Na maior parte dos países ocidentais, inclusive nos mais religiosos, a comunidade LGBT obteve nas últimas décadas enormes avanços, conquistando igualdade de direitos entre heterossexuais e homossexuais perante a lei. Mesmo assim, os ataques de parte da militância LGBT contra símbolos religiosos, especialmente cristãos, nunca cessaram nessas nações, variando do deboche explícito ao vandalismo e vilipêndio extremo. Ao mesmo tempo, não há registro de atos semelhantes, em intensidade ou frequência, nos países onde as liberdades individuais dessa parcela da população são muito mais restritas ou mesmo inexistentes. Se tais ações deixaram de ser instrumento para reivindicação de direitos, o que motiva sua interminável reincidência?
Uma das últimas agressões à fé cristã a ganhar destaque internacional foi a do embaixador para assuntos LGBT no Parlamento Europeu, Ricardo Simonetti, que fez um ensaio fotográfico para a capa de uma revista alemã, vestido de Virgem Maria transgênero. Antes dele, porém, considerando somente os últimos dez anos, os casos de graves ofensas protagonizadas por militantes LGBT contra símbolos cristãos no Ocidente são incontáveis. A quantidade de notícias que foram produzidas sobre tais atos dão uma pista sobre a primeira e mais óbvia das motivações: publicidade.
Analistas ouvidos pela Gazeta do Povo lembram que gerar repercussão por meio de agressões que resultam em escândalo é uma antiga tática midiática e sociopolítica, usada não apenas para emplacar pautas sociais, mas também para dar notoriedade àqueles grupos ou indivíduos que a desejam. No caso da relação entre cristianismo e a militância LGBT, as diferenças inconciliáveis, somada à liberdade de expressão conquistada, acabam por tornar os símbolos cristãos um alvo fácil e preferencial para militantes que buscam ser notados a qualquer custo.
“O cristianismo adota preceitos que colidem frontalmente com as perspectivas adotadas pelas teorias de gênero que fundamentam o movimento LGBT”, diz a presidente da Associação Nacional de Juristas Evangélicos (ANAJURE), Edna Zili. Ela acrescenta que os ataques servem como “via de embate”, mas também funcionam para “alavancar a pauta LGBT nos debates instados na esfera pública”, mantendo a agenda e os agentes LGBT permanentemente sob holofotes.
O destaque obtido pelos agressores acaba funcionando também como sinalização aos pares de militância, uma espécie de prova de lealdade à causa, que, por sua vez, frequentemente resulta em demonstrações de solidariedade e aprovação dentro desse meio social.
Falta de coerência
Para o Instituto Brasileiro de Direito e Religião (IBDR), falta a esses indivíduos e grupos agressores uma forma mais ampla e coerente de pensar a igualdade que conquistaram perante a lei. “Homossexuais são livres para fazer suas escolhas e os cristãos são livres para manter seus dogmas e sacramentos. Aliás, esse é o primeiro espaço de liberdade, sua dimensão negativa, isto é, de não interferência”, afirma o instituto em manifestação assinada por seu presidente, Thiago Vieira, e pelo professor Alex Catharino.
Os representantes do IBDR também apontam que o objetivo de alguns desses militantes não é o de preservar direitos assegurados pelas democracias ocidentais, pois “em diversos países, os membros de tais grupos chegam a ter direitos especiais, acima de outros cidadãos, o que representa uma ruptura com o conceito fundamental de ‘isonomia’, característica intrínseca ao Estado de Direito”.
Nesse sentido, as permanentes agressões ao cristianismo funcionam como instrumento de coação para impor uma agenda, bem como eliminar, pelo constrangimento, vozes contrárias a um projeto social específico. “Infelizmente, o caminho para esse modelo quase totalitário de mudança comportamental pressupõe vilipendiar e desrespeitar os símbolos religiosos”.
Perda de representatividade
A agressividade e zombaria presentes em muitos dos ataques LGBT ao cristianismo são alvo de críticas até mesmo por homossexuais que não se sentem representados pela atuação das alas mais radicais do movimento. É o caso de Jéssica Ramos, eleita em 2020 como primeira vereadora lésbica da cidade de Londrina, no norte do Paraná. “O ativismo LGBT não trabalha por ‘direito de minorias’, mas luta por uma segregação identitária em busca de privilégios”, afirma a parlamentar. Ao longo de sua campanha, a então candidata afirmou em várias ocasiões que não desejava influenciar a fé ou a família de ninguém, mas apenas viver bem com sua parceira.
