Nenhum acontecimento provocou tantas explicações como os ataques no dia 11 de setembro. No espaço de uma hora a Al Qaeda infligiu danos mais diretos aos Estados Unidos do que a União Soviética durante toda a Guerra Fria. E precisou de apenas 19 homens armados com pequenos punhais para destruir o World Trade Center, demolir uma ala do Pentágono e matar 3 mil pessoas. Essa desproporção levou algumas pessoas, especialmente no mundo muçulmano, a procurar um "Deus" para explicar o que parece inexplicável. Seriam os judeus que estariam por trás dos ataques? Teria sido o "conselho da energia Bush-Cheney" que os planejara para poder arrebatar os campos de petróleo da Ásia Central? E assim por diante.
O próprio Osama bin Laden disse que a Al Qaeda era a única responsável pelos ataques de 11 de setembro. Em 2004, ele divulgou um vídeo no qual falou dos seus acordos com o sequestrador principal, Mohammed Ata. E a Comissão dos EUA, encarregada de tratar do assunto, concluiu que a Al Qaeda fora a única responsável pela operação. Isso nos leva a uma questão mais ampla: o que levou a Al Qaeda a lançar os ataques? Nenhuma das explicações a seguir é, isoladamente, suficiente para explicar o episódio, mas juntas elas podem nos ajudar a entendê-lo. Elas estão classificadas em ordem ascendente de importância.
8 - O declínio do Oriente Médio e a "humilhação" do Islã Bernard Lewis é o mais conhecido expoente da ideia de que o mundo muçulmano está em crise, em grande parte atribuída a séculos de declínio. Três semanas após o 11 de Setembro, um vídeo de Bin Laden apresentado pela Al-Jaazira dizia que "o que a América está provando agora é algo insignificante comparado ao que nós experimentamos durante dezenas de anos. Nem os Estados Unidos nem o povo desse país terão segurança enquanto não houver segurança na Palestina."
7 - A Tecnologia das comunicações.
Hoje os muçulmanos estão bem mais conscientes dos conflitos no mundo islâmico do que há mais de dez anos. Canais árabes por satélite e os websites jihadistas proliferaram, tornando-os mais sensíveis à opressão.
6 - Regimes autoritários do Oriente Médio ajudaram a incubar os militantes Sayyid Qutb, o Lenin do movimento militante jihadista, mais tarde Ayman al-Zawahiri, o número 2 de Bin Laden, tornou-se radical na prisão no Cairo. Não é acidental o fato de que tantos militantes da Al Qaeda sejam egípcios e sauditas.
5 - A alienação dos muçulmanos no Ocidente.
Três dos quatro pilotos que agiram em 11 de setembro e dois planejadores-chave dos ataques passaram à militância quando viviam no Ocidente. O pesquisador Swati Pandey e eu examinamos as biografias dos 79 terroristas responsáveis por cinco dos piores ataques terroristas no Ocidente. Concluímos que um de cada quatro deles já frequentou uma faculdade no Ocidente.
4 - A política dos EUA no Oriente Médio, em particular seu apoio a Israel. Pelas próprias declarações de Bin Laden, essa é a razão pela qual a Al Qaeda atacou os Estados Unidos. Ele nunca fez menção a Hollywood, homossexualidade ou drogas.
3 - Bin Laden foi um líder tático astuto e racional combatendo uma guerra religiosa profunda contra o Ocidente
Como outros antes dele, Bin Laden fez uma escolha racional ao adotar o terrorismo como atalho para transformar o panorama político. Ele interveio em duas decisões chave que garantiram o sucesso dos ataques. Primeiro, nomeou Mohammed Atta para liderar os sequestradores; em segundo lugar, conteve os planos de Khalid Sheik Mohammed para derrubar simultaneamente 10 aviões na Ásia e na costa leste dos EUA. A sincronização desses ataques seria difícil e poderia não ser bem-sucedida.
2 - O 11 de setembro foi o dano colateral de um conflito dentro do Islã. A opinião de que os atentados foram o resultado de um conflito dentro do mundo muçulmano foi brilhantemente articulada em 2002 pelo estudioso do Oriente Médio Michael Scott Doran, no ensaio "Somebody Else s Civil War" (A Guerra Civil de Alguma Outra Pessoa). Segundo Doran, os seguidores de Bin Laden "se consideram uma ilha de verdadeiros fiéis", num mar de iniquidades . Os egípcios da Al Qaeda acreditavam que deveriam derrubar os regimes no Oriente Médio liderados por governantes "apóstatas". Bin Laden deu o passo seguinte, insistindo que a raiz do problema era o "inimigo distante", os EUA, que apoiavam esse "status quo" no Oriente Médio.
1 - Os ataques foram fruto do raciocínio estratégico imperfeito de Bin Laden. Diante do domínio total de Bin Laden sobre a Al Qaeda, a organização ficou refém da sua visão estratégica. Bin Laden considerava os EUA um tigre de papel, capaz de aguentar apenas alguns ataques e se retirar, deixando vulneráveis os regimes clientes do Oriente Médio. Mas a resposta americana ao 11 de Setembro foi destruir o regime taleban e dizimar a Al Qaeda. Embora os atentados tenham sido um sucesso tático, na verdade eles ameaçaram o futuro da Al Qaeda.
Para concluir, o 11 de Setembro provocou danos colaterais numa guerra civil dentro do mundo político do Islã. De um lado estão aqueles que querem instalar teocracias do estilo taleban da Indonésia ao Marrocos. De outro, há uma maioria silenciosa de muçulmanos disposta a negociar com o Ocidente, que não considera o taleban um modelo aproveitável para os Estados islâmicos modernos e que rejeita a violência.
Porém Bin Laden, e seus ataques contra os Estados Unidos, deu forma a um movimento ideológico que sobreviverá a ele. O "binladenismo" obteve muita energia da guerra no Iraque e, provavelmente, o conflito do Líbano fará com que conquiste mais partidários. O líder egípcio Hosni Mubarak pressentiu isso ao alertar em 2003 que a guerra do Iraque iria gerar "100 novos Bin Laden". É esta nova geração de militantes que é o legado de Bin Laden.
(*) Peter Bergen é autor do livro "The Osama bin Laden I know", (O Osama Bin Laden que eu Conheço), publicado pela editora Simon & Schuster.