade policial, genocídio da população negra, superpopulação carcerária etc., as medidas anunciadas são frustrantes e contraproducentes”, disse o candidato derrotado nas últimas eleições. 

Se Haddad, porém, usou a comparação com o “Plano Real” para elogiar a política monetária implantada durante o governo de Itamar Franco, é preciso voltar no tempo e lembrar que o PT foi um ferrenho opositor do plano econômico. 

Há pelo menos duas gerações de brasileiros que não sabem o que é viver debaixo da hiperinflação e como o Plano Real acabou com um problema que perdurava havia mais de um década. 

“Assim como ocorreu com o governo Dilma e Temer, vivíamos também o impeachment de Collor e um governo de transição com Itamar. Nossos problemas mais críticos eram, além da perversa inflação crônica, os mesmo de hoje, como a crise fiscal do Estado, a crise econômica vivida entre 1990 e 1992 e a corrupção”, diz Wilhelm Meiners, professor e pesquisador do curso de Economia da PUC-PR.

“Por exemplo: entre 1990 e 1994, a receita pública chegava a 26,5% do PIB, enquanto a despesa primária chegava a 32,1%, gerando um déficit público primário médio de 5,7% nesse período”, completa o professor. 

Primeiros passos 

O “Plano Real”, no entanto, não angariou unanimidade logo de cara: o Brasil recém passara por uma infinidade de planos econômicos malsucedidos e havia um clima de desconfiança quanto a uma nova investida — e tanto o PT como centrais sindicais eram as principais frentes de oposição

Mas houve resistência também dentro da própria base governista; foram precisos mais de dois meses de negociações para que a medida que criou a URV (unidade real de valor) fosse aprovada, poucas semanas antes do prazo final estipulado para a troca de moeda. 

Já durante sua implementação, o PT chegou a defini-lo como “golpe”: o ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva afirmou que o plano seria um “estelionato eleitoral”. O ex-ministro Guido Mantega disse, em 1994, que a estratégia era “burra e ineficiente” e “socialmente perversa”, enquanto Aloizio Mercadante afirmou que a oposição se recusou a aderir a iniciativa “por profundas discordâncias com a concepção neoliberal que o inspira”. 

Barreiras 

Os obstáculos criados pelo PT foram destacados por Gustavo Franco, ex-presidente do Banco Central e um dos responsáveis pelo Real. Segundo ele, a oposição não acabou nos anos 80, mas teve repercussões até o governo Dilma. 

“A Nova Matriz [política econômica de Dilma Rousseff que culminou na crise do país] foi uma contrarrevolução, uma tentativa de derrubar a sabedoria que o Plano Real trouxe sobre moedas e contas fiscais. O resultado dessa batalha foi horrível para o país – eles perderam, mas arrasaram o país”, disse Franco em entrevista à Gazeta do Povo em 2017

Aprendendo com o passado 

Implementado em 1994 por uma equipe do Ministério da Fazenda liderada pelo então ministro Fernando Henrique Cardoso, o plano contou com três fases: ajustar as contas públicas, implantar a Unidade Real de Valor (URV) para desindexar a economia, e transformar a nova unidade monetária na moeda nacional. 

“A vantagem do Plano Real é que ele soube contornar os problemas e aprender com os erros ocorridos nos choques heterodoxos de combate à inflação dos governos Sarney e Collor”, avalia Wilhelm Meiners. 

“Houve antecipação e comunicação das medidas ao mercado e à sociedade, sem choques e medidas abruptas de congelamento ou retenção de ativos. Depois foram feitas medidas preparatórias para melhor gestão fiscal, monetária e cambial, instrumentos de política econômica fundamentais para gestão da estabilização. Em seguida, houve importantes medidas complementares, como os programas de reestruturação de bancos privados e públicos (que faturavam com a inflação alta), além das medidas liberalizantes”, completa o professor. 

Derrotando a inflação 

O Plano Real foi inovador por estabilizar a inflação galopante do país: um ano após a implantação, a inflação foi registrada em 14% — redução drástica em comparação ao índice de 1.093,8% registrado em 1994. O resultado foi impactante na realidade dos brasileiros: entre julho de 1994 e janeiro de 1996, a pobreza absoluta foi reduzida em todas as metrópoles analisadas em estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

“A estabilização trouxe de volta o crédito farto ao consumidor, a possibilidade de financiamentos de longo prazo para eletrodomésticos, automóveis e casa própria. A abertura e liberalização dos mercados favoreceu um novo fluxo de ingresso de capitais estrangeiros, com a entrada de novos investidores, conduzindo a reestruturação produtiva e industrial”, diz Meiners. 

O professor argumenta que a partir do Plano Real se estabeleceu uma nova realidade econômica no país ao mostrar que a estabilidade é alcançada com responsabilidade fiscal, política externa eficiente e promoção de bem estar social. 

“Ele conduziu o Brasil para sua maioridade econômica. Antes éramos um país que varria seus entulhos de má gestão fiscal, da ineficácia distributiva e cambial e da ineficiência produtiva para debaixo do tapete. A recente crise do Governo Dilma, que colocou em xeque a estabilização e namorou com a volta da inflação, mostrou em que direção de política econômica a população prefere estar”, conclui Wilhelm. 

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