Sem dúvida a pandemia de Covid-19 exige ação urgente: proteger os vulneráveis das manifestações graves da doença e da morte, evitar o colapso do sistema de saúde e manter empresas, escolas e a vida comum fervilhando. Mas o pânico que permeia a imprensa e desproporcional à realidade.
O pânico nasce da incapacidade de se fazer perguntas básicas. Nossos líderes estão estabelecendo metas realistas? Ou eles estão dando ênfase demais à ideia de que é possível eliminar a Covid-19? Há algum precedente histórico de uma campanha de vacina universal rápida?
Hoje em dia, os norte-americanos tendem a exigir que os problemas sociais sejam resolvidos assim que são descobertos. Quando isso não acontece, a imprensa irrompe em alertas e revolta. Não por acaso, políticos e legisladores reagem ao pânico, incapazes de manter uma perspectiva realista sobre o que é ou não possível.
As fracassadas tentativas de impedir surtos de sarampo não prova da dificuldade de se eliminar uma doença infecciosa. Como temos uma vacina extremamente eficiente, deveríamos já ter eliminado o sarampo infantil. Mas o sarampo permanece entre nós porque alguns pais se recusam a vacinar os filhos e algumas crianças não podem tomar vacina, entre outras barreiras. Surtos esporádicos de sarampo entre esses bolsões de crianças suscetíveis fazem com que o vírus persista nos Estados Unidos, exigindo um esforço contínuo para se evitar sua disseminação.
A situação da Covid-19 é semelhante. Há pessoas que, por vários motivos, jamais serão vacinadas. Como resultado, os surtos continuarão acontecendo. A erradicação da Covid-19 é extremamente improvável. O mais provável é que ela se tornará endêmica – um problema com o qual aprenderemos a conviver, como a gripe ou as mortes no trânsito. Em 2019, houve 49 mortes por gripe e 11 mortes no trânsito para cada 100.000 habitantes [nos Estados Unidos]. Atualmente, os EUA tem uma taxa diária de mortes por Covid-19 de 0,15 per 100,000 — o que representa uma taxa anual de 58/100.000 mortes.
Para entender quanto tempo levaria para conseguir uma supermaioria de população totalmente vacinada contra a Covid-19, talvez devêssemos analisar os primeiros anos da campanha de vacinação contra a pólio nos Estados Unidos. A campanha teve início assim que a vacina foi aprovada, em 1955. Mas antes mesmo que chegasse às pessoas, preocupações quanto à segurança levaram a uma interrupção temporária no programa de imunização. Depois da retomado, o esforço de vacinação levou anos para alcançar o efeito máximo. No começo da campanha, em 1955, o país registrou 29 mil casos. Os casos foram diminuindo pela metade a cada ano, até que houvesse aproximadamente 120 casos em 1964. Como a campanha de vacinação contra a Covid-19 tem apenas oito meses de vida, nosso processo atual de contenção da doença não deveria surpreender ninguém.
As propagandas consistentes em favor da vacinação são justificadas. Mas a imprensa e as autoridades de saúde pública também têm responsabilidade na forma como reagirão a novos surtos e ao progresso lento da vacinação. Isso permitiria que o público se acostumasse a um novo normal menos estressante.
Jonathan M. Ellen é pediatra, epidemiologista e acadêmico, além de ex-CEO do Johns Hopkins All Children’s Hospital.