Ela também considera que os promotores de ataques o fazem para intimidar àqueles que se opõem às suas pautas, ameaçando-os de processos e perseguições caso não recuem. “Taxam de ‘homofóbico’ a qualquer um que apresente resistência, por exemplo, às ações relacionadas a linguagem neutra ou inclusão de homossexualidade em conteúdo infantil. Virou um escudo que usam para tudo enquanto atacam à vontade”.
Visão marxista
O desejo de notoriedade, a busca por aprovação de determinado meio social e a censura de opositores são elementos bastante práticos que ajudam a explicar a hostilidade de parte da militância LGBT ao cristianismo, mas o filósofo e colunista da Gazeta do Povo, Carlos Ramalhete, afirma que há razões mais antigas, nem sempre compreendidas com clareza pelos próprios agressores.
Para ele, esses militantes mais agressivos continuam agindo conforme uma interpretação marxista do mundo, ainda que não tenham completa consciência disso. “Não nos esqueçamos que na visão marxista a religião é apenas uma superestrutura de apoio da classe dominante, sem existência ou importância intrínsecas”, explica. Portanto, a gravidade do que esses atos representam aos olhos de um crente nem sempre é percebida por aqueles que vandalizam templos ou tratam com sarcasmo aquilo que é sagrado para um religioso. O elemento espiritual, que é o maior foco de atenção do agredido diante de um ataque à sua fé, tende a ser completamente desprezado pelo agressor. “Para quem ataca, trata-se apenas de uma ‘brincadeira’ inofensiva contra meros símbolos, que não apenas nada sinalizam como representam um inimigo já derrotado – a sociedade burguesa”, diz Ramalhete.
Ele considera que a atual hostilidade da militância LGBT ao cristianismo ainda é consequência das mudanças sociais que vem ocorrendo no Ocidente desde os anos 60, compondo a inversão de atitudes e valores socialmente aceitos por aqueles que, agora, detém mais poder do que os religiosos. “O ataque ao cristianismo passou a ser uma demonstração de bom-mocismo, de adesão total ao sistema dominante e, inversamente, a religiosidade cristã ostensiva tornou-se elemento contracultural”.
Ataques incessantes
Relembre algumas das polêmicas envolvendo símbolos religiosos em atos relacionados à comunidade LGBT nos últimos anos:
- Em 2013, ativistas do grupo extremista Femen protagonizaram uma manifestação no Vaticano, onde tiraram a roupa na Praça de São Pedro enquanto o papa Bento XVI rezava a oração do Ângelus. Elas gritaram palavras de ordem, alegando se tratar de um protesto contra a homofobia. Em seus corpos estava pintada a frase “in gay we trust”;
- No mesmo ano, na Bélgica, integrantes do grupo invadiram a palestra do arcebispo de Bruxelas e o molharam com garrafas de água. Elas estavam com seios à mostra, frases provocativas pintadas no corpo e seguravam a placa “stop homophobia”;
- Ainda em 2013, no Rio de Janeiro, durante Jornada Mundial da Juventude, em ato realizado no meio da rua, manifestantes da Marcha das Vadias quebraram imagens sacras, esfregaram ícones de Cristo nas genitálias e inseriram um crucifixo no ânus;
- Em 2015, durante a Parada Gay, em São Paulo, é apresentado um Jesus transexual desfilando numa cruz;
- Em 2017, a exposição Queermuseu - Cartografias da Diferença na Arte Brasileira, patrocinada pelo Santander Cultural, gera enorme repercussão em Porto Alegre. Nela era apresentada uma Virgem Maria com um chimpanzé no colo e hóstias grafadas com nomes de órgãos sexuais;
- Em 2019, o grupo humorista Porta dos Fundos lança um especial de Natal, na Netflix, protagonizado por um Jesus gay;
- No carnaval de 2020, a Mangueira também optou por apresentar um Jesus transexual em seu desfile;