Um artigo publicado no mês passado na revista Archives of Sexual Behavior levanta uma questão importante sobre o ambiente em que medicamentos e cirurgias “afirmativas de gênero” são oferecidos a menores. Os resultados positivos das intervenções hormonais, argumenta a psiquiatra Alison Clayton, autora do artigo, podem ser atribuídos a efeitos placebo gerados por encontros clínicos e pelo contexto social em que ocorrem, e não aos efeitos psicotrópicos subjacentes das próprias drogas.
A intuição básica de Clayton faz sentido. Se você lidar com um adolescente em sofrimento emocional e lhe disser que a droga X vai resolver seus problemas, enquanto o tratamento Y vai piorá-los, e então levá-lo a um ambiente clínico onde os profissionais de saúde repetem essa mensagem, não é de se surpreender que o adolescente sentirá alívio emocional quando você lhe der a droga X, ou angústia quando você lhe der Y – independentemente dos efeitos psicotrópicos de X. O paciente pode considerar a entrega de X simbolicamente como adultos ouvindo-a e simpatizando com sua agitação interior. “O ‘efeito Hawthorne’: é assim que chamamos o fenômeno em que as melhorias dos pacientes de experimentos clínicos podem ocorrer porque eles estão sendo observados e recebem atenção especial. Um paciente que faz parte de um estudo, recebendo atenção especial e com médicos motivados, que estão comprometidos com os benefícios do tratamento em estudo, provavelmente terá expectativas mais altas de melhoras terapêuticas”, escreve Clayton.
É verdade que os promotores da atenção “afirmativa de gênero” criaram o que Clayton chama de “uma tempestade perfeita para o efeito placebo”. Na mídia de centro-esquerda, bloqueadores de puberdade, hormônios do sexo oposto e (com menos frequência) cirurgias são aclamados como medidas “medicamente necessárias” e de prevenção do suicídio para adolescentes que estariam em perigo supostamente por lhes ter sido “atribuído” o sexo errado em seu nascimento. Os céticos a respeito dessas intervenções são denunciados como cruéis sonegadores de um tratamento que salva as vidas de jovens com alto risco de suicídio. Enquanto isso, tratamentos alternativos a drogas e cirurgias (por exemplo, psicoterapia) são denegridos como “terapia de conversão” e vistos como prejudiciais, preparando o terreno para um efeito nocebo (isto é, nocivo) naqueles que recebem psicoterapia, mas não remédios.
Clayton faz uma distinção importante entre os efeitos do placebo em pesquisas em relação aos seus efeitos nos ambientes clínicos. Não há nada inerentemente errado em confiar nos efeitos do placebo em ambientes clínicos, onde o bem-estar de cada paciente é primordial. O problema é quando drogas ou procedimentos que produzem efeitos placebo também carregam um risco significativo de efeitos colaterais adversos. No caso de medicamentos e cirurgias "afirmativas de gênero”, acredita-se que esses riscos incluam, entre outras coisas, perda de fertilidade e função sexual, aumento do risco de doenças cardíacas e câncer, deficiências de densidade óssea e comprometimento cognitivo. A pesquisa serve justamente para compreender a probabilidade e a gravidade desses resultados. No entanto, os efeitos placebo/nocebo descritos por Clayton tornam mais difícil para os pesquisadores determinar os mecanismos causais envolvidos e, portanto, a necessidade médica real de medicamentos e cirurgias.
Se tudo isso fosse revelado a adolescentes angustiados e a seus pais ansiosos dentro de um processo honesto de consentimento informado, isso seria uma coisa. Mas os pais são frequentemente informados de que sua escolha é entre “um filho vivo ou uma filha morta” e que os bloqueadores de puberdade são seguros e “totalmente reversíveis”. Os adolescentes, enquanto isso, são informados de que qualquer questionamento de sua autoidentificação de gênero constitui um ato metafísico de agressão contra sua própria pessoa e dignidade. Isso torna a medicina baseada em evidências extremamente difícil. “Uma medicina que faz pouco para distinguir os efeitos do placebo dos efeitos específicos do tratamento corre o risco de tornar-se não muito diferente da pseudociência e do charlatanismo que dominaram a medicina no passado, resultando provavelmente em declínio na confiança do público e deterioração nos resultados dos pacientes”, observa Clayton.
Efetivamente, os médicos adeptos da afirmação de gênero e seus aliados na mídia estão criando um problema para o qual somente eles têm uma solução. Se cerca de 2% dos adolescentes hoje se identificam como transgêneros e metade deles chega a ter disforia de gênero, e se, como às vezes ouvimos, cerca de 40% daqueles com disforia correm sério risco de suicídio, esperaríamos ter visto uma epidemia chocante de suicídios adolescentes nos anos anteriores à oferta de cuidados “afirmativos de gênero”. Isso não aconteceu. Assim, supondo que os médicos e pesquisadores dessa linha estejam certos em suas previsões sobre o suicídio juvenil, é pelo menos possível, e talvez provável, que a causa desse perigo seja a promessa, não a negação, dessas drogas e cirurgias.
O que Clayton sublinha é o viés que fundamenta o mundo da pesquisa “afirmativa de gênero”. O “ambiente clínico” criado por médicos “afirmativos de gênero” e seus aliados “maximiza o efeito placebo”, mas “é nesse mesmo ambiente que esses médicos estão pesquisando a eficácia [da terapia afirmativa de gênero]”. Em outras áreas da pesquisa médica, vieses assim seriam abertamente discutidos e suscitariam preocupações em revisores de periódicos e conselhos editoriais. Mas já aprendemos que a pesquisa médica sobre o fenômeno transgênero opera sob circunstâncias excepcionais.
Leor Sapir é membro do Manhattan Institute.
© 2022 City Journal. Publicado com permissão. Original em inglês.
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