Criados em frente a telas, os alphas preferem atividades interativas e recorrem com naturalidade aos assistentes virtuais e à inteligência artificial.| Foto: Reprodução/Pexels-Jessica Lewis
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Pense naquela criança pequena que brinca com um tablet enquanto os pais tentam comer em paz no restaurante. Esse é o estereótipo de um representante da Geração Alpha, o próximo grande grupo populacional mundial – e o primeiro a crescer totalmente no século XXI.

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Nascidos entre 2010 e o final de 2024, os alphas são, em sua maioria, filhos da Geração Y (os millenials) e irmãos da Geração Z (zoomers).

“Nativos digitais”, estão sendo criados em frente a telas, preferem atividades interativas e recorrem com naturalidade aos assistentes virtuais e à inteligência artificial.

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Foram profundamente marcados pelo isolamento social provocado pela epidemia da Covid-19, o que os deixou mais próximos da família e preocupados com a saúde. Há, inclusive, quem os chame de Geração C (de coronavírus).

Essa experiência pandêmica “formadora” em comum com contemporâneos de todos os lugares da Terra, somada à facilidade tecnológica de se comunicar em nível planetário, ainda estimula os especialistas a adotarem outra nomenclatura para defini-los: Geração Global.

Rótulos à parte, o fato é que mais de 2,8 milhões de alphas nascem todas as semanas mundo afora (principalmente na Índia, China e Nigéria). Até 2025, serão cerca de 2 bilhões – o maior contingente geracional da História.

Criador do termo Geração Alpha e autor de um livro com o mesmo nome, o pesquisador australiano Mark McCrindle é considerado um dos maiores entendidos do tema até o momento.

Em uma entrevista concedida em 2015 ao jornal The New York Times, ele explicou a origem da expressão.

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“Em 2008, quando escrevia o livro The ABC of XYZ: Understanding the Global Generations [‘O ABC do XYZ: Entendendo as Gerações Globais’, lançado em 2009], ficou claro que uma nova geração estava para começar e ainda não havia um nome para ela. Fiz uma pesquisa com várias pessoas, para descobrir como ela deveria ser chamada, e ‘Geração A’ foi a resposta mais recorrente”, disse.

No entanto, segundo McCrindle, não fazia sentido retornar ao ‘A’. “Porque eles são o começo de algo novo, e não um retorno para o que havia antes. Então acabei usando ‘Geração Alpha’, mencionado algumas vezes pelos entrevistados, para dar o título do capítulo Beyond Z: Meet Generation Alpha [‘Além do Z: Conheça a Geração Alpha’].”

Ou seja: se o conceito se mantiver, os próximos serão os betas, que nascerão a partir de 2025.  E depois os gammas, deltas, etc.

Nova geração vai movimentar uma economia gigantesca, e por isso já chama a atenção das corporações 

Mark McCrindle também é fundador de uma empresa de consultoria centrada em “demografia e estudos sociais”.

A companhia costuma divulgar relatórios atualizados sobre os alphas, com informações que abrangem desde características psicológicas das crianças a tendências de consumo. E, graças a este último aspecto, as grandes corporações passaram a voltar sua atenção para essa fatia do público.

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De acordo com a McCrindle Research, em 2029 – quando os primeiros indivíduos da geração serão adultos e os mais jovens terão atingido a idade de 5 anos – o grupo movimentará uma economia de US$ 5,46 trilhões (o equivalente a R$ 27,19 trilhões na cotação atual).

Não à toa, a maior parte dos artigos acadêmicos já publicados acerca do assunto foram produzidos por especialistas da área de marketing (seguidos por psicólogos e educadores). Os estudos trazem vários dados em comum, muitos deles meramente especulativos:

– Na rotina dos alpha, os celulares, tablets, videogames e TVs digitais exercem papéis de cuidado, entretenimento e educação.

– Eles têm uma capacidade de atenção mais curta, e aprendem melhor por meio de métodos educativos baseados na “gamificação” (a aplicação da dinâmica dos jogos eletrônicos nos processos do dia a dia, para motivar e ensinar de forma lúdica).

– Mesmo sendo mais dispersos, farão parte da geração mais instruída da humanidade, devido à enorme quantidade de informação recebida e o maior tempo gasto em cursos e treinamentos.

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– Como desconhecem a realidade analógica e offline, não separam o mundo real do virtual.

– Preferem games customizáveis, em que possam construir realidades, como Roblox e Minecraft.

– Muitos têm pais do mesmo sexo ou de diferentes origens étnicas e religiosas, o que supostamente os tornará mais “inclusivos”.

– Possuem muita empatia (a capacidade de se colocar no lugar de outra pessoa), pois são criados em um ambiente diverso e globalizado, que fornece o acesso a um número maior de opiniões, perspectivas e influências.

– Os que vivenciaram o período de lockdown são bastante apegados aos pais e irmãos (porém, uma parcela significativa é de filhos únicos).

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– O período pandêmico também os deixou mais cuidadosos com a saúde, tanto mental quanto física (o que pode acarretar em mudanças nos hábitos alimentares da população mundial).

– Costumam educar os pais e amigos com os conhecimentos que adquirem. De forma geral, são extremamente cooperativos.

– Têm um poder de decisão absurdo sobre o que é consumido dentro de casa (e viverão com os pais por mais tempo que as outras gerações).

– Questionam os atuais padrões de consumo, pois priorizam a experiência em detrimento da posse.

– Dominam a produção e edição de conteúdos audiovisuais, graças às ferramentas disponíveis nos aplicativos das redes sociais.

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– Não se importam com a proteção de sua privacidade.

– Criarão profissões que ainda não existem.

Por que os alphas podem dar um fim à era da polarização política 

“Sou muito esperançoso com relação ao futuro dessa geração”, diz o designer, empresário e professor Aguilar Selhrost.

Coordenador da Graduação 4D em Economia da Influência Digital da PUCPR (um novo modelo de curso que inclui mentorias, experiências no metaverso e oportunidades de networking), ele é um observador atento dos alphas.

Para Selhorst, o grupo que em breve será predominante no planeta vai encarar os problemas de nosso tempo de forma diferente dos millennials e zoomers – e isso pode até culminar no fim da polarização política atual.

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“O sofrimento humano vai importar mais do que ser de direita ou esquerda. Eles vão pensar nas respostas para essas questões mais humanamente e menos politicamente”, afirma.

Essa previsão, segundo o professor, vem de duas características essenciais da Geração Alpha: empatia e senso de cooperação. “Eles são reflexivos e fáceis de se lidar. Têm uma necessidade coletiva de se compreender, até pelo fato de serem muito cosmopolitas.”

Sellhorst ainda afirma que os alphas serão responsáveis por grandes mudanças econômicas e nos hábitos de consumo. Primeiro, porque exigirão produtos e serviços o mais customizáveis possíveis. E pelo fato de desejarem, acima de tudo, experiências.

“A experiência, para eles, é mais importante do que a propriedade. Por exemplo: é uma geração que vai, cada vez menos, tirar carteira de motorista. Porque não é interessante ter um automóvel se existe o Uber. A consequência disso é que o mercado terá de buscar inovações no campo do transporte público para atendê-la.”

Eventos como a pandemia trouxeram consequências negativas incalculáveis 

No entanto, nem tudo é otimismo com relação à Geração Alpha. Afinal, sempre há o temor de que o futuro seja ainda mais incerto e volátil – e pautado por epidemias, instabilidade política global, desemprego, consumismo desenfreado, desigualdades socioeconômicas, mudanças climáticas extremas e pessoas dependentes de um mundo digital superficial.

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Professora de Psicologia da Inovação e Psicologia da Internet da Faculdade de Informática e Administração Paulista (Fiap), Fernanda Furia não chega a ter o medo “apocalíptico” descrito acima, porém expressa preocupações importantes com relação às crianças alpha, que acompanha e estuda.

“Enfrentar, ao mesmo tempo, um cenário de pandemia, isolamento social, guerras, acidentes climáticos e ataques a escolas é uma tragédia sem tamanho”, afirma a coordenadora da consultoria Playground da Inovação, voltada para temas como educação, inteligência emocional-digital e ciberpsicologia (o estudo do resultado das interações humanas com a tecnologia).

De acordo com Fernanda, o sofrimento e as consequências negativas decorrentes desses eventos são “imensuráveis”.

E, especialmente no que diz respeito ao período pandêmico, ela faz um alerta: em muitos casos, os cuidados oferecidos pelos pais durante o lockdown podem não ter sido adequados. Até porque os adultos também estavam fragilizados.

“Brigas entre os pais, agressões físicas, abuso sexual, desamparo, desaparecimento da rede de apoio e falta de dinheiro foram elementos constantes em muitos lares durante o isolamento”, diz.

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Mas e a parcela pobre e vulnerável da Geração Alpha? Como vai desenvolver suas potencialidades sem as mesmas oportunidades de acesso à tecnologia e educação que as classes mais privilegiadas?

Para Fernanda, a sociedade ainda precisa entender, com mais profundidade, como ficaram os menos favorecidos após a pandemia – e o consequente aumento da desigualdade social e tecnológica.

Segundo ela, vivemos um paradoxo. Ao mesmo tempo em que a internet e a informação possibilitam mais oportunidades de trabalho, sua ausência pode alargar o abismo social já existente.

“Caso não consigamos oferecer condições básicas para o desenvolvimento das novas gerações, teremos um cenário muito difícil, com um número ainda maior de evasão escolar e de jovens que não trabalham e acabam indo para a criminalidade”, afirma.

Já o professor Aguilar Selhrost acredita que, graças à internet, a população mais pobre cada vez mais terá comportamentos parecidos com o da classe média.

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“O que vai diferenciar as pessoas dessa geração não será a economia, que é o que define as classes. Será como elas vão usar a informação, a curadoria. Essa geração, inclusive, terá um poder de cobrança muito mais forte”, diz.

Questionada sobre o que os adultos podem fazer para ajudar a Geração Alpha em seu processo de desenvolvimento, Fernanda chama a atenção, principalmente, para a importância de se compreender a rápida evolução tecnológica em curso.

“Conhecer as oportunidades e os riscos envolvidos no uso da internet é fundamental para orientarmos as novas gerações”, afirma a psicóloga.

Selhorst, por sua vez, ressalta a importância da curadoria. “É a palavra do momento. Diante de tanta exposição à informação, é fundamental mostrar o que faz sentido estudar, as melhores leituras. Tanto ponto de vista da fidedignidade quanto da própria ética.”

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]
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